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Benzedeiros resistem na região
Adriana Ferraz
Do Diário do Grande ABC
04/01/2009 | 07:03
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Nario Barbosa/DGABC


Entra ano, sai ano e uma tradição se mantém viva na região. Figuras presentes na rotina de fé de moradores, os benzedeiros representam cura, proteção ou apenas boa sorte contra quebrante ou mau olhado. Nos locais de atendimento, a bênção é tratada como um dom de Deus enviado a poucos escolhidos. A maioria dos que recebem a missão dividem-se entre o catolicismo e o espiritismo, usam água, arruda ou terço e promovem, para quem acredita, libertação até de encosto.

Os benzedeiros, normalmente, são recomendados por parentes e amigos. Gente que foi uma vez, gostou e passou a fazer da prática um hábito. Em São Bernardo há quem peça a bênção todos os dias para Ana Maria Lemes. Aos 53 anos, a devota de Nossa Senhora da Graça chega a receber 500 pessoas, das 7h às 23h. Uma rotina cansativa, mas tratada com respeito e dedicação.

"Herdei essa missão do meu pai há 40 anos e enquanto tiver vida vou continuar. Não se pode negar essa responsabilidade. Atendo qualquer pessoa, seja criança, negro, branco, pobre ou rico", diz. A maior concentração de atendimentos ocorre à noite, a partir das 18h. A casa simples que a família mantém no Parque São Bernardo está sempre de portas abertas. Por lá, Ana é celebridade.

A mãe, orgulhosa, afirma que a bênção é sinônimo de cura. "Ela tem força, desde pequena. Nasceu com sete meses. Era só pele e osso, cabia dentro de uma meia de lã. Ainda parece frágil, mas já salvou muitas pessoas", conta Maria do Carmo Ribeiro Lemes, 81anos.

O ritual é sempre o mesmo. Antes de atender, Ana coloca um avental branco, que representa a paz, e segura um terço na mão. "Não é preciso falar nada. Faço minhas rezas e escuto meu guia. Ele me fala quando a pessoa que estou benzendo está com encosto. Aí, tenho que rezar ainda mais para tentar tirar."

Católica de criação, a benzedeira segue hoje o espiritismo, mas no quarto de atendimento divide homenagens ao Preto Velho, Jesus Cristo e Nossa Senhora. São diversas imagens espalhadas em uma espécie de altar improvisado. O clima, exagerado para os principiantes, agrada quem tem o hábito de ser abençoado. "Faz 20 anos que conheço a Ana. Para mim é um alívio vir aqui, sinto-me mais confortada e tranquila para enfrentar os problemas da vida", garante a dona de casa Ivonete Rosário Garcias, 36 anos.

O mesmo sentimento é obtido por quem visita o morador mais ilustre da Vila Palmares, em Santo André. Aristeu Silvério, 75 anos, precisa distribuir senha para organizar a fila que se forma de segunda a sábado no quintal de sua casa. As pessoas já conhecem o esquema. Chegam, pegam um número, sentam e aguardam o chamado. A recepção é feita com um abraço fraternal, seguido, às vezes, de uma piada. Mas na hora do trabalho, o tom é de fé.

"O benzimento é sagrado. Uma responsabilidade enviada por Deus. Quem acredita, confia, é sempre curado. Já vi inúmeras graças sendo realizadas por minhas mãos. Sou um instrumento. Essa é minha vida, desde os 10 anos. Meu avô percebeu que tinha o dom e me ensinou a benzer", conta.

Católico praticante, não fala com guias espirituais nem usa roupa específica para cumprir sua missão diária. As orações são simples, feitas em silêncio. O único barulho vem do canto dos passarinhos que cria no quintal. Ao lado de santinhos em papel, estão seus instrumentos: duas canecas com água e galhos de arruda. O ritual é sistemático e começa sempre com o sinal da cruz.

Antigamente, os mais necessitados eram atendidos em casa. Aristeu percorria também comércios e chegou a viajar para a Paraíba, com passagens pagas pela família de uma moça com problemas espirituais. Hoje, não consegue caminhar, apesar de permanecer de pé por cinco ou seis horas consecutivas em atendimento.

"Essa tradição não pode acabar. Os benzedeiros têm que achar seus substitutos. Faz parte da missão. Já estou ensinando algumas pessoas que guardam esse dom e devem praticá-lo. O segredo é acreditar."




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