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Famílias preparam
retorno ao Macuco
Renan Fonseca
Do Diário do Grande ABC
31/03/2011 | 07:20
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Com o fim do verão e a estiagem das chuvas, o morro do Macuco, em Mauá, passou a ter um movimento diferente daquele que se viu em dias de temporais. Agora, algumas das famílias que foram obrigadas a deixar seus lares se organizam para levantar paredes e refazer a antiga vizinhança. Desde janeiro, a Prefeitura demoliu mais de dez casas e barracos que ameaçavam desabar ou foram atingidas por deslizamentos de terra.

O cenário visto hoje no local onde morreram quatro pessoas, vítimas de escorregamento de terra, é de decadência. Poucas pessoas circulam nas vielas. Não se vê mais os carrinhos abarrotados de roupas e restos de imóveis sendo puxados morro abaixo.

Porém, na frente da ruína de uma casa ou mesmo subindo uma encosta, materiais de construção, como pás, carrinhos de mão e areia, foram dispostos recentemente pelos antigos moradores. Ao fim da Rua Lourival Portal Filho, paredes de residências que foram destruídas estão sendo refeitas.

A equipe do Diário que esteve ontem no morro não encontrou os proprietários das moradias, mas vizinhos revelam que estão reconstruindo devagar. "Eles vêm aqui de vez em quando. Dizem que a Prefeitura não pagou mais o auxílio emergencial, e por isso vão voltar", disse Fânia Aparecida de Assis, 20 anos. Ela foi uma das pessoas que tiveram de voltar para a casa interditada por não terem conseguido um aluguel que coubesse no bolso.

Ela, o filho, dois irmãos e a avó voltaram na semana passada a ocupar pequena moradia, próxima do lugar onde aconteceu o primeiro deslizamento de terra no Macuco. Ao lado, uma família tenta reerguer o lar. "Está todo mundo na mesma situação. A Prefeitura só pagou a primeira mensalidade. Já desisti de procurar casa para alugar", falou.

"As pessoas não conseguiram alugar nada com o dinheiro da Prefeitura, assim como a gente", disse Ivan de Souza Lira, 36, que ainda mora no Macuco com a família. Ele teve a casa interditada em janeiro, mas até hoje não conseguiu encontrar um lar mais seguro. "Faltei muitas vezes no trabalho para procurar uma casa para alugar, até fui demitido por isso. Ninguém aluga sem fiador, ainda mais por um valor tão baixo", criticou o desempregado, sobre o valor de R$ 300 oferecido pela Prefeitura.

Quando ameaça chover, Lira e a mulher montam guarda na porta de casa. "Durmo até 1h da manhã. Daí, fico no lugar dela, observando a chuva e tentando ouvir algum estalo. Se acontecer alguma coisa, temos que pegar as crianças e sair correndo", relatou.

Auxílio-aluguel da CDHU está previsto para ser pago em abril

Abandonadas pela Prefeitura de Mauá, as 701 famílias inclusas no auxílio-moradia emergencial devem passar a receber o benefício da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) nos primeiros dias de abril. São mais de R$ 210 mil desembolsados pelo Estado para as famílias em Mauá. O Ministério da Integração Nacional depositou para a Prefeitura cerca de R$ 2 milhões para reverter os danos provocados pelas chuvas.

Em janeiro, a Prefeitura prometeu arcar com parte do aluguel de moradores que foram prejudicados pelas tempestades e abalos geológicos. Porém, apenas a primeira parcela, de R$ 300, foi repassada para as vítimas.

Em fevereiro, o benefício foi suspenso, deixando à própria sorte todas as famílias. Dois protestos foram feitos, mas a administração nada fez para mudar a situação. O prefeito Oswaldo Dias (PT) pediu ajuda do governo do Estado por meio da CDHU, que agora vai arcar com o programa. A companhia também anunciou incluir 358 famílias no programa Novo Começo, que concede R$ 1.000 para compra de móveis.

A tenda improvisada pela Prefeitura no Jardim Zaíra, que serviu de abrigo durante as fortes chuvas para algumas famílias, hoje está entregue ao tempo. Ninguém mais dorme debaixo daquela lona, que já apresenta alguns rasgos. Apenas um GCM (Guarda Civil Municipal) vigia a tenda. A Prefeitura não informou o que pretende fazer com o lugar.

Amigos continuam no terminal de ônibus

Continuam lá, parados, sem emprego, comida e ajuda. A casa foi perdida durante enchente em janeiro - quando uma aposentada morreu afogada. Quatro amigos, dois deles irmãos gêmeos, afirmam que já trabalharam com carteira assinada. Todos no ramo da construção.

Todos ainda têm seus sonhos. Mas, por ora, o alimento aparece pela mão dos que têm pena. Cobertores e colchões vieram de igrejas católicas. À noite, dormem em marquises de comércios. Durante o dia, ficam entre os colegas de profissão que erguem um terminal de ônibus, onde antes era quartel do Corpo de Bombeiros - removido pela Prefeitura - no Jardim Zaíra.

Os gêmeos Cosmo e Damião do Carmo Mendes dos Santos, 38 anos, Edimar Melo da Silva, 35, e Carlos Augusto de Souza, 44, amigos que moravam na mesma casa levada pelas águas do córrego que corre paralelo à Avenida Castelo Branco, em Mauá, ainda esperam ajuda da Prefeitura. Desde a noite da enchente (18 de janeiro) eles vivem no canteiro de obras do terminal.

"O engenheiro disse que a gente pode ficar aqui até a obra terminar", contou Cosmo. "Já pedimos ajuda para a Prefeitura, mas não fazem nada. Temos profissão, só queremos voltar a trabalhar", queixou-se Damião.

A história deles já foi contada pelo Diário no mês em que aconteceu a tragédia. Mas, assim como da primeira vez, a Prefeitura não se manifestou sobre a situação dos quatro companheiros.




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