Guaraní é sobre um velho que vive cercado de mulheres. Ele se recusa a falar espanhol. Seu idioma é o nativo, o guarani. Esse personagem parece resumir a tragédia histórica do Paraguai, cuja população masculina foi dizimada pela Tríplice Aliança, que incluía o Brasil, na grande guerra do século 19. O velho sonha com um neto varão, para perpetuar sua cultura. Faz uma longa viagem de mais de mil quilômetros, quando descobre que a filha está grávida de um menino em Buenos Aires. Leva a neta, filha dessa mesma mulher. Está indo para tentar convencê-la a voltar com o neto, ou, pelo contrário, para entregar-lhe a filha? O filme não é só minimalista. Termina em aberto, lindíssimo.
Carga Sellada, Carga Lacrada, inspira-se numa história real. Um trem militarizado percorre o Altiplano boliviano, levando uma carga tóxica. As populações sublevam-se ao longo da rota. Há uma mulher libertária dentro do trem, existem mulheres fortes, camponesas, protestando ao longo do caminho. E existe a própria diretora, Julia Vargas. Como uma mulher aciona o que parece um universo basicamente masculino, o da polícia militar, das armas? Ao contrário de Guaraní, em que a sensação é de que não ocorre nada, acontece muita coisa em Carga Sellada. Há um elemento xamânico, fantástico, na narrativa. As forças da terra - e do povo - triunfam. É um belo filme. A diretora não pôde vir. Vieram a atriz Daniela Lema e o ator Fernando Urze, que fala um português perfeito - embora nascido na Bolívia, criou-se no Rio. A competição latina, após o cubano Espejuelos Oscuros, esquenta.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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