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População LGBT cobra respaldo para denunciar discriminação

Mês de combate à homofobia é usado para destacar casos de intolerância enfrentados no dia a dia

Bia Moço
Especial para o Diário
11/05/2018 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


Maio é considerado o mês de combate à homofobia e à transfobia. Nesta data, o público LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) aproveita para cobrar respaldo dos órgãos públicos em relação às denúncias formais de discriminação sofridas, conforme prevê a lei estadual 10.948/2001. Devido à inexistência de legislação específica que criminalize a diferenciação em razão da orientação sexual, moradores da região relatam o sofrimento diário a que são submetidos, seja por meio de violência física e psicológica de agressores ou com relação ao descaso das autoridades.

Oficialmente, não há registros formais de homofobia e transfobia por meio de boletins de ocorrência entre as sete cidades, conforme a equipe do Diário apurou com as delegacias seccionais. Isso não quer dizer, entretanto, que a população LGBT vem sendo respeitada. 

Exemplo é o caso do estudante de Biomedicina Lucas Henrique da Silva Celestino, 21 anos, que há pouco mais de quatro meses procurou delegacia em Santo André para registrar discriminação sofrida e foi tratado com “deboche”. “Ouvi que registrar boletim de ocorrência contra homofobia é até engraçado e que deveria fazer boletim de ocorrência pela internet. O delegado do plantão disse que ele tinha mais o que fazer, como se meu caso fosse algo sem importância. Saí da delegacia me sentindo um lixo, devido tanta indiferença”, relata.

Conforme Celestino, é comum ouvir relatos de amigos que deixam de registrar casos de intolerância por constrangimento. “Vamos pedir ajuda e somos escorraçados. Melhor deixar quieto. Já não basta ser humilhado e agredido, ainda tem de ver policial rindo da nossa cara? As pessoas não entendem que somos gente como todos. Opção sexual não deveria ser um divisor de águas na sociedade, o que infelizmente ainda acontece”, lamenta.

NO TRABALHO

Devido aos diversos problemas de intolerância e discriminação enfrentados no dia a dia, Celestino precisou iniciar tratamento psiquiátrico, tendo em vista quadro de depressão desenvolvido. “Fui demitido da empresa onde trabalhava por preconceito. Minha gerente me perseguia e, inclusive, mandou mensagem para um colega dizendo que eu era ‘do mal, um ser das trevas’. Tudo isso pela minha opção sexual.”

Outro episódio relatado pelo estudante foi acusação de roubo sofrida no trabalho. Segundo ele, ouviu a frase “o veadinho deve ter levado a grana”, de funcionários colegas. “Depois descobriram que haviam feito conta errada. A gerente tinha nojo de mim e queria colocar as pessoas contra mim. Saí de lá há uma semana, mas há quatro meses abri processo contra a empresa e contra a gerente. Registrar (a denúncia) na delegacia não consegui, mas fui em busca dos meus direitos.”

Embora receba todo o respaldo necessário por parte da família, Celestino ressalta estar “em processo de reaceitação”, por conta da pressão psicológica enfrentada no emprego. “Diria a todos que têm opção sexual diferente daquela que a sociedade julga certa que não baixem a cabeça e lutem pelos seus direitos. Não é justo termos de sofrer por falta de conhecimento das pessoas.”

Até o fechamento desta edição, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) do Estado não havia se pronunciado.

Consórcio projeta tribunal para mediar conflitos na região

Com objetivo de criar grupos de trabalho que intensifique ações na região, em 2014, o GT (Grupo de Trabalho) Direitos Humanos do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC criou o Grupo Temático LGBT. A intenção era construir ações relativas à população lésbica, gay, bissexual, travesti e transexual, a fim de intensificar a aproximação do poder público das necessidades desses cidadãos.

No entanto, fundador e presidente da ONG ABCD’S (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), Marcelo Gil destaca que atuação do GT é precária. Para ele, o Consórcio é um “elefante branco” quanto às ações para o público LGTB. 

A entidade regional justifica que, em 2017, realizou diversas ações e que já está em articulação com o Tribunal de Justiça e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para a criação de Tribunal de Mediação de Conflitos para atender demandas de LGBTfobia, de racismo e de preconceito contra pessoas soropositivas.

Além disso, por meio de nota destaca que “o GT LGBT tem atuado na estruturação do Plano Regional de Enfrentamento à LGBTfobia” e que também trabalha para a promoção de políticas públicas para igualdade na região.

ONG defende instalação de delegacia específica no Grande ABC

Ao ressaltar que a Capital investe em programas e departamentos destinados ao público LGBT, o fundador e presidente da ONG ABCD’S (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), Marcelo Gil, avalia que as prefeituras da região deixam a desejar, principalmente no quesito de direitos humanos.

“Lamentavelmente, há mais de uma década, desde quando se fala em políticas públicas LGBT, isso não é efetivado para população do Grande ABC. O poder público não dispõe de coordenadoria e assessoria para esta parte da sociedade. Estão esquecendo que nós somos uma grande parcela, estamos presentes, e as pessoas não querem nos enxergar, pelo preconceito ou pela discriminação”, ressalta Marcelo Gil.

Para o presidente da ONG ABCD’S, a sociedade LGBT não está sendo ouvida, seja pela população ou pelo poder público. “São Bernardo é campeã em casos de assassinatos de travestis. Neste ano, encontraram o corpo de um no Terminal Ferrazópolis. Cadê os inquéritos? O problema é que as pessoas fazem denúncia, só que não são ouvidas.”

Marcelo Gil lamenta ainda a quantidade de casos de ‘estupro corretivo’ sofrida por transsexuais e cobra medidas preventivas. “A Delegacia da Mulher deveria funcionar 24 horas. Deveriam trazer para o Grande ABC o Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância). Não dá para fechar os olhos, a demanda é grande e precisamos destacar que a luta é pela LGBTfobia.”




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