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Caminho do Sal: A rota da história no Grande ABC
Daniel Tossato
Do Diário OnLine
25/11/2015 | 09:15
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Daniel Tossato/DGABC:


Todos sabem da importância do Grande ABC para o Brasil. Foi nessa região que algumas das primeiras vilas brasileiras começaram a surgir, fundada por colonos portugueses. O avanço dos tropeiros para o interior do Brasil se dava através de rotas idealizadas e traçadas pela população indígena que vivia no local,  já que eram os caminhos mais rápidos e seguros para transpor a Serra do Mar e alcançar o alto dela.
 
A equipe do Diário percorreu uma destas rotas, que ainda persistem às constantes mudanças da paisagem da região e com mais de 300 anos o Caminho do Sal, que interliga São Bernardo, Santo André e Mogi das Cruzes, através de três partes denominadas; Caminho de Zanzalá, com 16 km, Caminho dos Carvoeiros, com 10 km e o Caminho de Bento Ponteiro, com 27,5 km, sendo uma das rotas mais velhas do Brasil.
 
O traçado se inicia em São Bernardo, mais precisamente no km 34 da Estrada Velha, e recebe o nome de Caminho de Zanzalá, que tem os primeiros registros ainda em 1640, quando foi idealizado para o abastecimento de sal, entre alguns povoados que habitavam o alto da serra. Foi a partir das paragens que existiam no caminho que nasceu a cidade de Rio Grande da Serra.
 
Com chão de terra, o traçado revela lindas paisagens, assim como alguns pequenos riachos que o cortam durante todo o trajeto. É possível também observar animais típicos da região e parte da flora da Mata Atlântica que ainda resistem.
 
A parte do trajeto que risca a cidade de São Bernardo é mal identificada e não há nenhuma alusão sobre a história do caminho, o que pode contribuir para que sua história se perca ainda mais.
 
O trecho também é margeado, em grande parte, por tubulações do antigo Oleoduto da Serra, que chega até a empresa Solvay Indupa e, tirando a parte que foi inundada devido à criação da Represa Billings, em 1922, permanece quase inalterado.
 
Uma das histórias mais interessantes sobre a trilha é a de que o próprio rei de Portugal, D. João V, pediu para que se interditasse o Caminho de Zanzalá em 13 de maio de 1722, pois a rota estava sendo utilizada para desviar ouro e pedras preciosas que pertenciam à coroa portuguesa. Este foi um dos motivos que quase levou Zanzalá ao esquecimento.
 
O trecho que pertence ao Caminho de Zanzalá se encerra quando chega à Estrada Velha de Paranapiacaba. A partir dali se inicia o Caminho dos Carvoeiros ou Caminho dos Lenhadores, que recebeu este nome, pois tinha a função de escoar a produção de lenha paras as antigas locomotivas e olarias que existiam na região.
 
Logo no início do caminho pode-se observar a estação ferroviária do Campo Grande, inaugurada em 1889, pela São Paulo Railway. Hoje ela não passa de um esqueleto que resiste ao tempo, carcomida pela história e pela ferrugem, sob a administração da MRS Logística, concessionária da malha ferroviária do sudeste desde 1996.
 
 
 
 Da capela do Bom Jesus da Boa Viagem até a parte baixa de Paranapiacaba


 
O roteiro do Sal conta com ricas surpresas como a Capela do Bom Jesus da Boa Viagem, que ostenta a estátua do Divino Redentor no topo da pequena igreja. Diz a história que a estátua perdeu uma das mãos quando virou alvo de Angelin Arnoni, que disparou contra a imagem entre os anos de 1930 e 1935, após 25 dias ininterruptos de chuva que dificultavam o trabalho dos carvoeiros. Após o tiro, talvez por coincidência, o sol voltou a brilhar alegrando os trabalhadores e até hoje é possível reparar a ausência da mão do Cristo.
 
O Caminho dos Carvoeiros segue mata adentro e se mostra um pouco mais fácil de se caminhar em comparação com o Zanzalá. Na verdade, das três partes que formam o Caminho do Sal, a dos Carvoeiros talvez seja a mais monótona, com pouca mudança de paisagem, porém é possível ver trabalhadores e caminhões que ainda circulam na trilha em busca de lenha e carvão.
 
O prêmio pra quem segue até o fim é alcançar a Vila de Paranapiacaba, porém pela parte baixa. É nela que termina o Caminho dos Carvoeiros e se inicia o Caminho de Bento Ponteiro, que liga Santo André até Mogi das Cruzes, passando pela Vila de Taquarussu e seguindo até Taiaçupeba.
 
O trecho recebe o nome do comerciante que foi um dos primeiros moradores do Alto da Serra, que deu origem à Vila de Paranapiacaba.
 
Bento José Rodrigues da Silva era português e tinha terras em Mogi das Cruzes. Por saber construir pontes e estradas de ferro, recebeu o apelido de Bento Ponteiro.
 
A ligação de Bento Ponteiro com a região é tão grande que seu corpo está enterrado no Cemitério do Bom Jesus de Paranapiacaba, desde 31 de julho de 1911, quando faleceu. O terreno onde fica o cemitério da vila inglesa foi doado pelo próprio Ponteiro.
 
Com 27,5 km de extensão, o trecho de Bento Ponteiro é o maior das três partes que formam o Caminho do Sal. Assim como o Zanzalá oferece ótimas paisagens e por ficar dentro do Parque Estadual da Serra do Mar, abriga grande fatia intacta da Mata Atlântica.
 
É através do Caminho de Bento Ponteiro que se pode chegar à Vila de Taquarussu, que já fica em terras pertencentes a Mogi das Cruzes.
 
O pequeno vilarejo remonta à chegada de imigrantes italianos em meados de 1910. Em seu tempo mais glorioso, chegou a ter 40 casas, um empório e até uma bomba de gasolina. A vila, assim como Paranapiacaba, também coletava lenha para as máquinas da São Paulo Railway.
 
Com o fim dos motores a vapor a vila foi perdendo moradores e hoje, apesar de muito bem conservada, aparenta ter pouquíssimos habitantes. Desdo o início de 2015, o proprietário da Vila de Taquarussu resolveu cercar o vilarejo, impedindo a entrada de quem caminha pela trilha. A rota de Bento Ponteiro segue então, em meio às paisagens bucólicas, até Taiaçupeba, que pertence a Mogi das Cruzes, encerrando um longo trajeto que carrega, além de muita beleza natural, parte da rica história do Grande ABC. 




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