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As duas realidades do Demarchi
Maíra Sanches
Do Diário do Grande ABC
04/04/2011 | 07:29
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Nario Barbosa/DGABC


A vida de quem mora no bairro Demarchi, em São Bernardo, pode ser vista de duas formas: a agitação da principal via comercial do bairro, a Avenida Maria Servidei Demarchi, contrasta com a paz e o sossego que se encontra ao se afastar desse corredor.

As ruas que cortam a disputada avenida podem levar, para ambos os lados, até vias tranquilas e com vizinhança tipicamente interiorana, daquela que se reconhece na rua e arranja tempo para colocar o papo em dia no portão de casa. Por vezes, até o silêncio se faz presente.

É difícil acreditar que o bairro com cerca de 26 mil habitantes pode reservar tais características, sendo um dos maiores da cidade, com cinco quilômetros quadrados.

Pela distância da região central é fácil notar que os moradores criaram seu próprio centro comercial, simbolizado, principalmente, pela movimentadíssima Maria Servidei Demarchi. Esse é o lado onde concentram-se reclamações dos moradores, principalmente em relação à segurança pública.

Nas vias mais distantes do lado agitado do Demarchi, as ruas se assemelham em forma e tamanho. Entre os moradores, a maioria já vive ali há mais de 30 anos e se diz satisfeita com a situação do bairro.

A população de terceira idade é numerosa e carrega histórias que remetem a uma realidade bem distante dos dias de hoje. É o caso da aposentada Helena Vanuto, 78 anos, que chegou no bairro em 1967, vinda do Interior, depois de trabalhar 13 anos em uma indústria de tecelagem. No ano de 1975, ela resolveu começar a vender yakult para sustentar os dois filhos, já que o marido estava doente na época.

"Andava o bairro inteiro com o carrinho pesado, na chuva ou no calor. Tenho orgulho de ter criado dois filhos que hoje são engenheiros por causa do meu esforço", disse dona Helena, que hoje mora sozinha, cuida dos afazeres domésticos e revela o segredo da façanha. "Sempre fui muito econômica."

 

FRANGO COM POLENTA- O que pode contrapor as opiniões sobre a tranquilidade no entorno do bairro são as reclamações feitas por quem mora e trabalha próximo à Avenida Maria Servidei Demarchi, onde está localizada a famosa rota dos restaurantes e do frango com polenta.

A atração tornou-se conhecida nos anos 1940, quando viajantes a caminho de Santos paravam na região para almoçar, ainda na casa da família Demarchi, que deu origem ao bairro e a diversos nomes de rua.

O avanço não se limitou ao prato típico e atualmente o local é o endereço de muitas churrascarias e restaurantes. Quem acompanhou essa evolução foi o dono de um tradicional restaurante, Itacir Siqueira, 59, que mora há 27 anos no bairro.

 

De acordo com ele, a atração gastronômica é famosa até no Interior. "Em 1976 a rota era muito conhecida em Piracicaba, onde fui churrasqueiro. Ainda hoje, aqui não deixa de ser um ponto turístico da cidade. É o que gira o comércio e o dinheiro do bairro." Quando chegou ao Dermarchi, o restaurante que hoje recebe até 300 pessoas por dia era um bar falido. Com o avanço, agora o bairro abriga 349 comércios e 50 indústrias. Apesar do apreço declarado pelo Demarchi, Siqueira queixou-se da falta de policiamento no bairro, onde já foi assaltado cinco vezes.

 

A Prefeitura informou que não há um posto da GCM (Guarda Civil Municipal) no bairro. O mais próximo é a Inspetoria Regional Batistini/Alvarenga, na Estrada Galvão Bueno.

O antigo vendedor de doces era vendedor

Em meio às ruas mais sossegadas do bairro, a equipe do Diário achou uma lanchonete - meio casa, meio quintal, meio bar - decorada com um grande pôster do time de futebol do São Paulo.

O dono do simples estabelecimento não esconde a paixão pelo esporte, tampouco as raízes alagoanas, famosas pelas redondezas, principalmente entre os veteranos do Demarchi.

Wilson Alves Martins, 89 anos, conhecido como Seu Martins, chegou com 32 anos no bairro e trouxe consigo as lembranças de quando atuou por seis anos como zagueiro do time do Asa de Arapiraca, ainda na capital potiguar.

Comendo uma feijoada acompanhada por cerveja e banana, o aposentado fez o tipo simplão e logo se lembrou de mostrar com orgulho parte do pequeno espaço que destinou ao salão de beleza da filha, que funciona ao lado de seu bar.

No andar de cima mora com a mulher, com quem está casado há 58 anos. Onde funciona o comércio, era uma garagem.

Aparentemente despreocupado com o trabalho na terceira idade, ele revela. "Aqui é um passatempo para mim. Sempre batalhei para não ter de pedir nada a ninguém. E desse jeito sustentei nove irmãos. Agora estou aposentado e só ajudo minha família. Adoro viver aqui. É uma tranquilidade", disse, esbanjando lucidez.

No Demarchi, ele é um dos moradores mais conhecidos. "É uma pessoa muito boa. Todo dia vende doces para as crianças das escolas próximas", disse o presidente da associação dos moradores do bairro, João Dehon, que também é figura carimbada entre a vizinhança desde fim da década de 1970.

Na sede da entidade que preside, em datas comemorativas, como Dia das Crianças e Natal, são realizados eventos com jogos de futebol que reúnem geralmente 150 crianças. As doações de comidas e doces, que garantem que ninguém saia de barriga vazia, são feitas pelos comerciantes da região.

 

 

 




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