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Fórum terá nome de juiz alvo da CPI do Judiciário
Do Diário do Grande ABC
25/04/1999 | 20:26
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A futura sede da Justiça Trabalhista de Sao Paulo será chamada oficialmente de Fórum Juiz Nicolau dos Santos Neto. Alvo número um da Comissao Parlamentar de Inquérito (CPI) do Poder Judiciário, Nicolau - ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho, entre 1990 e 1992 - está sob suspeita de enriquecimento ilícito, atos lesivos ao Tesouro e desvio de verbas destinadas à construçao do Fórum que levará o seu nome.

Em julho do ano passado, quando o magistrado já estava sob investigaçao da Procuradoria da República e tornara-se réu por improbidade administrativa em açao civil na Justiça Federal, a cúpula do TRT decidiu homenageá-lo por sua "obra grandiosa". Nicolau foi aclamado como o "símbolo da edificaçao".

Apontado como o todo-poderoso do tribunal, Nicolau presidiu a Comissao de Obras do Fórum durante seis anos, entre 1992 e 1998. Nesse período, qualquer medida relativa ao prédio tinha que passar pelas maos do magistrado, inclusive decisoes sobre liberaçao de recursos em favor da Incal Incorporaçoes, a empreiteira contratada por ele para construir o Fórum, projetado para abrigar 79 Juntas de Conciliaçao e Julgamento.

Sob as ordens de Nicolau, foram depositados R$ 179 milhoes na conta da construtora - ou R$ 263,9 milhoes em valores atualizados. Pelo menos R$ 49 milhoes desse volume total foram remetidos pela Incal para o paraíso fiscal do Panamá, segundo auditoria promovida pela Receita Federal. A Procuradoria da República suspeita que Nicolau tenha enriquecido com boa parte da verba paga à empreiteira - há indícios de que ele adquiriu imóveis de alto padrao, em Miami e no Guarujá, e carros luxuosos.

O tributo a Nicolau foi prestado por unanimidade pelos 25 juízes do Orgao Especial - 19 juízes togados e 6 classistas - do TRT, na Sessao Administrativa Ordinária realizada em 14 de julho. No dia seguinte, Nicolau completou 70 anos de idade, forçando sua aposentadoria compulsória. Compareceram à sessao, entre outros, o entao presidente do tribunal, Délvio Buffulin (também acusado de improbidade na mesma açao aberta contra Nicolau), e o atual, Floriano Vaz da Silva, que exercia a vice-presidência.

Em meio às discussoes rotineiras que marcam essas reunioes, o juiz Gilberto Alain Baldacci - classista indicado pela indústria da construçao civil - pediu a palavra e, emocionado, discursou sobre a "obra grandiosa" de Nicolau. Em seguida, sugeriu: "Mais do que um simples parabéns, eu proponho que nós denominemos as novas Juntas como 'Fórum Juiz Nicolau dos Santo Neto".

Pela ordem, Nicolau manifestou-se: "Fui prestigiadíssimo como jamais pudesse imaginar...soubesse eu falar todas as línguas dos humanos, dos anjos e dos animais, tivesse eu todo o dinheiro do mundo de todas as nacionalidades, possuísse o poder de resolver todos os bens e os males terráqueos e extraterráqueos, jamais eu receberia uma homenagem como a que recebi neste momento". Todos os juízes saudaram Nicolau com aplausos e elogios.

O ex-presidente do tribunal, José Victório Moro (1992-94 sucessor de Nicolau), fez questao de dizer: "Um dos sobrenomes do Nicolau poderia ser a gratidao, foi com o apoio dele que me elegi presidente". Outro ex-presidente, Rubens Tavares Aidar (1994-96, sucessor de Moro), ressaltou a "amizade e fraternidade" entre ambos e afirmou que o prédio é "uma obra exclusiva do juiz Nicolau". O juiz Jerônimo Augusto Gomes Alves - classista pelo Sindicato dos Hotéis e presidente da Associaçao dos Juízes Classistas - lembrou "ser o juiz Nicolau grande amigo da representaçao classista, que sempre apoiou e sempre deu o ombro e o carinho..."

A Ata número 17/98, com a decisao sobre o "Fórum Juiz Nicolau", foi publicada no Diário Oficial em 22 de julho. Menos de dois meses depois da homenagem, Nicolau foi destituído da presidência da Comissao de Obras. A medida foi adotada em 15 de setembro pelo juiz Floriano Vaz da Silva que assumiu, naquele dia, a presidência do TRT. Na última sexta-feira, quando aguardava a chegada dos senadores da CPI do Judiciário para inspecionar o Fórum Trabalhista, Vaz da Silva declarou que "há fortes indícios de fatos gravíssimos", referindo-se às denúncias contra Nicolau.

Para conclusao do Fórum ainda serao necessários mais R$ 30 milhoes, segundo cálculos do diretor-administrativo do TRT, César Gilii. A obra está abandonada desde outubro, quando a Incal interrompeu os trabalhos. Levantamento realizado por determinaçao do presidente Vaz da Silva indica que apenas 60% do cronograma físico da obra foi cumprido. A auditoria mostra que a Comissao de Obras, sob a direçao de Nicolau, ignorou "graves irregularidades" na construçao. A empreiteira nao instalou dependências previstas no contrato - por exemplo: deveriam ter sido construídos 16 banheiros por andar; mas existem apenas oito.




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