Polícia investiga caso, que aconteceu no fim de novembro, quando homem invadiu terreiro de Umbanda em Santo André e agrediu frequentadores
A Polícia Civil investiga um caso de lesão corporal, invasão de domicílio e discriminação ocorrido em um terreiro de Umbanda, no Jardim Bom Pastor, em Santo André. O caso aconteceu no dia 23 de novembro, quando um homem, identificado como Marcelo Teixeira de Lima, teria invadido o local e proferido xingamentos, ameaças e agressões contra as vítimas.
A ação foi gravada por uma das frequentadoras do terreiro e teria ocorrido por volta das 16h30, enquanto os religiosos cozinhavam. Nas imagens é possível ver Lima, que é vizinho do terreiro, descontrolado, enquanto xinga e ameaça os frequentadores na calçada, ainda do lado de fora da residência. O homem reclama de excesso de barulho por conta da prática religiosa.
“Queria matar, mas a lei não permite, né? Mas eu faria, pelo desrespeito e descaso. Não quer ver santo? Vai ver presencialmente”, ameaçou o homem na ocasião. (Veja vídeo abaixo)
Logo após a discussão, Lima parte para cima de Daniel Gomes Viana, 20 anos, pai de santo do terreiro. O jovem recebe socos no rosto e chutes nas pernas enquanto corre pela rua tentando fugir do agressor. Nas imagens é possível ver também um grupo de pessoas tentando separar a briga e uma frequentadora atingindo o agressor por diversas vezes com um pedaço de madeira.
Além das agressões físicas e verbais, as vítimas alegam que o vizinho teria danificado o retrovisor do veículo que estava estacionado na garagem no momento da confusão. Durante a discussão, Lima pede aos religiosos o alvará de funcionamento do estabelecimento religioso e diz que está “atrás” da polícia e da Defesa Civil para parar com a “p…. dentro da minha casa”.
Lima ainda proferiu outras ameaças contra o grupo e contra a religião de matriz africana. “P… de santo, fica se oferecendo para santo. (...) O diabo trouxe vocês aqui, seus incomodadores do c…. Quero ver se essa casa é sua, não tem o que comer e fica dando farinha para santo”, xinga o vizinho.
Em frente à residência onde está localizado o terreiro de Umbanda há uma igreja evangélica. Ao ser questionado pelo grupo se o barulho do espaço religioso incomodava, Lima afirmou que não.
“Todo mundo tinha paz (na rua). Essa igreja nunca me incomodou, vocês entram na minha casa com esse batuque. Preconceito religioso é o c…, quero paz dentro da minha casa, sua p…”, respondeu o agressor a uma das vítimas que o acusou de preconceito religioso.
Após o ocorrido, o pai de santo e outra vítima, uma menor de 15 anos, que também teria ficado ferida, receberam atendimento na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) Central de Santo André. No local, eles fizeram raio-x e receberam medicamentos para dor, por conta dos hematomas.
“Nos mudamos recentemente. Quando a confusão aconteceu fazia apenas três semanas que estávamos na casa. Somos um grupo pequeno, de no máximo dez pessoas por culto, que ocorre duas vezes por semana. Não passamos das 22h, somos bem rigorosos com horário”, alegou Viana, pai de santo do terreiro.
O jovem afirma ainda que tentou conversar por diversas vezes com o vizinho, que já reclamou sobre o barulho em outras oportunidades. “Isso é intolerância religiosa, porque aqui é uma avenida bem movimentada, com bar, igreja e diversos bailes funk, mas nada disso incomoda, ele mesmo assume isso. Fizemos até um isolamento acústico no corredor de casa para tentar diminuir o eco no quintal, porque o culto ocorre nos fundos da casa, em um salão”, explicou o religioso.
Segundo informações obtidas pelo Diário, o acusado, Marcelo Teixeira de Lima, possui três processos criminais por estelionato, um inclusive com prisão em flagrante, registrados no 5° e 6° DP (Distrito Policial) de Osasco, em 2010, 2020 e 2021 – os três processos foram arquivados. A equipe de reportagem tentou contato com o acusado, sem sucesso.
No último sábado (30), amigos, familiares e frequentadores do terreiro realizaram uma manifestação em frente ao templo religioso.
O caso foi registrado no 1° DP de Santo André por dano, ameaça, lesão corporal, discriminação (Art. 20 - religião), injúria e violação de domicílio. Segundo a SSP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo), a ocorrência está sendo investigada por meio de um inquérito policial instaurado e as partes envolvidas foram notificadas para prestar depoimento. “Outras diligências estão sendo realizadas para auxiliar na elucidação dos fatos”, declarou a Pasta.
Queixas de discriminação crescem 114%
O número de denúncias de intolerância religiosa cresceu 114% em um ano nos municípios do Grande ABC. De janeiro a novembro deste ano, foram registradas 30 queixas no Disque 100, enquanto no mesmo período de 2023 foram 14 notificações.
Segundo os dados do Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, Santo André é o município com maior número de denúncias na região, com 14. O número representa 46,6% do total de queixas formalizadas na plataforma.
Na sequência aparecem São Bernardo (7), Diadema (5), Mauá (3) e Ribeirão Pires (1). São Caetano e Rio Grande da Serra foram os únicos municípios que não contabilizaram notificações até o mês passado.
Das 30 denúncias de discriminação religiosa, 33,3%, ou dez, foram contra religiões de matriz africana, como Umbanda e Candomblé. Na cidade andreense, mais da metade, 57,1%, foram contra este tipo de religião.
No Brasil, até o mesmo passado, o serviço de denúncias recebeu 2.236 registros de intolerância religiosa, enquanto no Estado de São Paulo foram 547.
Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.