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Uma vida dedicada à saúde pública

Aos 86 anos, pediatra Luiz Alberto da Silva é o servidor mais antigo na ativa em Santo André

Thainá Lana
07/04/2024 | 07:00
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Alex Cavanha/PMSA


De bengala e jaleco, o pediatra Luiz Alberto da Silva, 86 anos, reencontrou o CHM (Centro Hospitalar Municipal) Dr. Newton da Costa Brandão, de Santo André, no último dia 27 de março e despertou memórias afetivas do tempo que atuou na unidade hospitalar, em 2005, como diretor-geral. Com passos lentos e olhares curiosos, o médico se deparou com muitas novidades no equipamento, que passou no ano passado pela maior obra de revitalização em 110 anos de existência. 

A presença no hospital foi apenas uma das centenas de lembranças que o pediatra faz questão de contar sobre a sua trajetória profissional na saúde pública do município. Natural de São Sepé, município do Rio Grande do Sul, Silva se mudou para Santo André em 1969 para trabalhar na Faisa (Fundação de Assistência à Infância de Santo André), onde atuou por quatro décadas.

Com 55 anos de experiência, Luiz Alberto da Silva é o servidor mais antigo em atividade no município andreense – atualmente trabalha no setor de regulação da secretaria de Saúde, apesar de estar aposentado desde 2004. Com passagens por diversos equipamentos públicos, como o Centro de Saúde Escola Capuava, dedicou a vida ao cuidado de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social, em especial de crianças, em uma época que ainda não existia o SUS (Sistema Único de Saúde) e o acesso à saúde era restrito. 

Sua relação com a saúde pública começou ainda na época da faculdade, na década de 1960, quando cursava medicina na UFSM (Universidade Federal de Santa Maria). Silva conta que optou por pediatria por influência do docente Miguel Meirelles, que lecionava a especialidade na instituição gaúcha. 

“Para buscar mais conhecimento na residência, comecei a acompanhar o professor em tudo. Naquele tempo, os atendimentos eram divididos em primeira, segunda e terceira classe, onde ficavam as crianças pobres, subnutridas e vindas da periferia. Era exatamente nessa ala que ele demorava e se dedicava mais, às pessoas que mais precisavam. Aprendi com o exemplo e não com a teoria”, relembra. 

O pediatra, que lecionou por 40 anos na FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) e ajudou a criar o Crami (Centro Regional de Atenção aos Maus-tratos da Infância) em Santo André, antes da implantação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), criado dois anos depois, em 1990.

SAÚDE PÚBLICA 

Silva participou da implementação e desenvolvimento do SUS na cidade, em 1988. Ao sistema, que é um dos maiores e mais completos do mundo e garante acesso integral, universal e gratuito a toda população do País, ele atribui algumas críticas. 

“O SUS foi e ainda é um avanço quanto a sua concepção e assistência à população, mas essa ideia de que a medicina é uma só não funciona na prática. Porque assim como na década de 1960, quem é rico consegue ter acesso a exames e especialistas de maneira mais rápida, enquanto quem não tem dinheiro precisa aguardar por meses para fazer um simples exame de rotina. O problema não é o sistema, mas sim a falta de recursos, que sempre estará aquém das necessidades”, pontua o médico.

A descentralização da governabilidade da assistência de saúde é outro ponto importante defendido pelo médico. “A gestão saiu do governo federal e passou para os municípios, que realmente sabem e conhecem as necessidades da sua população, e assim pode destinar melhor os recursos para atender da melhor forma possível os pacientes”, explica ele. 

O pediatra é defensor da medicina preventiva, e acredita que essa especialidade é essencial não apenas para a sociedade, como método para evitar o desenvolvimento de doenças e redução do impacto das enfermidades, mas também para o melhor aproveitamento dos recursos públicos. 

“Não tem segredo, o poder público deve investir na atenção básica porque é o serviço mais barato da rede. A atenção primária bem estruturada vai exigir menos dos outros níveis de saúde, de média e alta complexidade, que demandam mais profissionais, equipamentos, medicamentos e estruturas”, afirma Silva. 

LONGEVIDADE

Mesmo aposentado, o médico Luiz Alberto da Silva faz questão de continuar trabalhando na área que dedicou mais da metade da vida. No setor de regulação da rede estadual de saúde, ele é um dos responsáveis por classificar as solicitações de exames, por ordem de prioridade e de risco, para que o usuário tenha o menor risco de ficar desassistido. 

Quando não está no trabalho, o médico cultiva alguns passatempos que o ajudam a manter a saúde e o bom humor. Caminhada em shoppings e aulas de geografia são algumas das suas atividades preferidas. “Gosto de caminhar no shopping por causa da segurança do espaço e também porque é tudo plano, então diminui os riscos de queda. Em relação às aulas, foi algo engraçado. Decidi que queria estudar geografia, comecei de maneira on-line, mas não me adaptei. Então, a professora vem em casa e aproveito para conversar e ter uma companhia”, diz o idoso que mora sozinho na região central do município.

Pai de duas filhas, Hanuska Bertonha da Silva, 51, e Natacha Bergonha da Silva, 50, o médico perdeu sua companheira, Soila Helena Bertonha da Silva, em dezembro do ano passado, após 55 anos de casamento. 

“Ela estava só esperando comemorar os 80 anos para ir descansar, era uma pessoa especial, fantástica e muito sincera. Há 20 anos teve câncer de mama, que foi rescindido, mas infelizmente retornou e atingiu as metástases ósseas. Sinto a falta dela”, finaliza, emocionado, o servidor, que pretende continuar trabalhando até os últimos dias da vida. 




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