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Laís Elena é a dona da bola

Abnegada ao esporte e incansável, ex-atleta completa 50 anos de dedicação exclusiva à equipe de basquete de Santo André.

Anderson Fattori e Nilton Valentim
Do Diário do Grande ABC
13/04/2014 | 07:15
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Claudinei Plaza


Claudinei Plaza

Nos últimos 50 anos muita coisa mudou no basquete: as regras, o material da bola, o sistema de pontuação, de marcação de tempo (deixou de ser duas etapas de 20 minutos, para quatro de dez). Em Santo André, tudo isso foi incorporado, mas uma coisa permanece inalterada por meio século: a presença de Laís Elena Aranha, 71 anos, no grupo.

A história da modalidade na cidade se confunde com a sua trajetória de vida. Ela chegou em 1964 para defender as cores da extinta Pirelli e, desde então, dedica-se integralmente ao esporte. Laís parece ter descoberto a estratégia certa para driblar o tempo. Permanece inabalável como dona da bola e neste período acumulou títulos, formou atletas, conquistou respeito e contribuiu (e muito) para o desenvolvimento da modalidade.

“Lembro-me muito bem do Paulo Albano (ex-treinador da Pirelli) ir me buscar em Piracicaba com a peruinha amarela da Pirelli”, recorda-se Laís, que havia feito as primeiras cestas com a camisa do Tênis Clube de Garça, em 1959, quando chamou a atenção dos responsáveis pelo Corinthians durante um amistoso. Mas seu pai só autorizou que ela viesse jogar na Capital no ano seguinte, quando completou 17 anos.

Laís defendeu o Corinthians por três temporadas e depois migrou para o XV de Piracicaba, onde jogou um ano antes de vir para a Pirelli. “O Paulo Albano estava montando uma equipe forte, que tinha a Nilza, a Odila e a Nadir Basani e precisava de uma armadora”, recorda-se.

Ela já tinha no currículo a disputa do Campeonato Mundial do Peru (em 1964, com 15 pontos em seis jogos), mas confessa que só aceitou vir jogar em Santo André porque aqui havia uma oportunidade a mais. “Quando cheguei, fui trabalhar na biblioteca. A gente treinava apenas três vezes por semana. Eram outros tempos. Depois, passei a trabalhar no (complexo) Pedro Dell''''Antonia, onde dava aulas de natação”, lembrou Laís.

Aos 34 anos, a armadora diz ter “enjoado” de jogar e preferiu mudar de função. Passou a treinar as categorias de base da Pirelli e foi a partir daí que descobriu o que mais lhe dá prazer no esporte: a formação de atletas. “Fomos sede do primeiro campeonato estadual da categoria até 15 anos e ganhamos. E olha que o time de São Caetano tinha a Hortência”, recorda.

Hortência, aliás, é uma das pessoas que mais respeita o trabalho da técnica. “Nunca fui treinada pela Laís. Mas tenho certeza de que se não fosse por ela, o basquete não teria sobrevivido em Santo André. O esporte da cidade deve muito a ela”, conta a Rainha. “A Laís faz parte da história do basquete brasileiro”, completou.

A contribuição destacada pela Rainha Hortência pode ser traduzida pelo número de atletas formadas por Laís e por sua parceira Arilza Coraça. Muitas delas, como Marta, Leila, Chuca, Mamá, Vivian e Simone Lima defenderam as cores da Seleção Brasileira em competições internacionais. Outras, tiveram no esporte a chance para mudar de vida.

“A vitória me dá satisfação, mas oferecer oportunidades para essas garotas é o que verdadeiramente me emociona. Somos uma cidade formadora. Ninguém deu tantas atletas para a Seleção adulta como Santo André”, ensina a treinadora, que prepara a retirada das quadras para o ano que vem, após o término da Liga de Basquete Feminino.

 

No Mundial, ela teve tratamento de estrela
Dos quatro campeonatos mundiais disputados por Laís Elena, o que mais lhe emociona foi do Brasil, de 1971. A Seleção atuou em São Paulo, no Ibirapuera, e ficou com a medalha de bronze. “Íamos treinar e víamos aquelas filas imensas na porta do ginásio para comparar ingressos. Depois, quando entrávamos em quadra, ouvíamos todas as pessoas cantando aquela música ‘90 milhões em ação, salve a Seleção’. Isso era de arrepiar”.

Foram dias em que as jogadoras viveram um conto de fadas. “Tínhamos um andar inteiro no hotel. Recebíamos tantas flores que não dava nem para carregar. O presidente da República, Emílio Garrastazu Médice, telefonava. O governador de São Paulo, Laudo Natel, ia aos vestiários...” O Brasil terminou em terceiro lugar, com quatro vitórias (França, Coréia do Sul, Japão e Cuba) e duas derrotas, para a campeã União Soviética e a vice Tchecoslováquia.

O desempenho foi decisivo para o crescimento da modalidade no País. Publicações da época dão conta de que havia cerca de 100 jogadoras de basquete no Brasil e o Mundial incentivou o surgimento de outras. Uma delas foi Arilza Coraça. “Eu era estudante da USP (Universidade de São Paulo) e trabalhei no Ibirapuera. Quando acabou o Mundial, vim para Santo André tentar uma vaga na Pirelli”, relembra. Deu certo, ela foi atleta, passou a treinadora e depois auxiliar-técnica de Laís Elena.

Parceira de longa data, Arilza elogia disposição em ajudar às atletas
Arilza Coraça pode ser considerada a fiel escudeira de Laís Elena. Trabalhando juntas na comissão técnica de Santo André desde 1985, quando a auxiliar técnica resolveu encerrar a carreira, elas se comunicam quase que por telepatia. “Nos entendemos bem. Desde a minha época de jogadora sempre gostei mais de atuar na defesa e a Laís de cuidar do ataque. Acho que isso faz com que nossa relação seja sadia”, opina Arilza, que foi atleta de Santo André de 1971 até abandonar as quadras.

Apesar de reconhecida pelo que faz na quadra, para Arilza, o lado mais bonito de Laís Elena é longe das quatro linhas. “Fico impressionada como cuida das pessoas. Uma vez voltávamos de um jogo no Paraná e uma jogadora estava com forte dor de garganta. Ela andou pelo aeroporto até achar um médico que pudesse cuidar dela. É um ser humano fantástico”, elogiou Arilza.

 

Produção: Laís Elena usa blusa Empório Lili, acessórios da Morana Shopping Grand Plaza. Cabelo e maquiagem, Leo Strong, do Pelle e Capelli.




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