Setecidades Titulo História
Estado abre estudo para tombar Fábrica de Sal

Com processo, é proibido demolir prédio
histórico; sessão termina sem votar projeto

Yara Ferraz
do Diário do Grande ABc
02/02/2016 | 07:07
Compartilhar notícia
Nario Barbosa/DGABC:


O Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) do Estado aprovou ontem a abertura de estudo de tombamento da Fábrica de Sal, em Ribeirão Pires. Com o processo em andamento, o imóvel não pode ser alterado ou demolido. O anúncio ocorreu após quase uma semana da publicação de reportagem no Diário que denunciava a intenção da Prefeitura de colocar o prédio histórico abaixo. O projeto seria votado ontem em sessão da Câmara da cidade, mas após protesto de entidades ligadas ao patrimônio, foi adiado (leia mais ao lado).

Ao contrário do que a Prefeitura havia informado inicialmente, foi elaborado projeto de lei de autoria do prefeito Saulo Benevides (PMDB) que determina que o terreno deve ser concedido ao uso particular pelo período de 99 anos e que a empresa deve ser responsável pela construção exclusivamente de um shopping center, que, segundo o texto, geraria empregos e facilitaria as compras da população.

O projeto foi apresentado aos vereadores em cima da hora, motivo que levou a atraso de uma hora para o início da sessão. Segundo os parlamentares, a falta de tempo para análise teria motivado o adiamento. “Acho que um projeto desta dimensão deve ter, no mínimo, uma audiência pública. O problema é que ia ter a votação e não tínhamos nem acesso ao projeto”, afirmou o vereador Renato Foresto (PT).

A vereadora Diva do Posto (PR) também reclamou da falta de tempo. “Eu não voto projeto de última hora. Ainda mais esse, para derrubar o prédio histórico”, afirmou.

“Não temos que aceitar um projeto que está sendo imposto a todos como um trator”, disse Gabriel Roncon (PTB).

Além disso, a aparição de Maurício Fernandes, antigo dono do terreno junto de três irmãos, deixou a situação tensa. A família herdeira do local realizou a venda do espaço para a Prefeitura em 2008 por R$ 500 mil. Segundo Fernandes, no entanto, há processo no STF (Supremo Tribunal Federal) para que eles recebam o valor de mercado da administração. “O terreno vale hoje R$ 20 milhões. Na época o valor era venal, só recebi essa quantia (R$ 500 mil). Estamos com processo na Justiça para receber o restante. Assim que recebi a notícia da votação, pedi para o meu advogado intervir.”

O intuito era que fosse inclusa uma cláusula em que a administração do local se comprometesse a pagar este valor. “Quando a área foi desapropriada, o intuito era o tombamento do local, e não a construção de um shopping. Eu sou contra”, opinou.

Conforme o presidente da Câmara, José Nelson de Barros (PSD), os vereadores optaram por não votar o projeto para que seja decidida data para uma audiência pública. Somente após isso o texto segue para a Casa. “Vai ser um desgaste para o governo, mas as coisas têm que ser assim.”

O Ministério Público da cidade enviou ofício para a Prefeitura questionando sobre o assunto há cinco dias. No prazo de 15 dias a contar da data do recebimento a administração precisa explicar ao órgão o que vai ser feito no terreno e, caso seja confirmada a intenção de demolir o prédio, o órgão pretende entrar com ação. Procurada, a Prefeitura disse que não recebeu o documento.

Entidades e sociedade civil protestam contra destruição

Além da resistência dos vereadores, a sessão da Câmara de ontem contou com a presença da população e de entidades que se posicionaram contra a demolição da Fábrica de Sal. O prédio, localizado no Centro Alto, foi fundado há 117 anos e abrigou o moinho de trigo mais antigo registrado no Estado.

Para quem já viu os dias áureos do espaço, que foi fundado pela família italiana Maciotta, a possibilidade de demolição é acompanhada de grande sentimento de tristeza. “Conheço esta história desde 1935. Fui criado a 50 metros do local e a minha infância e juventude passei ali. O prédio teve diversos usos. Foi uma fábrica de adubo antes de moer o sal. Lutamos para a preservação desta história”, disse Octavio Davi Filho, 85 anos, integrante da Associação Pró-Memória de Ribeirão Pires.

“Convém lembrar também que, na comercialização do sal, as donas de casa usavam os saquinhos de pano nos quais o produto era embalado para fazer colchas, toalhas e levantar algum trocado”, disse outro integrante da associação, Pedro Cordeiro, 68.

O presidente do conselho da Associação de Moradores da Vila Mara, Jardim São Francisco, Jardim Ribeirão Pires e Adjacentes, Timóteo Viana, disse que a população é contra a demolição. “Gostaríamos de debater com o poder público o que vai ser feito. A comunidade gostaria de ver aquele prédio voltado para a área educacional”, disse.

Militante pela preservação do patrimônio histórico há dez anos, Arnaldo Boaventura Neto afirmou que “a demolição do local é movida por interesses privados.” 




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;