Tão logo a pandemia da Covid-19 tenha arrefecimento serão iniciadas avaliações mais conclusivas que nos permitam melhor preparo perante novas adversidades. A maior suscetibilidade de pacientes obesos para evoluir com formas graves desta infecção trará de volta a discussão sobre as causas e tratamentos de obesidade, com o reaparecimento de velhas e ineficazes teorias.
É comum o surgimento de conceitos alimentares emagrecedores que eclodem tais quais vulcões em fumegantes lavas, contudo, se estas erupções incandescentes são devastadoras nas paisagens que alcançam, as alternativas nutricionais propostas habitualmente são revolucionárias até serem colocadas à prova. A falência destes modelos dietéticos bem-intencionados se deve à fisiológica submissão humana aos desenlaces químicos cerebrais e não pela falta de força de vontade dos pretendentes à boa forma.
Adicionalmente, ainda que tais doutrinas dietéticas intituladas inovadoras por seus criadores não sejam claramente danosas, estão longe de serem inocentes, seja pela neurose proposta ao estimular a contagem de itens como castanhas, sementes, bagos de uvas, gomos de tangerina e outros, ou, por possibilitar deficiências ao retirar importantes integrantes da dieta.
A determinação de nosso comportamento alimentar é exercida por dois mecanismos básicos, sendo o mais importante representado pelos nossos centros de fome e saciedade, os quais recebem e processam informações orgânicas que norteiam a reposição energética. Outro caminho envolve o prazer gerado por determinados alimentos, conhecido como hedonismo alimentar, o qual pode sugerir ou impor o consumo de inúmeros alimentos.
Comer o que gostamos é uma sugestão se estamos obedecendo o comando fisiológico da fome, mas passa a ser imposição quando ordens partem de áreas do cérebro relacionadas a recompensa, as quais se confortam com ofertas específicas, incluindo drogas sintéticas e componentes alimentícios. O fator complicador é a intimidade destas áreas com o sistema emocional, portanto, desconfortos emotivos de qualquer natureza impõem absurdo desejo por alimentos (ou drogas) que aprazerem os setores de recompensa para, então, restabelecer o bem-estar emocional.
Assim, se é humano ocasionalmente passarmos do ponto degustando aquilo que gostamos, em alguns transtornos emocionais o exagero é quase terapêutico (ainda que insalubre).
Embora o competitivo mundo moderno com as suas expectativas e frustrações ofereça as condições descritas anteriormente para desmedidas aquisições calóricas, existem compostos no meio ambiente tão ou mais importantes para o patrocínio da pandêmica obesidade mundial. Estruturas químicas de toda a sorte, notadamente aquelas encontradas em alimentos processados, são capazes de alterar nossos fisiológicos centros de saciedade e fome, condicionando ingestas muito maiores que as necessárias.
É indiscutível o envolvimento da intimidade genética e (principalmente?) epigenética (fica para outro artigo) no aporte energético excessivo, assim como a capacitação orgânica para o acúmulo desses excedentes na forma de reservatórios de gordura, embora o dimensionamento desta relação seja ainda desconhecido. É legítimo anotar que o obeso não tem culpa e sim desejos, obedece a ordens cerebrais que não estão sob seus domínios e, portanto, raramente sustentam suas magrezas. O realinhamento nutricional e o abandono do sedentarismo podem levar a discretos (e importantes) emagrecimentos, melhorando muitos setores orgânicos e evitando ganhos adicionais na balança, porém, substanciais e sustentáveis perdas ponderais solicitam tratamentos clínicos por tempo indeterminado e/ou soluções cirúrgicas.
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