Levantamento aponta ainda que 116 mil pessoas do Grande ABC não têm coleta de esgoto; especialista elenca riscos à saúde sem saneamento
No Grande ABC, 81.216 pessoas vivem sem acesso à água potável, segundo dados do Painel Saneamento Brasil do Instituto Trata Brasil, com base nos números do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento) de 2022. Isso significa que 3% dos moradores da região não têm água tratada adequada para o consumo humano e estão sujeitos a contaminações e doenças. No País, são 33 milhões de brasileiros vivendo nessas condições.
Mauá representa mais da metade (52,9%) da população sem acesso à água na região. Ao todo, 43.031 moradores, ou seja, 10,3% do total de habitantes do município, enfrentam escassez de água tratada e precisam encontrar outros meios para ter acesso ao serviço. Proporcionalmente, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra possuem o maior percentual de residentes sem cobertura de parte do saneamento básico, com 15% cada. (Veja dados por cidade na tabela acima).
Os moradores do bairro Taquacetuba, localizado no pós-balsa, em São Bernardo, enfrentam o drama de viver sem água tratada para consumo. O educador social Mateus Nogueira de Barros, 42 anos, explica que a maioria das casas possui abastecimento por poço “caipira ou mineiro”, comum em áreas rurais e que é perfurado manualmente para captar água do lençol freático. Uma bomba de sucção leva a água do poço para as caixas d’água das residências, que posteriormente é distribuída para as torneiras e chuveiros, entre outros.
Para poder consumir a água captada, Barros conta que retira frascos de hipoclorito de sódio na UBS (Unidade Básica de Saúde) Santa Cruz. O produto é um desinfetante, à base de cloro, e é utilizado para tratamento domiciliar de desinfecção de frutas, hortaliças e água, entre outros.
“Frequentemente crianças e adultos do bairro ficam com viroses ocasionadas pela contaminação da água. Alguns moradores preferem comprar água para beber. Eu faço o processo de filtragem com hipoclorito, porque a água de poço não vem completamente potável. Não temos saneamento básico na região e temos muitas residências próximas, então automaticamente o lençol freático acaba sendo contaminado”, diz o educador social.
SANEAMENTO BÁSICO
Além da falta de acesso à água potável, os dados mostram que 116.013 moradores do Grande ABC não têm coleta de esgoto. Impactos ambientais, sociais e econômicos estão entre os principais problemas da falta de saneamento básico, conforme explica o coordenador de Relações Institucionais e Comunicação do Trata Brasil, André Machado.
“Quando não existe saneamento básico, ou seja, quando não levamos água tratada às pessoas e há esgoto ao ar livre ou lixo na porta de casa, há série de consequências negativas para a população. A saúde é a primeira delas, com exposição ao risco de doenças vinculadas à água, como diarreia e leptospirose, além de doenças respiratórias. Em 2022, o Brasil registrou mais de 190 mil internações por doenças diarreicas, segundo dados do SUS. Esse número pressiona o sistema público de saúde, com doenças que poderiam ser evitadas se houvesse infraestrutura básica adequada”, afirma.
Em relação ao meio ambiente, a falta de coleta e tratamento de esgoto pode poluir os mananciais. “Para ilustrar, a quantidade de esgoto não tratado despejada na natureza diariamente é equivalente a 5.253 piscinas olímpicas. Portanto, o saneamento básico tem um impacto ambiental significativo”, complementa Machado.
INVESTIMENTOS
O coordenador do Trata Brasil alerta para a necessidade de os municípios aumentarem os investimentos nos serviços de saneamento básico, como a construção de sistemas de captação e tratamento de água e esgoto, além de manutenção dos que já existem, mas que precisam de mais eficiência.
Responsável pelo abastecimento de água e pela coleta e tratamento de esgoto na região, com exceção de Mauá, a Sabesp informou que trabalha para universalização do saneamento até 2029, tanto no Grande ABC quanto nas demais cidades em que atua.
“A companhia tem obras em andamento e novas intervenções serão realizadas visando atingir a meta do novo modelo de concessão: 99% na cobertura de água; 90% na cobertura de esgoto e 90% de tratamento de esgoto”, comunicou a companhia, por nota. Caso seja cumprida, a Sabesp iria antecipar em quatro anos a meta de universalização do serviço estabelecida para 2033 pela Lei 14.026, de 15 de julho de 2020, conhecida como Novo Marco Legal do Saneamento Básico. (Leia mais abaixo).
A Prefeitura de Mauá disse que tem apresentado avanços significativos quando o assunto é saneamento básico. Segundo o Paço, o município atingiu os índices de 91% de tratamento e 95% de coleta de esgoto.
“Desde dezembro de 2020, os serviços de tratamento e distribuição de água no município de Mauá são de responsabilidade da Sabesp. Desde o início da vigência deste contrato, os investimentos deixaram de ser feitos pela Prefeitura, e toda a operação é da Sabesp, mediante recebimento das tarifas de fornecimento de água aos munícipes”, explicou.
Diadema afirmou que a Prefeitura tem executado diversas obras que impactam positivamente o saneamento da cidade, como a limpeza de córregos e a retomada das obras de canalização dos córregos Grota Funda e Olaria. São Bernardo, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra não responderam.
País tem até 2033 para universalizar serviços
O Brasil tem até 2033 para universalizar os serviços de saneamento básico no País, meta estabelecida pela Lei 14.026, de 15 de julho de 2020, conhecida como Novo Marco Legal do Saneamento Básico. Ou seja, em nove anos, todas as localidades brasileiras devem atender a 99% da população com abastecimento de água e 90% com esgotamento sanitário.
A Sabesp diz que irá universalizar os serviços no Grande ABC e em outras cidades que atua até 2029 – quatro antes da meta definida por lei.
No Brasil, cerca de 32 milhões vivem sem acesso à água tratada e mais de 90 milhões não têm coleta de esgoto. Para reverter esse déficit, estudo realizado pelo Ministério das Cidades em 2023 estima a necessidade de investimento de aproximadamente US$ 100 bilhões, sendo US$ 54 bilhões para os serviços de abastecimento de água e US$ 46 bilhões para esgotamento sanitário.
O Coordenador de Relações Institucionais e Comunicação do Trata Brasil, André Machado, destaca que é preciso perseguir esse compromisso para que a meta seja realmente cumprida dentro do prazo. “É claro que o ritmo de desenvolvimento ainda está muito aquém do necessário. Se considerarmos o ritmo de evolução dos últimos cinco anos, com os dados públicos disponíveis, se mantivermos esse ritmo, a universalização só será alcançada em 2070, com 37 anos de atraso. No entanto, ainda temos nove anos para cumprir a meta, e precisamos buscar todas as possíveis soluções para alcançá-la”, afirma.
Entre as medidas que devem ser adotadas para alcançar a meta, primeiro ele ressalta a importância de o tema entrar na agenda pública e ser tratado como prioridade. “O saneamento básico é um serviço de titularidade municipal, na maioria dos casos, e precisa ser pensado pelas prefeituras com a Câmara de Vereadores. Como temos eleições municipais este ano, é necessário que os candidatos apresentem suas propostas sobre o tema à população. Da mesma forma, a população deve adotar o acesso ao saneamento básico como um critério importante na escolha de seus representantes”, diz.
O segundo ponto, segundo Barros, seria mobilizar soluções para garantir investimentos, pois o saneamento básico é um segmento de infraestrutura que demanda acesso a recursos e é necessário dobrar o investimento para de fato alcançar a universalização.
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