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'Crássico da sátira está de volta
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
07/10/2001 | 20:00
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  Juó Bananére foi um caso único na literatura brasileira: igual a ele, só ele. Um “crássico” da antiarte, segundo seu macarrônico linguajar ítalo-português. Com ele, foi criada a caricatura verbal nos textos humorísticos que parodiavam poemas e figuras nacionais da cultura e da política de sua época, a República Velha. Barbeiro e jornalista do Bom Retiro, escrevia crônicas que reivindicavam melhorias urbanas para São Paulo e poemas satíricos, todos publicados na revista O Pirralho, comandada por Oswald de Andrade.

Bananére volta em uma publicação dupla da Editora 34: o fac-símile La Divina Increnca (72 págs.) e Juó Bananére – O Abuso em Blague (208 págs.), de Cristina Fonseca. O preço é R$ 29 para os dois livros, vendidos juntos. O primeiro é uma rara reprodução integral da edição publicada em 1915, uma coletânea de seus poemas publicados em O Pirralho, de onde teve de sair devido ao seu humor demolidor. O segundo é um ensaio crítico sobre o personagem e seu autor, ilustrado com fotos e desenhos.

Juó Bananére foi criado pelo engenheiro Alexandre Marcondes Machado (1892-1933) e sempre esteve no plano folclórico, apesar de o personagem ser popular na época. E ao contrário do verborrágico Bananére, Machado era tímido e pouco falava. Este estudo biográfico sobre criador e criatura ressalta o valor estético da obra e Machado como um dos grandes autores do pré-Modernismo.

Seu macarronismo é mais do que falar complicado, visto também na prosa e verso de Adoniran Barbosa. É uma técnica literária do século XVI e XVII, usada na França, Espanha e Itália. Há uma relação entre língua e classe, e Bananére (ou Machado) usou-a para achincalhar poetas parnasianos e a elite “de cartola”, tomando a voz das ruas dos imigrantes italianos e dos caipiras. A acentuação tônica é outra invenção de Bananére.

Olavo Bilac, Casimiro de Abreu, Raimundo Correia, Gonçalves Dias e outros eram os poetas mais satirizados; políticos como Hermes da Fonseca, Rui Barbosa, Altino Arantes etc, não escapavam às navalhadas de Bananére. A falsa nobreza do poema Via Láctea XIII, de Bilac (“Ora (direis), ouvir estrelas! Certo/Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,/ Que para ouvi-las, muitas vezes desperto/ E abro as janelas, pálido de espanto...”), com Bananére, foi traduzida assim para os plebeus, chamado Uvi Strella: “Che scuittá strella, né meia strella!/ Vucê stá maluco! e io ti diró intanto,/ Chi p’ra iscuitalas moltas veiz livanto,/ I vô dá una spiada na gianella”.

Voltolino, ou Lemmo Lemmi, era o chargista de O Pirralho e seus desenhos casavam perfeitamente com o texto de Bananére, com o mesmo sabor anarquista. A capa da primeira edição e La Divina Increnca, uma sátira a Dante Alighieri e sua descida ao Inferno em A Divina Comédia, e a caricatura de Bananére são dele, assim como a maioria dos desenhos do ensaio de Cristina Fonseca.




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