Setecidades Titulo Memória
Cicatrizes operárias. De um nordestino entre nós. São tantos os migrantes. Gente forte que resiste... “Até o corpo se quebrar”.

Esta é a história real de Arimateia que o cronista conheceu, conversou com ele, se emocionou. Um brasileiro que descobriu São Bernardo

Ademir Medici
Do Diário do Grande ABC
26/08/2024 | 08:00
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Victor Huerta Arroyo, escritor peruano sensível, percorre o Brasil recolhendo histórias reais e transformando-as em livros. Três já estão prontos, o quarto livro quase. Sessenta histórias em cada publicação disponível na Internet (*). 

A história de Arimatéia abre o livro 2, segunda parada da série “Viagem pelo Brasil”, com o subtítulo “Memórias improváveis de uma vida breve”. Crônicas que emocionam. Esta mais, porque próxima da gente. Arimateia, um cidadão na Semana São Bernardo 2024.

Calo de lápis

Uma crônica de Victor Huerta Arroyo

Ouvi dizer que podemos conhecer as pessoas pelas cicatrizes que carregam. As aparentes, imagino, pois existem cicatrizes imperceptíveis que se escondem da luz, e acaso se assomam apenas pelas comissuras dos olhos. Como evitar o reflexo de um espelho? Como fazer que aquele que reflete a alma não delate o que guardamos dentro? 

Cicatrizes internas são como capítulos de um livro difícil de ler, com início e meio, às vezes sem final feliz. 

O certo é que as marcas que levamos na pele, e que os outros veem, são capazes de contar uma história e descrever com detalhes fragmentos de uma biografia. 

A pele curtida, as mãos ásperas, os sulcos no rosto, o brilho e a opacidade com que refletimos a luz acusam o quebrantado espírito de quem viveu a dureza de um verão ou a solidão de muitos invernos. 

Quem poderá negar que estão desenhados, sobre a nossa pele, os grandes mapas dessa cartografia compartilhada que chamamos vida?

ARIMATEIA

Nesse mapa surgiu Arimateia que, como outros, chegou há muitos anos do Nordeste para erguer com as próprias mãos a cidade onde moraria e com elas apaziguar as ventanias do destino. Carregou cimento e carregou pedras até o corpo se quebrar, mas antes de sucumbir, sentava com o filho pequeno para ouvir e responder as dúvidas que trazia da escola: o “g” tem um rabinho, o “b” uma barriguinha”. 

Poucas coisas devem ser tão maravilhosas como ensinar a uma criança, que observa atenta, com o semblante espantado e de olhos arregalados o desconhecido mapa do mundo. Poucas coisas são maiores para um pai do que sentir o orgulho de quem o considera um herói, o mais valente e o mais forte. 

No canteiro de obras, a terra e o barro cobriam os peões até apagar seus rostos e seus nomes, mas quando chegava em casa, sentado à mesa, Arimateia se transformava, aos olhos da criança, no homem mais admirado e inteligente. 

Conduzir por tantas vezes as pequenas mãos do filho, desenhando com o lápis um coração, era esquecer das suas, maltratadas pela cal e os pedregulhos. Foi um exercício de amor que resistiu até o dia em que o bom trabalhador não soube o que responder, e a equação no caderno ficou inconclusa, a capital do país e o nome do imperador, em branco entre linhas pontilhadas. 

Quando o filho cumpriu dez anos, o robusto Arimateia, que ainda observava o menino estudar, levantou-se da cadeira e o abraçou fortemente. Emocionado, entrelaçou suas mãos com as dele e disse, com a seriedade de quem conversa com outro adulto: “Até aqui cheguei, meu filho. A partir de agora você irá além de mim. E este pequeno calo de lápis, este que nasceu no seu dedo, que seja o sinal que lhe faça lembrar do seu pai que tanto lhe ama e que fez de tudo para não permitir que a enxada marcasse suas mãos, o sol, sua testa e a ignorância, o seu coração”.

NOTA

As crônicas de Victor Huerta Arroyo estão em http://www.viagempelobrasil.com

Crédito da foto 1 – Projeto Memória

OS AGENTES. Em 2012, eles percorreram a cidade, bairro a bairro, vila a vila, favela a favela. Um livro foi escrito pelos personagens encontrados. Victor Arroyo, presente, descobre Arimateia, o moço que ensinou o filho o quanto pode 

DIÁRIO HÁ 30 ANOS

Sexta-feira, 26 de agosto de 1994 – Edição 8789

MANCHETE – Metalúrgicos convocam greve. Interrompem a Via Anchieta. Param dia 5 de setembro (de 1994) caso a categoria não ganhe 6,08% referente à inflação de julho (de 1994).

PONTO DE VISTA – A vez do voto distrital.

Só o agrupamento em torno dos nossos ideais fará o Grande ABC melhor.

Milton Bigucci, construtor.

Crédito caricatura 3 – Fernandes/Banco de Dados

CULTURA & LAZER – Zé Geraldo exorciza perfil revolucionário.

O compositor mineiro fazia show no Cine Carlos Gomes, em Santo André, e dizia sofrer com o estigma de alternativo. Preferia ser chamado de artista popular.

Entrevista à repórter Denise Bobadilha.

EM 26 DE AGOSTO DE...

1904 – O presidente da Câmara Municipal de São Bernardo, João Baptista de Oliveira Lima, o Coronel Oliveira Lima, solicitava um auxílio ao governo do Estado para reparos da Estrada do Vergueiro, trecho da Vila Mariana ao Alto da Serra, cortando a Vila de São Bernardo.

A Superintendência de Obras Públicas estudava o pedido.

Governo do Estado imprimia 50 mil impressos com instruções para evitar a propagação da peste. 

1929 - Fundada a Sociedade União Esportiva Teuto-Brasileira, em São Caetano, atual União Cultural.

HOJE

Dia Internacional da Igualdade da Mulher

Dia Internacional da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Hoje é o aniversário de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul.

No Ceará, aniversariam: Brejo Santo, Guaraciaba do Norte e Ipu. 

E mais: Cruzeiro do Oeste (MS), Dianópolis (TO), Jundiá (AL), Navegantes (SC), Nova Maringá (MT) e Santana (BA). 

Evangelho do dia

26 de agosto

Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que fechais o Reino dos Céus aos outros! Não entrais nem permitis que entram os que o desejam.

Mateus 23,13




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