Cultura & Lazer Titulo
Novo livro de Isabel Allende une sexo e comida
Mônica Santos
Da Redaçao  
09/01/1999 | 16:07
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"Os cinqüenta anos sao como a última hora da tarde, quando o sol já se pôs e tendemos naturalmente à reflexao. No meu caso, porém, o crepúsculo me induz a pecar e, talvez por isso, no meu cinqüentenário reflito sobre minha relaçao com a comida e o erotismo, as fraquezas da carne que mais me tentam, embora hélas, nao tenham sido as que mais pratiquei".  Com as palavras acima, a escritora chilena Isabel Allende (sobrinha de Salvador Allende, ex-presidente socialista do Chile), consagrada mundialmente com o romance A casa dos espíritos, inicia seu mais recente livro, que acaba de chegar no Brasil pela editora Bertrand Brasil: Afrodite - contos, receitas e outros afrodisíacos (328 páginas, R$ 42).  O projeto do livro nasceu depois de uma reclusao de três anos da escritora tentando superar a tristeza pela morte de sua filha Paula, que deu nome a seu último romance publicado no Brasil. A autora relata o fato que a motivou: "Foi entao que, numa noite de janeiro de 1996, sonhei que me jogava numa piscina cheia de arroz-doce... Eu mergulhava e esse creme maravilhoso acariciava minha pele, escorregava entre minhas dobras e enchia a minha boca... Na semana seguinte, sonhei que colocava Antonio Banderas desnudo em cima de uma tortilla mexicana... Minha mae me aconselhou a procurar um psiquiatra ou um cozinheiro, mas decidi enfrentar o problema com a única soluçao que conheço para minhas obsessoes: a escrita".  O resultado é uma obra que mescla gastronomia e erotismo e mostra que, para a autora, o sabor e o paladar da comida associam-se à sexualidade: um jantar apetitoso começa com uma sopa suave, passa pela entrada, culmina com o prato principal e termina com a sobremesa. "Esse processo é comparável ao de fazer amor com estilo: começando com insinuaçoes, saboreando os jogos eróticos, chegando ao clímax com o estrondo habitual e, por fim, deslizando em um afável e merecido repouso", explica.  Para chegar ao livro, Isabel pesquisou em várias partes do mundo, inclusive no Brasil, onde esteve em dezembro de 1996. "Em pleno Amazonas, no coraçao da América do Sul, o macaco é um prato muito apreciado. Pude vê-lo espetado da boca ao rabo em um pau, assando em uma fogueira até ficar torrado, mas ainda assim conservava sua forma de criança. Conforme a estaçao, a textura é dura ou macia, mas o sabor é sempre forte e adocicado", descreve.  Porém, nas receitas de Afrodite nao se fazem necessários macacos, jacarés e nem as piranhas - todas iguarias que Isabel nao deixou de provar no Brasil. A autora preferiu dedicar-se aos afrodisíacos simples, cujos ingredientes podem ser encontrados no mercado da esquina. "Nao apresentamos poçoes sobrenaturais, porque este é um livro prático e sabemos como é difícil conseguir patas de coala, olhos de salamandra e urina de virgem, três espécies em extinçao."  Isabel contou, ainda, com dois importantes colaboradores: o amigo Robert Shekter, que apesar de receber apenas o crédito de ilustrador, fez muitas vezes o papel de ouvinte de Isabel, pesquisou com amigos e, ainda, fez questao de provar todas as receitas, preparadas por Panchita Llona, mae da escritora e responsável pelo cardápio afrodisíaco de Afrodite.  Histórias picantes - Nao sao, no entanto, as saborosas receitas os principais atrativos do livro. Com fatos históricos, a romancista constrói vários contos, recheados de citaçoes poéticas, que seduzem rapidamente o leitor. Em A orgia, por exemplo, ela retrata a abundante vida da duquesa Maria Luisa Isabel du Berry, que viveu na França no século XVIII e, mesmo morrendo aos 24 anos, foi considerada a mulher mais depravada de seu tempo, por transformar todos os seus acontecimentos sociais em orgias.   Em outro capítulo, O harém, Isabel mostra de que forma viviam as mulheres onde a comida era a atividade mais importante do harém. "Além do célebre banho turco, havia 20 cozinhas e 150 cozinheiros encarregados da produçao de uma rede ininterrupta de pratos de carne e vegetais, que circulavam em bandejas de prata e bronze, café turco, doces e bolos de todo tipo... A berinjela era considerada o melhor afrodisíaco - o sultao comia diariamente uma porçao - e ainda hoje, na Turquia, as boas esposas se vangloriam de dominar pelo menos 50 receitas com o vegetal", descreve.   A maior parte das histórias é seguida de receitas nem sempre praticáveis. Porém, sao delas o maior mérito do livro, que mostra porque comida e sexo se unem nas mais diferentes culturas através dos tempos.



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