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Manoel Carlos foge do cotidiano morno
Renata Petrocelli
Da TV Press
09/04/2003 | 20:11
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Uma das marcas registradas de Manoel Carlos é seu gosto pelo cotidiano. Com um texto que costuma extrair poesia de pequenos fatos do dia-a-dia, o autor conquista a audiência a partir da identificação com personagens simples, dando voz a porteiros, empregadas domésticas e motoristas, que ganham nome e atitude em suas tramas. Em Mulheres Apaixonadas, no entanto, Manoel parece empenhado em dar tons mais polêmicos a seu retrato da realidade. Talvez pela falta de um forte tema central (como a leucemia em Laços de Família ou a troca de bebês em Por Amor), o autor investe ao mesmo tempo em uma série de tramas que, no mínimo, fogem ao convencional.

Muitos dos conflitos estão longe de ser novidade na teledramaturgia brasileira e até mesmo na obra de Manoel. O romance entre uma mulher mais velha e um homem mais jovem era o ponto de partida de Laços de Família, enquanto o homossexualismo foi um dos pontos altos dos momentos finais de Por Amor. Paula e Rodrigo, vividos por Ana Roberta Gualda e Leonardo Miggiorin, também não são os primeiros a rejeitar os pais, por preconceito ou rebeldia.

Mas Mulheres Apaixonadas mistura tudo isso e mais uma mulher rica que se apaixona por um padre, uma professora que se envolve com um aluno, uma neta que destrata e rouba os avós e uma suposta amante que, ao que tudo indica, deve ser a mãe do filho adotado pelo casal Téo e Helena, vividos por Tony Ramos e Christiane Torloni. Em meio a tanta polêmica, o conflito de Helena diante de um casamento morno e do reencontro com um amor do passado parece até mais banal do que deveria ser.

A estratégia, no entanto, rende excelentes resultados, já que permite ao autor dar fôlego às tramas na exata medida de sua repercussão junto ao público. Ou, até, de necessidades mais específicas da novela. Foi assim, por exemplo, que Manoel conseguiu adiar em uma semana o reencontro entre Helena e César, personagem de José Mayer, evitando que fosse exibido durante o Carnaval. O público, em vez de sentir qualquer hiato na história, consolidou a média de audiência em torno dos 40 pontos.

Enquanto isso, o autor, que sempre transforma a música em um dos destaques de seus trabalhos, vai brincando de maestro. Intensifica uns movimentos, deixa outros em suspenso, suaviza ou sublinha os assuntos. O clima entre Raquel e Fred, personagens de Helena Ranaldi e Pedro Furtado, começou forçado, com a professora escrevendo o nome do aluno no espelho do quarto depois de vê-lo uma única vez, dentro da piscina, nadando. Mas Manoel freou a história e agora a atração entre os dois ganha ares de convivência e encantamento bastante críveis. Já o romance de Lorena e Expedito, vividos por Suzana Vieira e Rafael Calomeni, esquentou e já rendeu excelentes momentos à novela. O bonitão da hora ainda tem muito a aprender, mas não chega a fazer feio e a parceria com Suzana funciona muito bem.

Outro conflito que ainda deve ir longe é o de Dóris, personagem de Regiane Alves, com os avós, vividos por Carmem Silva e Oswaldo Louzada. As cenas são sempre emocionantes e o autor não deixa dúvidas: a menina ambiciosa é mesmo uma vilãzinha daquelas. A história só terá a ganhar quando enveredar de fato na campanha pela terceira idade.

Por outro lado, Manoel mantém em banho-maria as duas tramas talvez mais polêmicas da novela. Depois que Estela, vivida por Lavínia Vlasak, confessou seu amor por padre Pedro, personagem de Nicola Siri, o assunto não evoluiu muito além dos constantes falatórios da moça em suas insuportáveis digressões etílicas. A personagem é tão chata que o autor corre o risco de acabar perdendo o ponto da história. Exatamente o contrário do que acontece com Clara e Rafaela, vividas por Aline Moraes e Paula Picarelli. Testando a receptividade do público, Manoel insinua, mas não deixa claro o envolvimento homossexual das duas. A situação abre espaço para uma série de excelentes cenas que discutem o preconceito, como a reunião de Helena com a mãe de Clara na escola. Com diálogo brilhante, o encontro é um exemplo da maestria do autor: o gancho pode ser a polêmica, mas é no desenrolar das ações cotidianas que o assunto ganha força.




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