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Vingança causa seqüência de mortes
Luciano Cavenagui
Do Diário do Grande ABC
27/09/2006 | 22:32
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Uma autêntica guerra motivada por vingança causou a morte de duas pessoas e feriu outros dois homens em apenas quatro dias na favela do Jardim Oratório, em Mauá. A Polícia Civil do município já identificou cinco participantes do caso, só que não pode prendê-los por causa do Código Eleitoral de 1965, que proíbe a realização de prisões cinco dias antes e dois dias depois da eleição.

Até terça-feira, os indiciados pelos assassinatos podem circular livremente pelas ruas e vielas do Jardim Oratório.

Os crimes no bairro ocorreram na semana passada, entre quarta-feira e o último sábado. Analisados isoladamente, pareciam casos típicos que surgem em favelas quase todos os dias. Entretanto, após investigação, policiais do 1º DP de Mauá descobriram que os crimes tinham ligação entre si e foram deflagrados por sede de vingança. O que mais chamou a atenção foi a rapidez com que foram cometidos, praticamente um dia após o outro.

Os envolvidos foram um pequeno traficante de uma biqueira (ponto de tráfico de drogas), nóias (usuários de entorpecentes) e alguns parentes dos executados.

Tudo começou na madrugada da quarta-feira da semana passada, quando José Dejaílson da Silva, 17 anos, o Doido, e Paulo César da Silva, 18, o PC, foram roubar uma doceria dentro da favela, localizada na avenida Ayrton Senna da Silva.

Passavam poucos minutos da meia-noite quando a dupla, armada, intimidou o proprietário V.R.L., 31 anos. Doido e PC queriam roubar seu celular e R$ 500 que havia no caixa. O dono pensou que o assalto fosse uma brincadeira, mas tomou consciência do que estava ocorrendo ao levar um tiro na virilha da perna esquerda. Após o disparo, a dupla fugiu com o celular e o dinheiro.

Um traficante modesto da favela, Alcione Benício de Oliveira, 32 anos, que exercia certa influência na área que abrangia a doceria, ficou sabendo do que ocorreu e deu uma verdadeira bronca em Doido e PC. Oliveira disse para a dupla não incomodar os comerciantes locais e que o roubo também acabaria trazendo a polícia na área, dificultando seus negócios.

Inconformados com o puxão de orelha, Doido e PC resolveram se vingar no dia seguinte. Às 4h da madrugada, encurralaram Oliveira em um beco na rua Santo Expedito e deram diversos tiros em sua cabeça, sem nenhuma chance de defesa.

O irmão de Oliveira, o motoboy Daniel Benício de Oliveira, 24 anos, ficou sabendo do assassinato poucos minutos depois e já começou a arquitetar o plano para compensar a morte do irmão.

Segundo a polícia, chamou para a vingança três amigos comparsas, entre eles Luciano Evangelista Rodrigues, 22 anos. O motoboy pretendia matar Doido e PC antes de se completarem 24 horas do homicídio do irmão.

Conforme o previsto, à meia-noite do último sábado o quarteto encontrou a dupla na rua 16, conversando no meio da rua. O grupo ocupava duas motos e tinha dois revólveres calibre 38. Sem possibilidade de fuga, Doido e PC foram alvos de vários tiros. Doido tomou 10 tiros e morreu no local. PC, por sua vez, apesar de levar quatro tiros na região do peito, conseguiu sobreviver. Está internado no Hospital Nardini sem risco de morte.

Segundo a polícia, ele relatou toda a história da rede de vinganças que resultou em dois mortos e dois feridos. “Histórias de execuções por vingança são comuns em muitos lugares. Nesse caso, o inusitado foi a velocidade com que os casos aconteceram”, afirmou o delegado-titular do 1º DP de Mauá, José Rosa Incerpi.

“Infelizmente, estamos atados por essa lei eleitoral. Vou solicitar a prisão temporária dos cinco envolvidos, mas só podemos prendê-los na terça-feira”, disse o delegado. Provavelmente, todos deverão fugir com o término do benefício.

Durante esse período, só pode haver prisão em caso de flagrante, de desrespeito a salvo-conduto (quando um policial prende indevidamente alguém em época eleitoral) e de sentença criminal condenatória por crime inafiançável. A criação dessa lei teve o objetivo de impedir que a polícia efetuasse prisões com fins eleitoreiros.

Violência – Para o sociólogo Eduardo Biavatti, especialista em violência urbana, dois fatores principais contribuem para que crimes do tipo ocorram em favelas como o Jardim Oratório: facilidade de aquisição de armas e condição socioeconônica degradável. “Os envolvidos, com uma arma na mão e com a idéia de que não têm nada a perder, passam a se vingar matando os outros”, afirmou o sociólogo.




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