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Cacá Rosset seleciona atores para "Scapino"
Do Diário do Grande ABC
12/11/1999 | 16:08
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Cenas engraçadas protagonizadas por personagens que parecem ter saído de um filme do italiano Federico Fellini ou do espanhol Almodóvar. Essa é a expectativa em torno da audiçao que o diretor Cacá Rosset realiza na terça-feira para selecionar o elenco da próxima montagem do grupo Ornitorrinco: "Scapino", de Molire (1622-1673).

A traduçao do original "Les Fourberies de Scapin" será do próprio Rosset, que, a exemplo de Molière, também interpretará o personagem central, o ardiloso criado Scapino, no espetáculo que estréia em abril no Teatro Sérgio Cardoso. Rosset procura tipos esquisitos para compor a populaçao da cidade de Nápoles, onde transcorre a açao da peça. Ele recebeu 250 currículos com as respectivas fotos dos tipos mais estranhos, entre os quais selecionou cerca de 50 para testar.

Os canditados vao apresentar uma cena curta de sua criaçao ou retirada de uma peça teatral. "Claro, nao basta ser esquisito, é preciso ter talento", diz o diretor. Daí já ter escolhido o ator Cláudio Lopomo, paulistano de 75 anos, sósia do ator italiano Totó, para o papel de gerente de uma cantina napolitana na Nápoles recriada por Rosset. "Fico feliz de voltar ao palco do Teatro Sérgio Cardoso, onde atuei pela última vez em 1983 como cômico central da peça "Aí Vem o Dilúvio"', diz Lopomo. "Apresentei meu trabalho ao Cacá, que ficou encantado e garantiu que terei o meu momento no espetáculo".

Rosset enfatiza que sua busca nada tem a ver com a exploraçao da deformidade, no estilo mundo-cao. "Utilizo o termo esquisito no sentido etimológico da palavra, que é raro, precioso", explica. "A arte deve ser um antídoto contra a padronizaçao da sociedade massificada e globalizada; sendo assim tem uma funçao até ecológica de preservaçao da diversidade humana".

Peça - Como toda cidade portuária, Nápoles carrega a fama de abrigar larápios e golpistas de todos os quilates. Scapino é um desses velhacos, o típico criado da Commedia Dell'Arte, dotado de grande inteligência e perspicácia, inteiramente dedicado a planejar artimanhas e trapaças contra seus patroes.

A trama da peça é simples. Scapino é criado de Leandro, que está apaixonado por um jovem de família pobre, Jacinta, com quem quer casar-se contra a vontade de seu pai, Argante.

Otávio, amigo de Leandro, encontra-se em situaçao semelhante: apaixonado pela cigana Zerbineta, jamais conseguirá de seu pai Geronte a permissao para o casamento. Scapino entra em cena para ajudá-los e, a partir daí, o público estará diante de uma sucessao vertiginosa de estratagemas, todos com o objetivo de ludibriar os patroes. Num deles, por exemplo, Scapino diz para o velho Geronte que o violento irmao da cigana Zerbineta acab de chegar à cidade com um exército de mercenários.

O objetivo do cigano nao é outro senao arrancar a pele de Geronte, a quem Scapino se dispoe a proteger, escondendo-o dentro de um saco. A partir daí, o criado arruma mil e uma maneiras de surrar o saco, sempre fingindo ser outro quem o faz. "Ele faz um sotaque de espanhol e finge dialogar - faz as duas vozes - com o irmao de Zerbineta que bate nele e no saco", conta Rosset. A cada vez que Geronte pensa em sair, Scapino imita a voz de outro mercenário e volta a bater no velho.

Segundo o diretor, a peça é uma sucessao daquelas cenas cômicas clássicas, recriadas à exaustao seja no teatro, no cinema ou em desenhos animados, como as cenas de pancadarias de Tom e Jerry. "O mundo da farsa beira sempre o inverossímil, daí a velocidade, o tempo acelerado, para que nao se tenha tempo de pensar sobre o absurdo das situaçoes; o mundo da farsa é um mundo em frenesi", observa o diretor.

Molière criou "Scapino" dois anos antes de morrer e, curiosamente, voltou nesse texto à forma farsesca de suas primeiras comédias. "Mas era entao um mestre, um autor maduro e sofisticado, já com uma linguagem muito depurada", diz Rosset. "Se a tragédia fala sobre a inexorabilidade da morte, a comédia possibilita abrir um parêntese na vida para rir da condiçao humana, da nossa finitude".




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