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TV exibe documentário inédito sobre Henfil
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
31/01/2003 | 18:48
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O cartunista Henfil (1944-1988) morreu como vítima do sistema de saúde ao contrair Aids em uma transfusão de sangue contaminado. Hemofílico, foi alvo de uma trama que nem o Fradinho Baixim faria melhor. Suas lutas, contra a ditadura militar armado de lápis, caneta e pincel nos quadrinhos e contra a hemofilia, estão no documentário Henfil – Profissão Cartunista, que a TV Cultura exibe neste sábado, às 21h. O programa, inédito em TV aberta, é uma co-produção da Scriptorium Films com a STV – Rede SescSenac com direção de Marisa Furtado de Oliveira.

Henfil não podia se ferir, pois a hemofilia impede a coagulação do sangue e provoca hemorragias ou derrame nas articulações. Foi impiedoso, portanto, consigo, com a ditadura e com os “traidores” da causa libertária, numa época em que oposição era esquerda e situação era direita. A repressão o poupou, evitando torná-lo mártir, dada sua fragilidade. A hemofilia foi seu mal e sua força. Seus irmãos hemofílicos, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, e o músico Chico Mário, também morreram por causa de sangue contaminado.

Lula escapou da ira santa de Henfil, que não pouparia o atual presidente da República, fundador do PT, partido ao qual o cartunista era filiado. “Pirigoso de inteligente”, como diria o personagem Bode Orellana, Henfil se lançaria sobre o líder de esquerda aliado à direita para vencer a eleição. Elis Regina, que cantou “a volta do irmão do Henfil” – o exilado Betinho – não foi poupada. Virou “Elis Regente”, porque havia cantado na abertura das Olimpíadas do Exército.

O documentário mostra a evolução de seu humor crítico e “pé na cara” com depoimentos dos cartunistas Jaguar, Ziraldo, Nilson, Ique, Laerte, Glauco. Traz também os livros Diário de um Cucaracha, escrito quando Henfil esteve nos Estados Unidos em 1973 para tratar da hemofilia, e Henfil na China (Antes da Coca-Cola), uma tradução antropofágica do país comunista. O programa também tem imagens de seu filme Tanga – Deu no The New York Times, um cartum filmado, e do programa TV Mulher, da Rede Globo, onde fazia o quadro TV Homem.

Seu traço é ágil e definido, como um eletrocardiograma. “Caligráfico”, segundo ele mesmo. Racismo, violência, miséria, repressão, foram para o papel em 15 mil desenhos originais, em poder de seu filho, Ivan. Graúna, a ave do agreste, é um alter-ego, como Emília para Monteiro Lobato, ou Mafalda para o argentino Quino.

O escritor Roberto Drummond, morto no ano passado, batizou de Henfil o cartunista mineiro Henrique de Souza Filho em 1964 na revista Alterosa, onde nasceram os Fradinhos. Os personagens estrearam no Pasquim em 1969. Baixim e Cumprido sintetizam seu conflito interior entre ser revolucionário e anárquico, ou ser conservador e carola. Ubaldo, o Paranóico veio pós-abertura, quando os opositores ainda andavam desconfiados do regime que ruía. Estes e mais Urubu, Bacalhau, Orelhão, Zeferino, Bode Orellana são retratos do cinismo social que Henfil observava.




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