Em julho do ano passado, quando o magistrado já estava sob investigaçao da Procuradoria da República e tornara-se réu por improbidade administrativa em açao civil na Justiça Federal, a cúpula do TRT decidiu homenageá-lo por sua "obra grandiosa". Nicolau foi aclamado como o "símbolo da edificaçao".
Apontado como o todo-poderoso do tribunal, Nicolau presidiu a Comissao de Obras do Fórum durante seis anos, entre 1992 e 1998. Nesse período, qualquer medida relativa ao prédio tinha que passar pelas maos do magistrado, inclusive decisoes sobre liberaçao de recursos em favor da Incal Incorporaçoes, a empreiteira contratada por ele para construir o Fórum, projetado para abrigar 79 Juntas de Conciliaçao e Julgamento.
Sob as ordens de Nicolau, foram depositados R$ 179 milhoes na conta da construtora - ou R$ 263,9 milhoes em valores atualizados. Pelo menos R$ 49 milhoes desse volume total foram remetidos pela Incal para o paraíso fiscal do Panamá, segundo auditoria promovida pela Receita Federal. A Procuradoria da República suspeita que Nicolau tenha enriquecido com boa parte da verba paga à empreiteira - há indícios de que ele adquiriu imóveis de alto padrao, em Miami e no Guarujá, e carros luxuosos.
O tributo a Nicolau foi prestado por unanimidade pelos 25 juízes do Orgao Especial - 19 juízes togados e 6 classistas - do TRT, na Sessao Administrativa Ordinária realizada em 14 de julho. No dia seguinte, Nicolau completou 70 anos de idade, forçando sua aposentadoria compulsória. Compareceram à sessao, entre outros, o entao presidente do tribunal, Délvio Buffulin (também acusado de improbidade na mesma açao aberta contra Nicolau), e o atual, Floriano Vaz da Silva, que exercia a vice-presidência.
Em meio às discussoes rotineiras que marcam essas reunioes, o juiz Gilberto Alain Baldacci - classista indicado pela indústria da construçao civil - pediu a palavra e, emocionado, discursou sobre a "obra grandiosa" de Nicolau. Em seguida, sugeriu: "Mais do que um simples parabéns, eu proponho que nós denominemos as novas Juntas como 'Fórum Juiz Nicolau dos Santo Neto".
Pela ordem, Nicolau manifestou-se: "Fui prestigiadíssimo como jamais pudesse imaginar...soubesse eu falar todas as línguas dos humanos, dos anjos e dos animais, tivesse eu todo o dinheiro do mundo de todas as nacionalidades, possuísse o poder de resolver todos os bens e os males terráqueos e extraterráqueos, jamais eu receberia uma homenagem como a que recebi neste momento". Todos os juízes saudaram Nicolau com aplausos e elogios.
O ex-presidente do tribunal, José Victório Moro (1992-94 sucessor de Nicolau), fez questao de dizer: "Um dos sobrenomes do Nicolau poderia ser a gratidao, foi com o apoio dele que me elegi presidente". Outro ex-presidente, Rubens Tavares Aidar (1994-96, sucessor de Moro), ressaltou a "amizade e fraternidade" entre ambos e afirmou que o prédio é "uma obra exclusiva do juiz Nicolau". O juiz Jerônimo Augusto Gomes Alves - classista pelo Sindicato dos Hotéis e presidente da Associaçao dos Juízes Classistas - lembrou "ser o juiz Nicolau grande amigo da representaçao classista, que sempre apoiou e sempre deu o ombro e o carinho..."
A Ata número 17/98, com a decisao sobre o "Fórum Juiz Nicolau", foi publicada no Diário Oficial em 22 de julho. Menos de dois meses depois da homenagem, Nicolau foi destituído da presidência da Comissao de Obras. A medida foi adotada em 15 de setembro pelo juiz Floriano Vaz da Silva que assumiu, naquele dia, a presidência do TRT. Na última sexta-feira, quando aguardava a chegada dos senadores da CPI do Judiciário para inspecionar o Fórum Trabalhista, Vaz da Silva declarou que "há fortes indícios de fatos gravíssimos", referindo-se às denúncias contra Nicolau.
Para conclusao do Fórum ainda serao necessários mais R$ 30 milhoes, segundo cálculos do diretor-administrativo do TRT, César Gilii. A obra está abandonada desde outubro, quando a Incal interrompeu os trabalhos. Levantamento realizado por determinaçao do presidente Vaz da Silva indica que apenas 60% do cronograma físico da obra foi cumprido. A auditoria mostra que a Comissao de Obras, sob a direçao de Nicolau, ignorou "graves irregularidades" na construçao. A empreiteira nao instalou dependências previstas no contrato - por exemplo: deveriam ter sido construídos 16 banheiros por andar; mas existem apenas oito.
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