Em 30 anos, Grande ABC angariou R$ 66,2 milhões por meio da lei, que busca desenvolver a cultura
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“Sem esse mecanismo teríamos muito menos expressões de cultura em nosso País”, diz Sergio Schuindt, diretor da Orquestra Locomotiva. A instituição de Santo André, que nos últimos 15 anos atua na inclusão sociocultural de crianças e adolescentes, é um dos projetos da região que captaram recursos por meio da Lei Rouanet, sancionada visando fomentar a atividade cultural no Brasil. No Dia Nacional das Artes, comemorado hoje, este fato está longe de ser a realidade para os agentes culturais que buscam o dispositivo para captar recursos no Grande ABC.
Segundo dados do Salic (Sistema de Acesso às Leis de Incentivo à Cultura), do MinC (Ministério da Cultura), nos mais de 30 anos da legislação, sancionada em 23 de dezembro de 1991, a região captou apenas 13,7% dos recursos aprovados pelo governo federal. No total, 867 propostas do Grande ABC foram enviadas ao MinC por meio do dispositivo, com R$ 480,9 milhões aprovados após análise da Pasta, porém, deste valor, apenas 150 conseguiram angariar fundos, que somaram R$ 66,3 milhões nas três décadas da lei.
Segundo explica Schuindt, o processo para captação dos recursos não é nada simples, o processo é burcrático. “Não tem nada fácil, primeiro porque se tem o desafio de ser habilitado, o que exige conhecimento da legislação e do processo. Depois da habilitação, ainda se deve convencer pessoas públicas e jurídicas que o seu projeto está apto para impactar socialmente a vida das pessoas, concorrendo com artistas com mais de 30 anos no mercado”, relata.
A Lei nº 8.313, popularmente conhecida como Lei Rouanet, instituiu o Pronac (Programa Nacional de Incentivo à Cultura), método para captar e canalizar recursos para o setor. O dispositivo visa beneficiar diversos segmentos artísticos e culturais, entre eles, a preservação do patrimônio cultural, histórico, arquitetônico, arqueológico, bibliotecas, museus e demais acervos. O valor é captado a partir de renúncias fiscais e incentivos de diversas naturezas, para isso, é preciso o interesse de pessoas físicas ou jurídicas.
RAIO-X
Na região, dos 150 projetos que captaram recursos durante as três décadas de legislação, o segmento das Artes Cênicas apresentou mais propostas pelo Pronac, com R$ 17,5 milhões arrecadados. O segundo, Música, apresentou 32 projetos e foi o que mais angariou fundos, com R$ 20,8 milhões. Nos municípios, Santo André reuniu o maior número de proponentes, com 73, acumulando também a captação mais expressiva, com R$ 31,92 milhões. (tabela completa abaixo)
O projeto mais caro, de 2021, captou R$ 8,5 milhões, em São Bernardo, de nome Marc Chagall: Sonho de amor, uma “exposição itinerante de arte e memória”, homenageando o pintor, ceramista e gravurista surrealista belarusso-francês. No mesmo ano, a proposta de nome Então é Natal, de Mauá, propôs um espetáculo musical apresentado por um coral acompanhado de uma banda, mas teve apenas R$ 100 de valor captado, o menor em três décadas na região.
Representando apenas 0,58% do valor total captado pelo Estado, os R$ 66,3 milhões da região ainda enfrentam um problema. Grande parte do montante captado no Grande ABC não foi investido nas sete cidades, como, por exemplo, a construção do Teatro Padre Bento (R$ 1,8 milhão), em Guarulhos, por meio de recursos de um proponente de Rio Grande da Serra, além da São Paulo Oktoberfest, de 2020 (R$ 2,8 milhões), e edições do Prêmio Porto Seguro Fotografia, de 2001 a 2011, com propostas enviadas de Santo André.
Conforme explica o secretário nacional de Economia Criativa e Fomento Cultural – Pasta ligada ao MinC –, Henilton Menezes, a lei não obriga o proponente a usar o recurso na cidade de origem da proposta. “A lei não tem essa obrigação, isso acontece, é muito comum. Dando um exemplo, o maior projeto de festa popular no Brasil, com exceção do carnaval do Rio de Janeiro, é o Festival Folclórico de Parintins, que acontece no Amazonas, e ele é quase que totalmente mantido pela Rouanet. A proponente deste projeto tem sede em São Paulo, e quando se puxa pelo sistema esta como São Paulo”, revela.
Segundo o secretário, as leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc estão fazendo este papel. “Existe uma relação federativa, onde o MinC repassa dinheiro aos próprios municípios e Estados. Em fomento direito, sem terceiro elemento”, finaliza Menezes.
Conforme mostrou o Diário em julho, o Grande ABC terá R$ 21 milhões disponíveis para o setor cultural por meio da Lei Paulo Gustavo. A região teve seu plano de ação aprovado pelo MinC e já prepara seus editais.
Secretário nacional explica a lei após ataques ao incentivo fiscal para a cultura
Em entrevista ao Diário, o secretário nacional de Economia Criativa e Fomento Cultural – pasta ligada ao MinC (Ministério da Cultura) –, Henilton Menezes, defendeu a Lei Rouanet, mecanismo de incentivo fiscal para a cultura, sancionada visando fomentar a atividade do setor no Brasil, em 1992. Conforme explica Menezes, por meio da legislação, o governo “abdica dos impostos para que o setor se desenvolva”.
Nela, o agente cultural apresenta seu projeto para o MinC, que avalia se está dentro dos parâmetros legais. Depois, o proponente busca um investidor, que pode fornecer para o projeto, se for pessoa física, até 6% do imposto federal, e, se for jurídica, até 4%.
“A Rouanet é um mecanismo de incentivo fiscal, concedido pelo Governo Federal para desenvolvimento de um segmento econômico do Brasil. O governo concede incentivos fiscais a dezenas de outras áreas da economia. Essa leitura que o incentivo fiscal para a cultura é ‘mamata’ é totalmente torta e enviesada e, de certa forma, é maldosa. Nós, do setor cultural, representamos hoje, 3,1% do PIB, conforme mostra dados recentes do Observatório Itaú Cultural de 2023”, explica Menezes.
Do outro lado da história, Sergio Schuindt, diretor da Orquestra Locomotiva, instituição de Santo André, que nos últimos 15 anos atua na inclusão sociocultural de crianças e adolescentes, transformando realidades através do ensino da música, também defende a legislação e avalia o impacto da lei na vida das cerca de 600 pessoas que participam de seu projeto.
“Os alunos que passam pelo Locomotiva tem uma melhoria no comportamento, além de aumentar suas notas nas escolas, e vários têm avanços em questões emocionais, pois eram retraídos, tímidos e até depressivos, mas encontraram nesse ambiente a amizade, cuidado e realização”, ressalta Sergio. Hoje, o valor captado pela lei representa 40% dos recursos da orquestra, que atende as crianças de segunda a sexta-feira.
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