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Delegacias do ABC estão à míngua
Glauco Araújo
Do Diário do Grande ABC
15/12/2001 | 17:14
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Policiais civis das 31 delegacias do Grande ABC têm passado por apuros para registrar boletins de ocorrência. Afinal, não dispõem de equipamentos e materiais básicos para o trabalho. Em alguns casos, as próprias vítimas saem para buscar suprimentos e doar às delegacias. Quando isso não acontece, os policiais fazem vaquinha para comprar o material e, na pior das hipóteses, batem na porta de comércios próximos às delegacias para pedir fitas de impressora, materiais de escritório e de higiene pessoal, entre outros. Para piorar, algumas delegacias colocam à disposição dos policiais coletes à prova de balas com data de vencimento ultrapassada em mais de dois anos.

A comerciante A.L.S., 50 anos, dona de um estabelecimento comercial em Santo André que vende produtos de informática, foi vítima de roubo às 8h30 do dia 24 do mês passado, no cruzamento das ruas Caneleiras e Laranjeiras, no bairro Campestre, em Santo André. Ela é um exemplo da falta de estrutura oferecida aos policiais nos plantões.

A. chegou no 4º DP de Santo André por volta das 9h e passou o dia inteiro no local. “Pelo tempo que fiquei na delegacia, pude perceber, com dó, a dificuldade que os policiais têm para registrar uma ocorrência. Só saí de lá quando já era quase noite”, disse a comerciante.

Inconformada com a morosidade no atendimento, A. se prontificou a doar vários pacotes de papel contínuo e fitas de impressora ao DP. “Eles não tinham o papel certo para a impressora que usavam, sem contar que os boletins registrados antes do meu ficaram quase apagados”, disse a comerciante.

Outro problema identificado pela vítima foram os próprios equipamentos de informática existentes na delegacia. “Eles (policiais) estão usando um computador 386, modelo já ultrapassado. Me prontifiquei a consertar as impressoras e os computadores da delegacia. Eles não podem trabalhar assim”, afirmou a comerciante.

A falta de estrutura das delegacias vira problema para as próprias vítimas. Como as cotas mensais de formulários contínuos com o timbre “Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública – Polícia Civil do Estado de São Paulo” enviadas às delegaciais são pequenas, muitos boletins são feitos em papel sem qualquer identificação – documentos que não são aceitos por seguradoras e bancos. “Já vi muitas vítimas voltarem na delegacia para pedir uma cópia em papel timbrado, e com razão. O máximo que podemos fazer é encher o BO de carimbo e assinatura”, disse um escrivão da região, que não quis se identificar.

Um investigador de uma outra delegacia da região mostrou à reportagem do Diário um colete à prova de balas que é obrigado a usar em operações externas. O equipamento está com a data de vencimento ultrapassada há dois anos. “Esse colete venceu em 1999. Quem usar isso aqui não terá a menor chance contra um marginal”, disse o policial, que não quis ser identificado.

Sem estrutura – O presidente do Sindicato dos Investigadores do Estado de São Paulo, João Batista Rebouças da Silva Neto, 57 anos, disse que a privatização das delegacias, como o modelo implementado em um distrito policial no Rio de Janeiro, pode ser uma solução emergencial para o problema. “Em comparação com os marginais, estamos muito atrasados. Eles estão mais organizados, e por isso estamos longe de combater o crime. Não é questão salarial, é de precariedade de estrutura. Se fosse dentro do modelo terceirizado, o policial teria sua cabeça apenas voltada ao trabalho policial.”

Rebouças acredita que o governo federal deveria pensar em criar um Ministério de Segurança Pública, pois assim a polícia poderia ter verba exclusiva. “Assim, não precisaríamos mendigar dinheiro para comprar esses suprimentos usados nas delegacias”, afirmou.

Além disso, os investigadores passam mais horas em escolta de presos e à procura de meios de consertar viaturas, comprar ou pedir doação de material para a delegacia do que em investigação. “O policial chega para mim e diz que faz isso, mas que ninguém depois venha cobrar solução de crimes”, disse um delegado de Santo André.




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