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Desmanches têm nova camuflagem
Luciano Cavenagui
Do Diário do Grande ABC
15/03/2005 | 15:11
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Cuidado! A casa vizinha à sua pode ser um desmanche clandestino sob a fachada de uma residência comum. Seus vizinhos, aparentemente simpáticos e cordiais, podem não passar de criminosos que trabalham o dia inteiro em uma linha de desmontagem veículos roubados para revender as peças.

O estereótipo do desmanche irregular, ou buraco, como é conhecido na gíria policial, está mudando consideravelmente e apresenta uma nova tendência. As quadrilhas trocaram oficinas e galpões por casas localizadas em bairros residenciais de alto padrão.

Em menos de um mês, a Polícia Civil da região descobriu três estabelecimentos irregulares instalados em locais até então fora de suspeita: um numa casa em São Caetano, no bairro Fundação, e outros dois desmanches em casarões na avenida Dom Pedro II, no bairro Campestre, em Santo André. Na última ocorrência, a polícia estima que o local tenha servido para o desmanche clandestino de cerca de 400 carros em apenas seis meses.

Na avaliação de delegados do Grande ABC e um delegado de São Paulo, especializado em desmanches, o novo disfarce dos buracos foi a solução encontrada pelos bandidos para fugir da fiscalização da polícia e de funcionários das prefeituras. Quando a linha de desmontagem está localizada em galpões ou oficinas, os criminosos ficam sob risco de so fiscais investigarem a existência de alvará de funcionamento.

Como característica principal, os desmanches residenciais possuem isolamento acústico completo. O revestimento abafa os ruídos provenientes de ferramentas e maçaricos utilizados para a retirada e adulteração das peças. “Os bandidos estão se aprimorando a cada dia, sempre inventando soluções para não serem pegos. Com o reforço na repressão policial em cima de oficinas e lojas de peças automotivas em todo o Estado, a camuflagem em casas passou a ser adotada. Um desmanche bem preparado em uma residência dificilmente desperta suspeita da vizinhança e da polícia”, afirma o delegado titular da Divecar (Divisão de Investigações sobre Furtos e Roubos de Veículos e Cargas), Carlos Alberto Delair Carvalho, especializado em combater desmanches clandestinos. A delegacia está vinculada ao Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado).

Após alugar ou comprar um imóvel, geralmente usando nomes falsos, a quadrilha procura dificultar quase toda a visibilidade da residência com relação à vizinhança, erguendo muros. Depois, revestem as paredes com isolamento acústico e mantêm as cortinas das janelas sempre fechadas.

Em 2004, a polícia descobriu em São Paulo 79 desmanches. Quarenta pessoas foram presas. No mesmo período, no Grande ABC, foram estourados 18 estabelecimentos clandestinos que reultou em 19 prisões. Os dados são das Delegacias Seccionais da região.

Para manter um contato mínimo com os vizinhos e evitar suspeitas, alguns criminosos dizem que a residência funciona como uma empresa qualquer. No buraco estourado em um casarão no bairro Campestre, na semana passada, os bandidos diziam que no local funcionava uma distribuidora de água. Em outra ocorrência afirmavam se tratar de uma empresa de embalagens plásticas.

“Em nenhum momento imaginei que pudesse haver um desmanche ali. Nunca ouvi nada. No contato que tive com algumas das pessoas que ficavam na casa, elas foram sempre simpáticas e cordiais, além de se vestirem muito bem. Realmente, hoje em dia, o crime pode estar debaixo do nosso nariz”, conta o empresário R.S., 51 anos, que pediu para não ter o nome publicado.

O comerciante Luis Santos, 32 anos, morador da avenida Dom Pedro II, mostra apreensão com relação à nova localização dos desmanches. “Quando a polícia estourou os dois desmanches aqui na avenida, fiquei perplexo. Nunca imaginei que pudessem estar aqui, bem na nossa cara. É uma nova realidade: os bandidos se especializam e a polícia tem de correr atrás”, diz Santos.

“Fiquei surpresa e com medo. O desmanche era a poucos metros de casa. Atividade criminosa acaba atraindo bandidos. Precisamos sempre estar atentos”, afirma a dona de casa Terezinha Moura, 70 anos, que mora no bairro Fundação, em São Caetano.

Para o delegado seccional de Santo André, Luis Alberto de Souza Ferreira, responsável também por Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, denúncias dos vizinhos são essenciais para a descoberta dos buracos em áreas residenciais. “Apesar do trabalho de inteligência policial que realizamos, é muito difícil identificar esse tipo de desmanche sem a colaboração da vizinhança. Todas as denúncias são bem-vindas. Nós checamos todas.”

O delegado seccional de São Bernardo, Marco Antônio de Paula Santos, responsável também por São Caetano, alerta para os sinais de indicação de desmanche: “Movimentação constante de carros, cheiro de tinta e clarões de maçaricos são características suspeitas que os vizinhos podem perceber. Nesses casos, é aconselhável avisar a polícia”, alerta.



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