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Eleição de Mauá com sinais de inclusão

Mauaá terá 14 mesários surdos atuando em oito zonas eleitorais, a maioria no Jardim Zaíra.

Junior Carvalho
01/10/2016 | 22:34
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Celso Luiz

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Dia de eleição. Você chega à seção eleitoral com o título e documento com foto em mãos. Entrega ao mesário, que confere seus dados, registra presença e em questão de segundos você vota. Trabalho simples e visto por muitos como irrelevante pode significar inclusão social e mudar a vida de pessoas como Ives Haneda Lopes, 21 anos, José Mauro, 46, Lucinéia, 34, e Iara, 42, os três últimos irmãos da família Fagundes Sousa.

Além de moradores de Mauá, os quatro têm outras coisas em comum: são surdos e atuarão como mesários na cidade na eleição deste domingo. Eles fazem parte do Projeto Libras (Língua Brasileira de Sinais), da Justiça Eleitoral, que visa facilitar o exercício do voto para eleitores surdos ou com deficiência auditiva.

Em Mauá, serão 14 mesários surdos atuando em oito zonas eleitorais, a maioria no Jardim Zaíra. O projeto existe desde a eleição presidencial, há dois anos. Além de mesários, 31 locais de votação na cidade contarão com intérpretes de Libras, que auxiliarão eleitores surdos no exercício da democracia. A equipe usará camisetas diferenciadas para facilitar a identificação. “Antigamente,não sabia nada disso. Pensava que surdo nem poderia votar. Aí fui vendo, os surdos foram me falando. Me sinto feliz, incluso. Sinto orgulho de os surdos poderem trabalhar como mesários” relata Ives, que será mesário pela primeira vez.

José Mauro não é debutante nesse trabalho, mas esta eleição é especial, já que ele será presidente de mesa. “Vi que o mesário olhava os documentos dos eleitores e conferia as informações. Aí pensei: ‘Me sinto igual a elas. Sou capaz de fazer a mesma coisa’. É normal, dá para trabalhar tranquilo”, contou José Mauro, que tem surdez moderada. Ele é formado em Letras/Libras.

Vendo o irmão atuar nas eleições, Lucinéia e Iara, ambas surdas parcial e totalmente, aceitaram fazer o mesmo. “Eu sempre ia votar, observava os mesários e tinha muita vontade. Queria estar ali também. Pensava: ‘Será que é só para quem não é surdo?’. Tem que ficar falando com as pessoas, fiquei insegura. Depois, vi que meus irmãos conseguiram e decidi ajudar. Me interessei muito, acho importante trabalhar na eleição. Quem é ouvinte me pergunta: ‘Nossa, mas você consegue ser mesária?’. Consigo, sim. Quero mostrar que o surdo é capaz, que sou normal e que sou apenas sou surda”, disse Lucinéia.

Ela também ensina Libras em escolas municipais no Grande ABC. “Nasci surda por conta da genética da minha família. Descobri aos 5 anos que era surda, percebi que tinha dificuldades na comunicação com meus familiares ouvintes. Com o tempo, meus irmãos me orientaram, percebi que o surdo não é um coitadinho”, relembrou Iara.

A surdez dos três irmãos é hereditária, herdada da bisavó materna. Nem sempre, porém, a deficiência ultrapassa gerações. Às vezes, pode ser resultado de complicações no nascimento. A filha de Iara, Iasmin Fagundes, 21, não é surda. É interprete de Libras e também trabalhará na eleição. Foi com a ajuda dela que a equipe do Diário entrevistou os tios mesários e Ives, seu namorado.

TREINAMENTO
Coordenadora do projeto em Mauá, a chefe da 365º Zona Eleitoral da cidade, Cyntia Alves Conceição de Lima, explicou que os surdos são treinados a como agir em situações corriqueiras no dia do pleito, como esquecimento de documentos e título cancelado. “O objetivo é promover a inclusão, mostrar à pessoas que os surdos são capazes de desempenhar da melhor maneira qualquer trabalho, além de divulgar Libras, que é a segunda língua brasileira”, frisou.

Ao todo, 28 municípios receberão o projeto, mas Mauá é a única da região. As seções também disponibilizarão fones de ouvidos para urna para facilitar o voto do eleitor cego. Segundo o TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo), 191,3 mil eleitores no Estado se identificam como surdos ou deficientes auditivos. No Brasil, eles representam 1,1% da população, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 




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