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Noite no ritmo dos violeiros

Sobrinho de Helena Meirelles, Milton Araújo homenageia não só a tia, mas linhagem de instrumentistas

Melina Dias
Do Diário do Grande ABC
13/08/2008 | 07:04
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Reserve umas horas para desacelerar e entrar no bucólico mundo dos boiadeiros. Em show nesta quarta-feira, em Santo André, Milton Araújo, sobrinho da lendária violeira Helena Meirelles (1924-2005) homenageia não só a tia, mas a linhagem de instrumentistas à qual pertence. Uma história cheia de ‘causos'.

Não há desculpa para quem não conhece a história de Helena Meirelles, moça que literalmente enfiou a viola no saco e caiu nesse mundão até virar destaque em 1993 da revista norte-americana Guitar Player, publicação especializada no gênero.

Antes da apresentação de Milton Araújo será exibido, às 20h, o documentário Dona Helena (2005), de Dainara Toffoli, no Anfiteatro do Paço Municipal de Santo André. Concluído pouco antes da morte da artista traz depoimentos da mulher de personalidade e frases fortes - apesar de já um tanto debilitada pela pneumonia crônica que a levou.

Após o show, o público segue para o saguão anexo onde verá o show de Milton com banda. A cultura boiadeira do Mato Grosso antigo abre a apresentação. "Mas há músicas para lembrar vários familiares dessas gerações de violeiros", conta Milton Araújo.

A começar com uma canção para o tio de Helena, Leôncio, que lhe ensinou os primeiros, acordes. É curioso no clã que a transmissão do talento se dá de forma, digamos, diagonal. "Nenhum filho seguiu os passos dos pais. São sempre os sobrinhos que preservam a tradição", diz. É que nesse caso, a prática do instrumento toma contornos místicos: é preciso algo mais para tocar bem na complexa afinação da viola chamada ‘rio abaixo'.

Dizem que quem domina esse modo de tocar teve de fazer pacto com o demo. A própria Helena Meirelles gostava de alimentar a lenda. Dizia que tudo que produz música tem algo a ver com o cramulhão. "O fato é que, de tão difícil, quando o violeiro acostumado à afinação comum, chamada ‘cebolão', tenta fazer a ‘rio baixo', só dá na trave e desiste xingando: ‘isso é coisa do capeta'", diz Araújo, aos risos.

Sozinha na praça - Milton Araújo pretende dedicar uma canção à mãe Natália, irmã da consagrada violeira. Sem ela, esse show realizado no dia de nascimento de Helena (uma sexta-feira 13 de agosto) nunca aconteceria.

Há 30 anos, sua mãe procurava a irmã, àquela altura dada como assassinada. Em 1986, foi avisada que ela teria sido vista em Piquerobi, Oeste Paulista, cidade de onde a família de Milton migrou para Santo André. Encontrou Helena em uma praça somente com um saco de roupas e a trouxe para Santo André. "O saco era a mala e o nó o cadeado", relembra Milton.

Helena recuperou-se e conheceu os sobrinhos, que já eram músicos por influência do tio Álvaro, seu outro irmão. Dois deles, Milton e Mário começaram a produzir shows da tia. O primeiro no teatro Elis Regina, em São Bernardo, foi o estopim para a carreira tardia, mas bem-sucedida. A mulher que passou a juventude tocando em bailes na roça e bordéis, casou-se três vezes e teve pelo menos 11 filhos, acabou por gravar quatro discos e foi tema de dois documentários.

Participam da apresentação desta quarta o irmão de Milton, Mário, que produziu discos de Helena e a irmã, Sônia, vocalista. Integram ainda a banda Robson Passos (contrabaixo), Bira Azevedo (percussão), Marcos Alves (violonistas). Seguindo outra tradição, será feita a imitação do canto de pássaros como araponga, seriema e guaxo na viola. A clássica Chalana encerra a noite.




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