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Especialista descarta convulsão de Ronaldo
Edélcio Cândido
Do Diário do Grande ABC
19/01/2002 | 20:52
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  A pouco mais de 100 dias para a abertura da Copa do Mundo de 2002, a desconfiança permanece, o silêncio inquieta e as controvérsias aguçam o episódio Ronaldinho, que sofreu uma indisposição momentos antes da final do Mundial da França em 1998. Mas o que estaria por trás de tanto mistério envolvendo o atleta? Nike? Zagallo? O médico Lídio Toledo? Por que Ronaldinho passou mal, desmaiou, foi ao hospital, chegou ao estádio 50 minutos antes do jogo e entrou sonolento em campo? A nova versão do jornal Lance trouxe o caso à tona como fim da agonia. Segundo o jornalista Jorge Kajuru, Ronaldinho teve convulsão, após a aplicação de uma injeção de xilocaína com antiinflamatórios, na oitava infiltração em 32 dias.

Para o especialista em medicina esportiva e ortopedista, presidente do Celafiscs, consultor da OMS (Organização Mundial de Saúde) e coordenador do Agita São Paulo, Victor Matsudo, 52 anos, 28 de profissão, de São Caetano, Ronaldinho teve hipoteticamente uma neurose de conversão, jamais uma convulsão.

Matsudo já foi palestrante em várias Olimpíadas e nunca viu nada parecido. “Em 28 anos de profissão, seis Olimpíadas, nunca ouvi dizer que alguém entrou em convulsão por causa da xilocaína. Caso ingerida, causa sono e visão turva. Portanto, sequer conseguiria andar em campo. Provavelmente, teve um estresse, hiperventilação, hiperbatimento cardíaco e entrou em pane. Mas nunca teria convulsão”, disse o médico.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista que o médico concedeu ao Diário.

DIÁRIO – O senhor crê que Ronaldinho sofreu convulsão por causa da xilocaína antes da final da decisão contra a França na Copa do Mundo de 1998?
VICTOR MATSUDO – Não creio absolutamente. Nos meus 28 anos de profissão nunca soube de um só caso de que a xilocaína levasse alguém ao estado de convulsão. Mas se o médico aplicou xilocaína e antiinflamatório numa infiltração horas antes do jogo, ele errou. São componentes que normalmente provocam sonolência, atordoamento, ofuscação visual, certa indisposição geral, e, sedado, Ronaldinho jamais poderia jogar, porque poderia cair no exame antidoping.

DIÁRIO – E o que aconteceu na verdade?
MATSUDO – Entre quatro paredes, se você não estiver dentro, tudo é hipótese. Mas em minhas participações em congressos e seminários, inclusive, estive em um recentemente na Inglaterra, ouvi muitas histórias. Mas tenho a minha tese: Ronaldinho teve uma neurose de conversão, muito próxima de uma forte perturbação mental, nunca uma convulsão. Mais ou menos um lampejo de síndrome do medo. Mas houve, sim, uma intensa sobrecarga de estresse pela pressão de problemas particulares com a sua namorada na época, seu patrocínio (Nike), a comissão técnica, a torcida, a TV, e a carga natural de um jogo final que poderia ser a sua suprema consagração ou o caminho da guilhotina. Aí sucumbiu. Pode ter ocorrido hiperventilação interna e conseqüente carência de oxigenação no cérebro, o que traz prejuízos ao organismo a ponto de ter suor em excesso, corpo mole, uma sensação horrível.

DIÁRIO – O senhor admite que Ronaldinho amarelou?
MATSUDO – Prefiro não ver o caso por esse ângulo. É um grande jogador e merece respeito. Por ser jovem e, pela responsabilidade, não era fácil a sua posição ali. Era quase um menino. Se você voltar atrás, vai perceber que, segundo o seu companheiro de quarto, Roberto Carlos, Ronaldinho vivia ultimamente fadigado, inquieto, demorava para dormir. São indícios de que andava perturbado emocionalmente, além de ter o problema de sua contusão. Mas temos que encerrar esse caso. Torço para que volte a ser o craque de antes. Quem não torce por ele?

DIÁRIO – O que pensa sobre a delicada contusão que Gustavo Kuerten tem na região da virilha, que vai do púbis até o quadril?
MATSUDO – Ainda é um pouco cedo para uma avaliação mais exata, mas me parece que o Guga sentiu na pele o excesso de jogos. Ninguém é de ferro. No tênis, você abre demais o compasso (as pernas) nas jogadas e pode haver ruptura muscular, afetar as fibras que ficam na região da virilha. Ele deve ter virado muito forte um dos joelhos e teve o problema. Se for inflamação crônica, envolvendo as fibras vitais, o melhor é a cirurgia. Por ser meio delicada, creio que Guga pode ficar até seis meses inativo e não apenas quatro como dizem. Se não me engano, o caso já vem deste o ano passado no Torneio de Indian Wells, nos Estados Unidos. Chega num momento que só o tratamento médico e a fisioterapia não resolvem mais.

DIÁRIO – Sabemos que o senhor é crítico contumaz aos casos de doping nos atletas, principalmente em tempos de Olimpíada. É verdade?
MATSUDO – Realmente sou crítico. O atleta que se dopa está se autodestruindo e prejudicando a imagem do seu patrocinador. Por isso, muitas multinacionais têm medo de investir alto num atleta olímpico e depois o tiro sair pela culatra. Uma empresa como a Kodak, por exemplo, jamais sairia apostando neste ou em outro nome porque teme uma reviravolta. Um atleta pego no doping deveria ser excluído de competições oficiais. Eles têm que ser exemplos e não macular a sua própria imagem e a do patrocinador também. Hoje, tem empresário que aposta mais em eventos culturais, que é mais seguro, do que no esporte.

DIÁRIO – O senhor vê possibilidade de um basta no doping?
MATSUDO – Não. É a lei do gato querendo pegar o rato. O Comitê Olímpico Internacional combate ferozmente o doping, mas sempre aparece uma novidade. Mas a esperança é de que algum dia alguém vá encurralar o rato. E aí não haverá saída.

DIÁRIO – A medicina esportiva tem evoluído no Brasil?
MATSUDO – Bastante. Está aí o Celafiscs. Diria que avançamos em todos os sentidos. Desde 1997, na criação do Agita São Paulo, muito se fez pelo esporte amador. Já temos a Venezuela em Movimento, a Mova-se Argentina e vem aí o Agita Mundo com respaldo da Organização Mundial da Saúde (OMS). Como representante do Brasil, tenho participado de seminários pelo mundo. Estive em dezembro no Canadá, e estou indo para Miami e Pequim. Hoje já temos o dia 7 de abril escolhido como o Dia Internacional da Saúde. Mais importante é que somos muito bem recebidos em todos os lugares do planeta pelo trabalho que um dia iniciamos no Celafiscs (Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano). A bandeira é a mesma: a atividade física une os povos.




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