Setecidades Titulo
Grande ABC tem 1,5 mil pessoas desaparecidas
Javier Contreras
Do Diário do Grande ABC
25/01/2003 | 18:15
Compartilhar notícia


O sofrimento talvez seja maior do que a dor da própria morte. Esse é o sentimento compartilhado por pessoas que têm familiares desaparecidos. Os números impressionam: só no Grande ABC, quase 1,5 mil pessoas desapareceram no ano passado, média de 125 casos por mês.

O retrato do desespero e também da esperança dessas famílias pode ser observado em pequenos detalhes em suas casas, como fotografias nas paredes ou a manutenção de objetos pessoais dos desaparecidos. Um simples brinquedo ou alguma roupa. Alguns quartos, hoje solitários, são mantidos intactos, ano após ano. Enquanto conversam com a reportagem, essas pessoas choram e pedem ajuda. Não entendem as circunstâncias ou os motivos que fizeram seus parentes sumirem de repente.

O menino Wesley de Almeida Dias desapareceu em outubro de 1998, aos 3 anos, após ter saído com o padrasto, em São Bernardo. Nunca mais foi visto. André Vieira Jerônimo, 25, saiu de casa para comprar roupa para o casamento do irmão, em dezembro do ano 2000, em Mauá. Desapareceu. O garoto Cleiton Bezerra da Silva, 16, foi a uma padaria próxima de sua casa, em Santo André. Jamais voltou para casa.

Segundo registros das delegacias seccionais da região, no ano passado 1.452 mil casos de desaparecimento foram notificados em boletins de ocorrência na região. O número corresponde a 8% do que foi registrado em todo o Estado, 18.151 casos. No mesmo ano, foram registrados 6.516 casos de desaparecimento somente na capital paulista.

Os dados pertencem à DHPP (Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa) de São Paulo. Segundo os registros policiais, 60% dos desaparecidos são homens. Desses números, em relação ao Estado, 53% dos desaparecidos são adultos com mais de 18 anos. Outros 32% são de adolescentes com idade entre 13 e 18 anos, enquanto crianças e pré-adolescentes, entre 8 e 12 anos, somam 9% dos casos. Crianças e bebês até 7 anos que desaparecem são somente 2% dos casos registrados. Outros 4% pertencem a pessoas desaparecidas cuja idade não foi informada à polícia.

Segundo o delegado titular da Delegacia de Desaparecidos do DHPP, José Flamínio Ramos Martins, mais da metade dos casos são esclarecidos. “Não necessariamente através de investigação, mas por meio de informações passadas para nós ou por órgãos que as dispõem e fazem esse tipo de trabalho. É um trabalho não só policial, mas também social. Precisamos de toda e qualquer informação”, disse o delegado.

Motivos – Segundo instituições que trabalham exclusivamente com casos de desaparecidos, os motivos do sumiço das pessoas são vários: econômico, conflitos familiares, violência doméstica ou negligência da família.

Em muitos casos, porém, esses motivos caem por terra. Giovana Dias Strufaldi desapareceu em março de 2000, aos 19 anos. Filha de família de classe média alta de Santo André, ela não tinha problemas de relacionamento em casa ou no colégio. Saiu com a roupa do corpo e jamais voltou para casa.

Outros casos de desaparecimento acontecem com pessoas portadoras de algum tipo de deficiência mental ou física. O desaparecimento de Adriana Pereira da Silva, 17 anos, foi um dos casos de sucesso. Ela, que tem deficiência fonoauditiva, se perdeu na saída da escola e foi encontrada meses depois em um Conselho Tutelar de Franco da Rocha, na Grande São Paulo. “Muitos dos casos são misteriosos mesmo. A família não tem nenhuma informação sobre o porquê do desaparecimento”, disse José Manuel, responsável pelo Setor de Pessoas Desaparecidas do governo do Estado.

“Há muita preocupação com pessoas que tenham deficiência física ou mental, pois elas se perdem e não sabem dizer seu nome ou endereço. Familiares têm de ficar atentos o tempo todo”, disse Clarice Silva Barbosa, presidente da ONG (Organização Não-Governamental) Mães do Brasil, da capital.

Na realidade, os casos são distintos e, muitas vezes, não há explicação alguma. Algumas apresentam pistas ou indícios. Enquanto houver um fio de esperança, mães, pais, irmãos percorrem as ruas e viadutos, visitam IMLs (Institutos Médicos-Legais) e andam em favelas procurando e distribuindo centenas de cartazes com as fotos de seus familiares.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;