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Contratar trabalho escolar pela Internet é crime
Maria Teresa Orlandi
Do Diário OnLine
23/02/2002 | 18:59
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Eles garantem sigilo absoluto e bons resultados. Basta acessar um site, clicar e fazer o pedido, como quem acessa um serviço de delivery de comida ou de qualquer outro tipo de compra on-line. Só que neste caso não se trata da encomenda de pizzas, CDs ou livros, mas de teses, monografias e dissertações das quais dependem a conquista de um diploma. Esse ‘novo negócio’ que se proliferou na Internet lança mão de verdadeiras equipes especializadas, que oferecem de simples trabalhos acadêmicos a monografias e teses de mestrado e doutorado. Mas, por trás dessa aparente comodidade, esconde-se uma armadilha: tanto quem pratica como quem procura o serviço podem responder criminalmente por falsidade ideológica, cuja pena pode variar de um ano e três meses a um ano e cinco meses de prisão, mais multa.

Alguns sites oferecem o trabalho completo, da capa à conclusão, pronto para ser entregue à universidade. “Está sem tempo para fazer seus trabalhos? Sua solução está aqui. A universidade ficou mais fácil”, diz o www.trabalhosinsight.hpg.ig.com.br/index.html, onde é só preencher um simples formulário (com dados pessoais, do trabalho e da instituição a que se destina) e efetuar o pagamento para se ter a “garantia de qualidade e entrega no prazo acertado via sedex ou e-mail”.

Outras páginas disfarçam a prática ilegal propondo apenas prestar orientação ao estudante. Mas, após contato da reportagem do Diário OnLine por e-mail ou telefone, seus responsáveis disseram que podem fazer a atividade completa por um preço maior. É o caso do www.gestaoacademica.hpg.ig.com.br/index.htm e do usuarios.uninet.com.br/~candida/

Os valores variam de acordo com o tamanho e grau de dificuldade do trabalho. Entre os sites consultados pelo Diário OnLine, o valor de cada página varia de R$ 1,50 a R$ 9. Uma monografia, por exemplo, pode custar de R$ 450 a R$ 900. Já por uma tese de doutorado paga-se cerca de R$ 1.300.

Segundo o titular da Delegacia de Crimes Praticados por Meios Eletrônicos, Youssef Chahi, quem contrata esse tipo de serviço pode responder por crime de falsidade ideológica (artigo 299 do Código Penal), assim como quem o fornece, que seria considerado co-partícipe. “Não existe legislação específica para crimes na Internet, mas fazemos uma analogia com os crimes penais. No caso, quem faz o trabalho tem ciência da sua finalidade e quem compra entrega ao professor dizendo que é de autoria própria, o que tipifica a falsidade ideológica”, afirma.

Para tanto, explica o delegado, é necessário que haja uma queixa-crime e que a fraude seja comprovada. “Cogitar ou preparar o trabalho não é crime. O serviço precisa ser contratado, executado e entregue. A consumação do crime seria a entrega do trabalho na escola”. Ainda de acordo com Chahi, a pena para o crime — que pode variar de um ano e três meses a um ano e cinco meses de prisão mais multa — cabe a decisão judicial, e o site pode ser retirado do ar.

O procurador e professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP) João Alberto Del Nero adverte que o estudante que compra trabalhos ainda corre o risco de ser responsabilizado por violação de direitos autorais. “Atribuir a si próprio uma obra de outra pessoa sem autorização é violar direitos autorais. Quem garante que o trabalho comprado não foi elaborado por uma terceira pessoa?”.

Expulsão - Além das penas judiciais, quem frauda trabalhos está sujeito a punição pedagógica. O procedimento normalmente adotado pelas instituições de ensino é designar uma comissão de sindicância, que investiga se a atividade em questão foi, de fato, elaborada pelo aluno. Se constatada a fraude, o trabalho é anulado, e a punição pode variar de advertência a expulsão, de acordo com as normas de cada escola.

De acordo com Del Nero, na USP a pena depende da importância do trabalho e das provas que a instituição dispuser. “Se provado que houve fraude em monografia, Trabalho de Conclusão de Curso ou tese, o aluno é reprovado e pode até ser descredenciado”, sustenta.

O coordenador de graduação da Faculdade de Direito de São Bernardo, Mauro Colombo, diz que diante da dificuldade de se comprovar uma fraude, principalmente no caso de monografias e teses — cujo desenvolvimento é feito com acompanhamento de professores — o melhor caminho é que o professor pressione o aluno à medida que percebe que o trabalho não foi elaborado por ele.

“Existem mecanismos para dissipar qualquer tentativa de fraude. Quando há a desconfiança, deve-se comentar todo o texto com o aluno e questioná-lo ao máximo. Mas se houver provas claras, o aluno certamente será punido com reprovação ou expulsão”, afirma Colombo. Segundo ele, a faculdade pode eventualmente tomar medidas judiciais contra o estudante.

A Universidade Metodista de São Paulo (Umesp), de São Bernardo, adota as mesmas sanções, mas a vice-reitora da instituição, Rinalva Cassiano, ressalta que o melhor remédio é a prevenção. “O mais correto é criar no aluno desde o início do curso estímulo para pesquisa e mostrar o perigo e conseqüências de um ato leviano. A escola não deve ser vista como ‘lócus’ de punição, mas de educação. Entretanto quando necessário, vem a punição”.




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