Cultura & Lazer Titulo Teatro
O amor nos tempos da individualidade
Thiago Mariano
Do Diário do Grande ABC
24/01/2013 | 07:00
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Divulgação


Em cena, Córtex é uma história linear, cumprida pela cabeça de uma pessoa: um homem transformado pelo sumiço da mulher. As significâncias dela são outras, cumprem expediente diverso para além da representação da narrativa, vista unicamente sob o ponto de vista desse personagem que recria o que viveu. "Existe uma história linear, a viagem emocional é outra, faz um quebra-cabeça na mente do espectador", conta o ator Otávio Martins, que apresenta o monólogo no fim de semana no Sesc Santo André.

O projeto surgiu enquanto o ator procurava um texto solo em que pudesse falar sobre as tragédias cotidianas. Uma obra que eliminasse o caráter universal das tragédias gregas e retratasse, nesses tempos em que a individualidade impera, algo que acontece no íntimo de cada um. "Pouca gente fala do que é uma tragédia de uma pessoa incapaz de ser o que era antes."

Ao lado do amigo dramaturgo Franz Keppler, e do diretor Nelson Baskerville, foi costurando o enredo a seis mãos, com ajuda de todos os técnicos presentes nos ensaios.

Enquanto conta a sua história depois de prestar depoimento na delegacia, o homem cai em algumas contradições que parecem revelar que ele mesmo teve parte no desaparecimento da mulher. A seu favor, somente o amor e a dor angustiante da perda. Somente o fim do monólogo traz resposta para todas as dúvidas.

"Há uma ânsia que o move: a de mostrar que jamais seria capaz de matar a mulher. Esse homem tem um sentimento tão absolutamente forte por ela, que o que ele fala sobre amor e finitude é de uma entrega absurda", diz Martins, que acredita ser importante representar esse amor de doação pelo outro por conta do tempo em que vivemos, em que todas as nossas ações são muito mais pautadas pelo nosso próprio umbigo.

"Estamos cada vez mais voltados àquilo que acreditamos que é bom. Está colocado para todas as pessoas que existe a obrigação de ser feliz. E viver não é estar em estado de felicidade eterna, viver é mais complexo e rico do que isso. Acaba que o conceito de felicidade passa a se transformar no que você pode comprar em 12 vezes no cartão."

Para ele, falar sobre sentimento neste nível choca porque promove o reencontro com o sentido de humanidade, revisa um olhar orgânico para a participação do outro na nossa vida e para as coisas que nos acometem.

"Talvez isso só aconteça porque estamos hoje muito disponíveis. Há 100 anos, por exemplo, não existia comida a qualquer hora. Se a pessoa quisesse um bolo de cenoura, tinha que plantar. O que acho que Córtex faz de importante é lembrar que não existe só o individual."

Córtex - Teatro. Sábado, às 20h; e dom., às 19h. No Sesc Santo André - Rua Tamarutaca, 302. Tel.: 4469-1200. Ingr.: R$ 5 a R$ 20.




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