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Queridos peçonhentos
Mariana Trigo
Da TV Press
16/11/2006 | 21:16
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Cobras & Lagartos chega nesta sexta-feira ao fim comprovando que o público gosta mesmo é de bichos peçonhentos. Quanto mais venenoso, melhor. Dos míseros 27 pontos de média de Bang Bang, última trama das sete da Globo, o horário decolou para a média de 44 pontos e 65 de participação através da ácida história de João Emanuel Carneiro.

O tom de humor negro, presente em quase todos os núcleos e personagens da história, garantiu a diversão apelando pelo exagero. Quanto mais “over”, melhor. Ultrapassar os limites da ética e da falta de caráter através dos vilões, por exemplo, trouxe alguma polêmica junto ao público, que se manifestou pedindo à emissora menos perversidade na novela.

Mas o autor conseguiu instilar veneno com cautela. A freqüente dose de inconseqüência dos vilões amenizou o potencial nocivo de suas maldades, que foram diluídas com o texto engraçado e veloz.

A velocidade esteve presente também nas cenas ágeis e na edição quase de videoclipe, que garantiu “picotadas” visuais, o que sempre atrai a atenção do desconcentrado público deste horário. É o período do dia com muitas pessoas chegando em casa, crianças ainda acordadas e famílias conversando antes do jantar. Por isso mesmo, a agilidade nas cenas é tão necessária.

A escalação do elenco também foi uma cartada certeira do autor. Lázaro Ramos e Taís Araújo, como Foguinho e Ellen, puseram diversas cenas “no bolso” e tiveram o mérito de se destacar como antagonistas negros numa trama que justamente enfoca as diferenças sociais e o desequilíbrio econômico.

Isso sem falar de Carolina Dieckmann, que se sobressaiu com sua primeira vilã Leona, nome que acabou virando adjetivo para as louras más e gananciosas.

Em contrapartida, algumas personagens enveredaram por caminhos pouco criativos, como a caricata Milu de Marília Pêra. Na verdade, desde a minissérie JK, a conceituada atriz parece estar fora de forma em suas interpretações na telinha. Enquanto Sarah Kubitschek era apática demais, Milu extrapola em caras e bocas e tons muito acima do necessário.

Também numa linha equivocada seguiu Daniel de Oliveira, com seu eterno sotaque e jeito de mineiro ao interpretar um carioca. Não convenceu na determinação que Duda exigia de seu intérprete.

Mas o mais surpreendente mesmo, na reta final da novela, tem sido o eficiente desempenho de Cléo Pires, filha de Glória Pires. Apesar de afirmar que não faz a menor idéia se vai ou não seguir a carreira de atriz, Cléo parece demonstrar que a genética influencia no talento. Com sua Letícia, a novata demonstrou uma surpreendente maturidade.

O mesmo acerto também esteve presente no texto de João Emanuel e na direção de Wolf Maya. Através da cobiça, um dos sentimentos que mais movem os vilões na teledramaturgia, o autor fez um retrato fiel da sociedade contemporânea.

Claro que usou e abusou de muitas licenças poéticas, mas tratou da inversão de valores sempre de maneira eficaz, original e irônica. Da barateira Saara - que remete à região de comércio popular no Rio de Janeiro - até a sofisticada loja Luxus, - paródia da caríssima Daslu, João Emanuel costurou uma colcha de retalhos do universo da futilidade que cada vez mais movimenta a economia.




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