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'A Mulher Caixa' é inspirado numa lenda indígena
Do Diário do Grande ABC
15/05/2000 | 16:40
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Uma lenda amazônica deve surpreender os finlandeses da cidade de Helsinque, a partir de quinta-feira. Durante quatro dias, o grupo brasileiro Pinus Ploft, dirigido por Darci Figueiredo, vai estar nas ruas com seu inusitado espetáculo de um minuto, para apenas um espectador, "A Mulher Caixa".

Como em Sao Paulo - local de origem do grupo - o espetáculo ocorre em plena rua. Com figurinos especialmente elaborado por J.C. Serroni - espécie de mantos que misturam grafismos indígenas, africanos e finlandeses - duas atrizes e um ator atraem a atençao do público. Um arauto anuncia aos passantes - detalhe, em finlandês, no caso de Helsinque - a presença de uma mítica figura.

Trata-se da mulher caixa - corpo de mulher, cabeça em forma de caixa -, um mito amazônico. Num estilo circense, o arauto avisa que aquele ser estranho é uma mulher muito especial. "Ela foi encontrada há mil anos, por um jovem índio, às margens do Rio Negro". Quem quiser, pode fazer fila para ouvi-la contar sua história. "Quem já ouviu, ficou maravilhado e nunca esqueceu", anuncia. "A apresentaçao é grátis, mas para participar tem uma condiçao: o que o espectador ouve nao pode revelar a ninguém durante, pelo menos, três dias".

Os curiosos fazem fila e sao orientados por um condutor. Ele é responsável por acomodar o espectador diante da caixa, uma espécie de instalaçao cujo formato remete à máquina fotográfica dos antigos "lambe-lambes". O grande manto, as luvas coloridas e um sapato especialmente criado por Serroni escondem totalmente o corpo da atriz.

Efeitos - Para ver seu rosto, é preciso levantar a cortina que protege a "entrada", uma espécie de visor da caixa. Dentro da caixa, alguns elementos cênicos e efeitos de iluminaçao. O que diz a atriz - texto de um minuto de duraçao -, evidentemente, nao pode ser revelado. "A Mulher Caixa" fará apresentaçoes em Helsinque entre os dias 18 e 21 de maio a convite do governo local, dentro do programa "People and Development 2000".

Entre os dias 29 de junho e 8 de julho estará em Grahmstown, Africa do Sul, no Standard Bank National Arts Festival, onde as apresentaçoes vao ser feitas em inglês. Criada em 1994, por Darci Figueiredo, a performance já contou com a participaçao de diversos atores e atrizes. O texto está traduzido nos idiomas tupi, inglês, japonês e finlandês. Atualmente, três atores estudam vietnamita para as apresentaçoes agendadas no Vietna, ano que vem.

Além de viajar pelo Brasil, A Mulher Caixa já se apresentou na cidade de Sao Francisco, na Califórnia, nos EUA, e em Tóquio, Fuji e Zizumi, no Japao. As atrizes Joana Curvo e Val Viana atuam, respectivamente, como mulher caixa e condutor. Osmar Beneson será o arauto na Finlândia e Fátima Ribeiro, na Africa do Sul.

Novos rumos - Curiosamente, o criador da performance tem formaçao bastante tradicional. "Fiz meu primeiro curso de teatro com a atriz Berta Zemel e, em 1979, entrei para a EAD (Escola de Arte Dramática), dirigida por Alfredo Mesquita". Um ano depois de formado, em 1985, interpretava o papel de Mercúcio, na montagem de "Romeu e Julieta" dirigida por Antunes Filho e, em seguida, viveu o papel de Maanape, no elenco do antológico espetáculo "Macunaíma", do mesmo diretor.

Deixou o grupo do Antunes, mas nao o interesse ali despertado pelo universo da cultura brasileira indígena. Pouco depois, ganhou os primeiros prêmios como diretor pela encenaçao de "Tarô-Bequê", de Márcio de Souza, espetáculo que o levou a Amazônia. "Passei dez anos indo ao Amazonas pelo menos duas vezes ao ano".

Subitamente, Darci decidiu mudar o rumo de sua carreira. "Dirigir, ganhar prêmios, tudo isso é muito bom, mas resolvi que queria criar minha própria linguagem teatral", conta. "Queria antes de mais nada independência". Sentia-se incomodado com a maratona a ser enfrentada a cada nova produçao. "Nao sou um pedinte e descobri que nao gostaria tanto desse ofício, caso ele me obrigasse a implorar por verbas de patrocinadores ou de governo a cada novo projeto".

Darci nao nega a importância do apoio, tanto que só faz espetáculos de graça para o público, comprados por instituiçoes públicas ou privadas. A sua linguagem teatral permite. "Todos os figurinos sao feitos de sucata, material reciclado", diz. Tudo foi criado a partir de uma profunda pesquisa da cultura indígena. "Mas nao sou reverente com essa cultura, brinco com ela, como os índios também fazem".




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