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Estudos da USP mostra que nova casa visa individualismo
Reynaldo Gollo
Do Diário do Grande ABC
07/04/2001 | 16:04
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Nos dias de hoje, as pessoas estão se fechando em seus mundinhos particulares, em um canto de suas casas, em busca da individualidade. Essa linha de comportamento está afetanto até as paredes. Os projetos para construção dos novos lares brasileiros estão se adaptando a essa realidade, segundo estudos do Nomads – denominação dada ao Núcleo de Estudos Sobre Habitação e Modo de Vida, da USP (Universidade de São Paulo).

“As casas e apartamentos estão cada vez mais compartimentados”, afirma o arquiteto Marcelo Tramontano, coordenador do Nomads. Segundo a análise feita em diversos projetos habitacionais em andamento no país nos últimos anos, a tendência é diminuir os cômodos para tê-los em maior quantidade no mesmo espaço. Ou seja: as casas não crescem muito, mas são construídas com mais quartos, salas e banheiros. “As famílias estão se encontrando cada vez menos dentro das casas”, continua o arquiteto. “Cada um tem o seu módulo, com banheiro, televisão. “A sala de jantar, por exemplo, como centro de interação e reunião, se esvaziou.”

Os espaços de convívio comum nas casas – salas de estar e de jantar – estão, cada vez mais, tendo o papel de local para recepção de estranhos à família: as visitas. “Os adolescentes estão se acostumando a comer em seus quartos e a se entreter sozinhos, com videogames e TV. Analisando os números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), notamos que nas casas da classe média há quase tantos aparelhos de televisão quanto quartos.”

Nas milhares de plantas de casas e apartamentos analisadas pelo Nomads, a constatação de que “cada compartimento passa a ser um cubículo”, nas palavras de Tramontano. E... “Quanto menor o espaço, maior a tendência de a pessoa se tornar ansiosa”, analisa o psiquiatra José Ângelo Gaiarsa. “Ansiedade é, basicamente, falta de espaço. É quando você quer soltar seus bichos e não tem espaço. Tem de segurá-los. Mas não podemos só ver o lado catastrófico disso (leia reportagem nesta página).”

Outra tendência negativa observada pelos estudiosos da USP é a dos condomínios, nos quais as pessoas se fecham em tribos onde todos se igualam em níveis socioeconômicos, sem muito contato com as realidades individuais do mundo externo, as diferenças sociais das ruas. “Todos se nivelam e se perde um pouco os limites de tolerância com as pessoas de fora”, diz Tramontano. Segundo um estudo de dois anos do Nomads, a chegada à idade adulta de uma primeira geração de pessoas nascidas ou criadas em condomínio mostra a cara de uma elite criada dentro de uma redoma que, em muitos casos, não sabe mesurar valores morais. “Estamos horrorizados”, é um termo usado por Tramontano para descrever parte desse grupo social. Para ele, o contato com outras realidades, outras pessoas, como nas vendinhas, nas bancas de jornais, nas esquinas, é exatamente o que as cidades têm de mais rico.

A solução desses problemas passa por uma nova visão do mercado, de pensar mais nas necessidades das pessoas. O Nomads está fazendo um experimento em São Carlos (interior do Estado), onde construíram uma casa na qual se entra pelos cômodos individuais e, deles, se chega aos ambientes comuns a toda família, o contrário dos núcleos habitacionais de hoje. “É preciso recuperar espaços como a sala de estar, onde as pessoas possam se encontrar dentro do lar”, diz Tramontano.




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