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Direito é Direito

Na última semana estive em La Paz, Bolívia, participando de uma série de eventos...

Carlos Ferrari
Do Diário do Grande ABC
13/11/2013 | 07:00
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Na última semana estive em La Paz, Bolívia, participando de uma série de eventos promovidos pela União Latino Americana de Cegos. Como integrante do comitê técnico-científico da organização, coube-me a atribuição de participar da realização e acompanhamento da metodologia do Seminário de Direitos Humanos, um evento pensado para estimular o debate em torno da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela ONU.

Compartilhar com vocês essa experiência é algo para mim extremamente desafiador. Digo-lhes isso, pois além dos fatos constatados e vivenciados, é fundamental também dividir um pouco de meus sentimentos diante de tal realidade.

A primeira constatação que reafirmei, pois já era claro em outros países, é que não podemos, e tampouco devemos, tomar a nossa realidade como parâmetro. Penso que isso poderia criar uma falsa ilusão que já temos muito, ou pior, nos fazer pensar que eles não têm praticamente nada. Há que se considerar o momento histórico de cada povo, os avanços e retrocessos civilizatórios e as perspectivas identificadas.

No evento reunimos representantes do Movimento de Cegos de toda a Bolívia. Nossa conversa mostrou que hoje ainda a militância local tem grandes desafios pela frente. Dentre um universo de mais ou menos 30 participantes, apenas cinco tinham conhecimento do que era a Convenção da ONU. Notem que estamos falando das principais lideranças nacionais.

Um problema que foi recorrentemente abordado refere-se ao direito do exercício autônomo do voto. A legislação local diz que as pessoas cegas terão direito a votar com uma cédula guia em Braille, e caso não exista essa possibilidade, terão direito a entrar na Zona Eleitoral juntamente com um acompanhante. Infelizmente, o orçamento para a produção de cédulas no País é pequeno e, somado a isso, quase metade dos cegos não sabe ler em Braille.

Quando comentei como era no Brasil, houve um burburinho generalizado. Parecia história de ficção científica o fato de termos todas as urnas adaptadas, não só com teclas em Braille, mas também com leitor de telas.

Com esse relato, quero lhes provocar a pensar sobre nossa responsabilidade global. Uma boa postura política se efetiva a partir de nossas ações no território em que vivemos, porém, creio que devemos ter em vista que sua concepção necessita de uma leitura ampla de mundo, para ganhar corpo. Vivemos na era dos tratados internacionais, da atuação em rede, e do intenso fluxo de informações.

Sendo assim, à medida que direitos são consolidados em determinado ponto do planeta, em outras partes são relativizados e no fim das contas, chegamos com uma vulnerabilidade que não se pode varrer para debaixo dos tapetes.

* Carlos Ferrari é presidente da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência), faz parte da diretoria-executiva da ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e é atual integrante do CNS (Conselho Nacional de Saúde).




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