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Grito e medo na rotina dos vizinhos de cadeias no ABC
Maurício Rodrigues
Da Redaçao
19/08/2000 | 18:01
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Moradores de três bairros do Grande ABC vivem em estado de alerta. Eles têm casas na vizinhança de cadeias e nao raro acordam durante a madrugada ao som de gemidos e gritos produzidos por presos e policiais. Para eles, o pior temor é a invasao dos homens-lama, apelido dado aos detentos que escapam por túneis. "É o maior medo. Dependendo do número de fugitivos, nem saio de casa. Fico trancada", afirma a cabeleireira Valda Bezerra, 34 anos, vizinha do 1º Distrito de Sao Bernardo.

O problema atinge moradores da Vila Tupi, em Sao Bernardo, regiao do 1º Distrito, Vila Sacadura Cabral, em Santo André, área do 4º Distrito e do cadeiao (Dacar-7), e Jardim Itacolomi, em Ribeirao Pires, onde está instalado o 1º Distrito. "Nosso alerta é a gritaria. Em seguida, ouvimos o barulho de tiros ou sirene, sem esquecer o motor do helicóptero. Sabemos que vamos enfrentar algumas horas de tensao", conta a dona de casa Ana Maria da Silva Detoncini, 37 anos, há 14 vizinha da cadeia de Ribeirao Pires.

Ana diz já estar acostumada, mas instalou grades em todas as janelas. "Minha casa fica na rota de fuga. A melhor coisa é trancar tudo", comenta a moradora. "Já flagrei os presos escapando. Eles vao tirando a roupa e entrando no mato. Nao dá para fazer nada." Segundo a moradora, sua filha de 10 anos teve problemas gástricos devido à forte tensao durante uma fuga. "Ela ficou três dias internada", lembra.

Um dos mais novos moradores do Jardim Itacolomi é o comerciante Renato Casalinuovo, 31 anos. "Ainda estou me adaptando. Quando começa a gritaria, prefiro ficar deitado", conta. Na madrugada do último dia 11, quando houve fuga no 1º Distrito, ele teve de atender à polícia. "Os policiais acharam que um preso estava escondido nos fundos da minha casa. Reviraram o quintal, mas nao encontraram nada. Seria bom nao ter tantos presos nessa cadeia." A carceragem de Ribeirao Pires abriga 350 detentos.

Os homens-lama também povoam os pesadelos do comerciante Aleomar Alves Soares, 33 anos, dono de uma venda na rua dos Vianas, atrás do 1º Distrito de Sao Bernardo. "É de assustar. Sao homens cor de barro, quase nus. Eles saem dos túneis e pegam quem estiver pela frente", disse Soares. O contador Dorival Rebello Rodas, 41 anos, que tem escritório há seis anos em frente ao pátio do Ciretran, uma das principais rotas de fuga, também reclama. "Nao posso instalar um balcao de atendimento. Meus clientes poderiam virar reféns", afirma. Atualmente, 400 homens ocupam as celas do 1º Distrito de Sao Bernardo.

As rebelioes de presos ou de menores infratores ocorridas no cadeiao da Vila Sacadura Cabral, em Santo André, poem em alerta também pais que têm crianças estudando na Emei Monsenhor Cavalcanti, localizada em frente ao presídio. "É só perceber a agitaçao e eu corro para buscar minha neta", diz a dona de casa Gedalta Brito de Deus, 62 anos.

Segundo Gedalta, durante as fugas é comum escutar os detentos andando nos telhados. "É uma realidade muito assustadora", define a moradora, que reside desde 1957 no bairro. "Eu tenho muito medo de trazer meu filho na escola por causa da cadeia. Uma bala perdida pode encontrar a gente. Detesto ser vizinha do presídio. Quero ir para o interior", conta a dona de casa Edinéia Nascimento de Brito, 25 anos, moradora na favela Tamarutaca.




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