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Vizinhos se ajudam para evitar tragédias na região
Renan Fonseca
Do Diário do Grande ABC
25/10/2010 | 07:39
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Dona Maria Rutes Silva Campos, 60 anos, conta com o olhar atento dos vizinhos quando a chuva começa a molhar o barraco de três cômodos que ocupa no morro da Biquinha, em São Bernardo. Ela se diz cansada de chamar a Defesa Civil todas as vezes que um riacho de lama invade a moradia e parte da encosta que serve de quintal começa a desbarrancar.

Nas chuvas de verão, permanece a maior parte do tempo dentro de casa, secando o piso de madeira. Os ouvidos ficam alertas a qualquer barulho ou chamado. "Se um vizinho ver terra saindo de baixo da minha casa, tenho que estar pronta para sair correndo", conta.

O socorro ela chama sempre que sente medo. "Quando chove ligo para a Defesa Civil. Mas eles alegam que não estamos em área de risco", contou mostrando o morro atrás da casa que apresenta sinais de deslizamentos. "Tenho muitos problemas de saúde e não consigo fazer minha mudança. Também não tenho para onde ir, por isso já pedi a ajuda da Prefeitura várias vezes", afirmou.

Da casa de dona Maria é possível avistar a maior parte dos bairros da região do jardim Silvina.
Alguns metros abaixo, um rastro de destruição e restos de entulho marcam o dia em que a aposentada decidiu que tinha de mudar dali.

Na madrugada de 20 de janeiro, um desmoronamento de terra engoliu o barraco onde a estudante Sara Regina Pateti, 10 anos, morava com a família. Ela morreu no local, comovendo a vizinhança.

Parte das moradias irregulares foi removida pela Defesa Civil após o acidente. Contudo, restam alguns barracos. Aos que querem sair, a Prefeitura oferece R$ 315 como auxílio aluguel.

O dinheiro não é suficiente para uma família que ganha um salário mínimo. O jeito é permanecer onde está e torcer para que as chuvas no final do ano sejam mais brandas.

O desempregado José Alves Matias, 51, é daqueles que apelam à fé. Com problemas de saúde, mora em encosta da Vila São José e conta com a ajuda do filho de 25 anos, o único na família que está empregado. "Lembro bem do dia em que a garota morreu. Queria mudar para um lugar seguro, mas estou aqui há tanto tempo e não tenho condições", desabafou.
Ele afirma que foi informado pela Defesa sobre os riscos de continuar no local. "Tenho fé que não vamos passar pela mesma situação da garota", disse esperançoso.

O armador Henrique Avarés Dantas, 48, é vizinho de Matias 10 metros morro acima, aproximadamente. Na casa de três cômodos vivem quatro pessoas, dois adultos e dois jovens. Apenas um deles está empregado.
Descer o morro e procurar um novo lar é para quem tem dinheiro, na visão de Dantas. "Um aluguel está custando mais de R$ 600. Não tenho dinheiro para isso. Gastei muito fazendo um muro atrás de casa", contou apontando para a estrutura que segura parte da encosta.

Na ladeira que faz a recepção do barraco, Dantas fixou uma lona, "para não deixar a terra cair", como explicou.
Em situações extremas, ele também conta com o olhar atento dos vizinhos de baixo. "Se começar a desmoronar, o pessoal alerta a gente. Mas não temos muito o que fazer. Só aguardar."


Defesa Civil monitora 2 mil terrenos com risco de deslizamento

A experiência do início de 2010 ajudou a Prefeitura de São Bernardo a se preparar para os temporais. O Plano Municipal de Redução de Risco foi ampliado e diversas ações foram tomadas e ainda estão em curso, de acordo com a Defesa Civil.

Obras de drenagem, mapeamento detalhado das áreas de risco e projetos futuros fazem parte da resposta do Poder Público para os problemas com índices pluviométricos, conforme o secretário de Serviços Urbanos, José Clovis.

Para minimizar possibilidades de inundação de vias, o gestor informou que mais de 20 mil bocas de lobo foram limpas e dos 14 piscinões, 11 passaram por limpeza.

A Defesa Civil monitora atualmente 58 bolsões de áreas de risco. Bairros que compõem o Batistini, Alvarenga, Riacho Grande e Rudge Ramos somam mais de 2 mil residências que podem sofrer com deslizamento de terra ou inundações.

O traçado dos locais foi feito com base em fotos aéreas e semanalmente agentes colhem dados sobre a situação dos locais. O coordenador da Defesa, Luiz Bongiovani, explicou que a corporação está melhor preparada e equipada para o próximo verão com relação aos anos anteriores. "O monitoramento garante respostas mais ágeis. Além disso, capacitamos os moradores para saberem como agir em situações de risco", falou.

Desde o final do ano passado, a gestão municipal está trabalhando com os Nudecs (Núcleos de Defesas Civis).

Parte da população que mora em locais de risco aprendeu práticas para perceber a iminência de deslizamento ou alagamento. São 11 núcleos que passaram pela capacitação.

A equipe de Bongiovani possui 12 agentes que passam os dias em campo monitorando regiões mapeadas. O plantão 24h é feito por três defensores pelo telefone 199.

Para socorrer os desabrigados, a Defesa Civil conta com o aparato da Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania: 3 mil kits primeiras necessidades com cestas básicas, cobertores e colchões. "Internamente, ainda temos dois geólogos e um engenheiro que cuidam também da capacitação dos Nudecs", disse.

O agente confirmou que muitos moradores recorrem à Defesa e alegam que estão em área de risco. "Mas são locais controlados, com possibilidades baixas de deslizamento", garantiu.


Prefeitura solicita R$ 200 mi a PAC 2

Muros de contenção, coleta de água em morros saturados e obras de drenagem estão sendo executados em vários pontos de São Bernardo. Na rua Washington Luiz, por exemplo, a equipe de obras está estabilizando taludes. No Parque Novo Horizonte, os funcionários estão concentrados em obras de drenagem.

A secretária de Habitação, Tássia Regino, divulgou que a cidade vai passar por mais intervenções e a Prefeitura está recorrendo ao governo federal para captar verba. "Trabalhamos em projetos que a longo prazo vão diminuir muito os riscos nos pontos monitorados", falou a gestora.

Somados os recursos protocolados ao PAC 2 (Programa de Aceleração do Crescimento) são mais de R$ 200 milhões em obras pontuais e de complexidade maior solicitados pela administração.

No mês passado, a Secretaria de Obras iniciou a canalização aberta do córrego Chrysler, que atravessa bairros que formam o Jardim Silvina. As cheias do afluente poluído têm causado transtornos para população nos últimos anos.

Com investimento aproximado de R$ 18 milhões, sendo R$ 1,5 milhão de contrapartida municipal, as intervenções devem impedir o transbordamento das águas.

A canalização atingirá 1,4 mil metros de margens e leito do córrego. A planilha de obras da Secretaria de Serviços Urbanos prevê a entrega até dezembro do próximo ano.

ALUGUEL - Sobre as reclamações do valor do auxílio aluguel, Tássia explicou que o oferecido pelo Renda Abrigo é apenas uma contribuição. O morador tem de arcar com o restante das despesas do aluguel. "Ainda assim, só liberamos o recurso quando as famílias encontram outro lugar mais seguro", afirmou Tássia.

 

 




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