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A força que vem da máquina
Rodolfo de Souza
10/05/2024 | 09:27
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Seri


O ser humano nasce e se desenvolve com uma força proporcional à sua natureza, que não lhe permite galopar ou servir de montaria, por exemplo.

Para as funções que exerce, pode-se dizer que sua musculatura é suficiente, a despeito de algumas atribuições que foram criadas a posteriori e que o levaram a buscar força física excedente, como lutar em guerras ou por esporte. Em tempos atuais, a moda de se entregar a vida à cultura do físico também é bastante comum, o que faz crescer assustadoramente a musculatura do indivíduo a ponto de torná-lo, segundo o meu modo de ver, meio exagerado. Ainda não sei se a intenção é obter mais força ou simplesmente beleza. Duvido, aliás, da segunda hipótese, já que a montanha de músculos que resulta de tanta malhação e bombas não pode ser considerada exatamente uma paisagem de se tirar o fôlego.

Da mesma forma parrudos, há homens que habitam as telas desde que se inventou o cinema. Os filmes de pancadaria normalmente ganham dos demais em bilheteria, e lá estão eles, os fortões, fazendo brilhar todo o talento de seu porte físico. Nada contra, diga-se de passagem, mesmo porque há alguns que são fortes por natureza. Sujeitos cuja constituição física não requer lá muito esforço para ganhar destaque no quesito força.

Seja num ou noutro caso, no entanto, fato é que porte avantajado tem conferido ao ser humano macho um sentimento íntimo de poder. Nota-se pela sua postura, como o seu caminhar de peito empolado e olhar desafiador, por exemplo. Os braços também sempre exibem contornos bem torneados, por meio de camisetas cavadas tamanho infantil, mais tencionadas do que as cordas de um violão. Tudo pelo poder de se sentir o mais forte dentre os seres comuns.

Não bastasse, porém, tanto empenho em busca do perfil saradão, eis que nos deparamos com o poder emanado também da máquina, afinal, desde que se aprimorou carros e motos o apreço pela potência dos motores virou a cabeça dos amantes da exibição. Tenho acompanhado, nesta minha longa caminhada por vias públicas daqui e de acolá, demonstrações de força por meio dela. Falo de veículos que permitem ao piloto exibir toda a sua habilidade e, sobretudo, a força que vem dos pistões e suas cilindradas, não propriamente da carne ensanguentada que conduz a coisa.

Carros e motos são, pois, veículos criados para o transporte, mas também para a ostentação, nos casos em que os cavalos superam o senso comum e desafiam o asfalto. É quando o condutor tem a possibilidade de demonstrar para o outro e para si mesmo que um comando que não necessita de densa musculatura consegue deslocar a máquina com velocidade e, não raro, com ruído forte, determinando que o seu possuidor, naquele momento, é maior e mais poderoso do que qualquer mortal sobre a Terra.

Bater na traseira de outro veículo a mais de cem por hora, matando o seu condutor, pode ser um feito executado até mesmo por um carro um ponto zero. No entanto, não haveria aqui demonstração de força e poder, uma vez que estes também são oriundos da grana farta, que compra máquinas potentes e caras, e que, na verdade, conduzem o seu condutor. 

Rodolfo de Souza nasceu e mora em Santo André.
É professor e autor do blog cafeecronicas.com




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