Sem convívio com o genitor, o pequeno Arthur Pozo, de Santo André, tem a mãe Flávia e o avô Elias como exemplos de amor e respeito
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O que define a imagem paterna? Os laços sanguíneos? A presença? A fisionomia parecida? O amor? O Dia dos Pais, comemorado hoje, pode ser para muitas pessoas uma simples data para encontrar e presentear quem mais se ama, mas para outros pode ser um momento que levanta essas reflexões.
No Brasil, 11 milhões de mulheres criam seus filhos sozinhas, segundo a Fundação Getúlio Vargas. No Grande ABC, 12.332 crianças nascidas entre 2016 e agosto deste ano não têm o nome do pai na certidão de nascimento.
A batalha para o reconhecimento de paternidade é a realidade de muitas famílias e, neste contexto, a figura do “pai-herói” dá lugar a outros personagens, como mães, avôs, padrinhos e até mesmo padrastos.
Quando a auxiliar administrativa Flávia Pozo, 28 anos, soube que estava grávida, a insegurança tomou conta. “Saía com o pai do meu filho de vez em quando e acabei engravidando. Ele falou que não era dele, que não ia assumir. Na época, estava desempregada, não sabia o que fazer, até que minha família disse para eu ter o bebê que eles me ajudariam. Desde então, somos eu, meu filho Arthur e meus pais”, relata a moradora do Parque Capuava.
Logo depois do parto, no Hospital da Mulher, em Santo André, os documentos de Arthur Pozo, agora com 6 anos, foram registrados com “pai desconhecido”.
“Quando meu filho estava com dez meses, minha mãe falou que ela precisava tirar uma nova via do RG e pediu para eu agendar no Poupatempo. No site deles, apareceu o programa Encontre Seu Pai. Comecei a ler e decidi colocar os dados do pai do meu filho. Um representante da Defensoria Pública entrou em contato comigo dizendo que iam notificá-lo três vezes. Caso ele se recusasse a fazer o teste de paternidade, automaticamente seria dado como pai da criança. Ele decidiu fazer o exame, deu positivo e ele teve que registrar. Por isso, meu filho tem a certidão antiga e a atualizada.”
Nem mesmo com a confirmação da paternidade o genitor do Arthur decidiu fazer parte da vida do menino. Depois do registro, o homem visitou o pequeno algumas vezes, mas, assim que soube do diagnóstico de TEA (Transtorno do Espectro Autista) do garoto, parou de encontrá-lo. “O Arthur não fala que tem saudade do pai porque não dá para sentir falta de algo que você nunca teve. Por sorte, tenho uma rede de apoio e todo o tratamento que meu filho precisa é feito por programas do governo.”
A celebração do Dia dos Pais de Arthur e Flávia é ao lado de uma pessoa especial, que realmente entende o significado de cuidado e amor: o avô coruja Elias Vicente da Silva, 68. “É com ele e com a minha mãe que eu posso contar. Via meu pai como herói durante a minha infância. Somos muito parecidos. Ao saber da minha gravidez, ele ficou assustado, mas, depois que o Arthur nasceu, percebi que algo mudou no meu pai. Quando ele faz alguma coisa pelo meu filho, acho que não tem nada maior que ele possa fazer por mim. Neste domingo, é ele quem vai receber a lembrancinha que o Arthur fez na escola para essa data”, afirma Flávia.
O pintor Elias Vicente tenta não deixar a esposa e a filha com ciúmes, mas admite que a maior riqueza da vida dele é o neto.
“Não estou menosprezando as duas, elas entendem. O Arthur preencheu meu vazio, me trouxe felicidade. O pai dele o viu poucas vezes. Não sabe o que está perdendo. Quando descobrimos o autismo, o pessoal se afastou”, relembra. “Nós nunca deixamos nada faltar para o Arthur.”
De acordo com Elias Vicente, até mesmo as manhas do neto servem de aprendizado. “Quando eu chego em casa, ele me recebe com a maior alegria, falando: ‘vovô, vovô’. Ele mudou minha vida. O Arthur faz bagunça, às vezes passa do limite, deixa a gente nervoso, mas aprendemos a ter paciência. Poderia passar a tarde inteira falando dele. Ele é minha prioridade, meu amigo, meu parceiro. Agradeço todos os dias por ter o Arthur na minha vida.”
Neste Dia dos Pais, Elias Vicente, que mesmo aposentado faz serviços extras para ajudar nas despesas do neto, deseja apenas um presente. “Espero que Deus me dê muitos anos de vida, porque quero ver essa criança crescer no caminho do bem e ser um grande homem.”
Reconhecimento de paternidade chega a 10 mil casos
Histórias como a da auxiliar administrativa Flávia Pozo, 28 anos, e do pequeno Arthur Pozo, 6, não são difíceis de se encontrar no Grande ABC. Entre janeiro de 2016 e 9 agosto de 2024, foram 255.508 nascimentos na região, sendo que 12.332 crianças não tiveram o nome do pai registrado na certidão de nascimento.
Ao todo, neste período, 10.610 casos de reconhecimento de paternidade foram contabilizados nas sete cidades. São Bernardo liderou (com 3.334), seguida por Mauá (2.484), Santo André (1.929), Diadema (1.786), São Caetano (551), Ribeirão Pires (390) e Rio Grande da Serra (136).
Os dados são do Portal de Transparência do Registro Civil, disponibilizados pela Arpen-Brasil (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais).
Segundo a CRC (Central de Informações do Registro Civil), São Paulo teve mais de 28 mil recém-nascidos sem a paternidade registrada ao longo de 2023 – alta de 6,9% em relação a 2022, que somou 26.705 casos.
“Tem sido uma batalha travada diariamente nos balcões dos Cartórios de São Paulo, já que a legislação facilitou o procedimento, permitindo sua realização sem a necessidade de ação judicial, diretamente em cartório. Mesmo assim, não tem sido suficiente para estancar este problema grave da sociedade brasileira”, explica Gustavo Renato Fiscarelli, presidente da Arpen-SP, em nota.
Ter o nome do pai na certidão de nascimento é um direito garantido na Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
ENCONTRE SEU PAI
O programa Encontre Seu Pai, realizado no Poupatempo, é uma parceria do MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo) com o Imesc (Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo), que faz os exames de DNA.
As solicitações podem ser feitas por filho maior de 18 anos, mãe, responsável legal ou suposto pai tanto no site quanto nos postos presenciais. As informações estão disponíveis para consulta pelo portal (https://operacoes.sp.gov.br/OperacoesWeb/reconhecimentoPaternidade).
Segundo o MP-SP, a ação visa facilitar o “processo de inclusão do nome do pai no documento de pessoas que ainda não foram reconhecidas legalmente, além de oferecer testes gratuitos de DNA para aqueles que desejam confirmar a paternidade”.
No Grande ABC, são cinco poupatempos, localizados no Atrium Shopping, na Rua Giovanni Battista Pirelli, S/N, em Santo André; Rua Nicolau Filizola, S/N, em São Bernardo; Rua Amélia Eugênia, S/N, em Diadema; Av. Antonia Rosa Fioravanti, S/N, em Mauá; e Rua Ana Maria Rodriguez Fernandez de Lima, S/N, em Ribeirão Pires.
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