A aproximação aconteceu aos poucos, à medida que o processo de composição avançava - primeiro a maquiagem, destacando os olhos ligeiramente rasgados; depois os cabelos, praticamente escondidos para finalmente receber o famoso chapéu de frutas estilizadas. Bastaram poucas horas trabalhando com o visagista Anderson Bueno para que a atriz Laila Garin finalmente ganhasse o perfil de Carmen Miranda (1909-1955) para protagonizar o musical Carmen, a Grande Pequena Notável, que estreia dia 26 de janeiro no Teatro do Sesi, em São Paulo.
Com direção de Kleber Montanheiro, trata-se de uma nova versão do espetáculo que estreou em 2018, com Amanda Acosta vivendo com precisão a atriz que marcou o cinema de Hollywood entre as décadas de 1940 e 1950. "Ela inaugurou algo novo, criando uma estética própria e que é influenciadora até hoje", comenta Laila, que encontrou em Carmen a oportunidade de escolher um novo rumo para sua carreira. "Eu buscava algo leve para levar ao palco e ela, apesar dos inúmeros problemas pessoais, sempre exibiu um prazer de viver."
De fato, conhecida como a Pequena Notável, Carmen Miranda tornou-se um fenômeno logo no início da carreira, nos anos 1930, quando vendeu astronômicos 35 mil discos 78 rotações da marchinha Pra Você Gostar de Mim (mais conhecida por Taí), de Joubert de Carvalho. Dona de um registro de meio-soprano de curta extensão, Carmem logo descobriu como compensar deficiências - incluindo a altura, de 1,53 m - com uma exuberância nos gestos e figurinos.
Foi uma artista que nasceu pronta para glória: o charme irresistível, o bom humor, as brincadeiras de moleca e a forma única de cantar chamaram a atenção logo em suas primeiras gravações. E os clássicos acabaram surgindo: Primavera no Rio, de João de Barro; Na Batucada da Vida, de Ary Barroso; Alô, Alô..., de André Filho, além das parcerias com Assis Valente (Minha Embaixada Chegou), prepararam Carmen para o sucesso internacional, que começou em maio de 1939, quando chegou aos Estados Unidos para um musical na Broadway.
Guerra
Logo, ela alcançaria Hollywood na mesma época em que o esforço de guerra obrigava os americanos a olharem com suspeito carinho para a América Latina. Com Serenata Tropical, de 1940, Carmen estreava na meca do cinema e iniciava um ciclo que totalizaria 14 filmes, consagrando-se como a Brazilian Bombshell.
Mas, ao mesmo tempo em que solidificava as características de ícone (a roupa de baiana, os trejeitos com os braços, a mistura de ritmos), Carmen preparava seu fim ao se tornar dependente química. Nos últimos anos de vida, conseguia dormir apenas com barbitúricos e, para voltar à tona, entupia-se de estimulantes. Morreu sozinha no banheiro de sua casa, em Beverly Hills, onde foi encontrada pela manhã.
"São muitos os detalhes necessários para viver Carmen no palco", conta Laila, cuja carreira é marcada por interpretações de grandes nomes das artes, como Elis Regina, Clara Nunes e Edith Piaf. "Era uma mulher muita expressiva com o corpo, que mexia as mãos, por exemplo, em um traçado muito específico, quase coreográfico. Também os olhos se movimentavam com um significado."
Laila ensaia viver a Pequena Notável já há alguns anos. Em 2009, foi escolhida pelo diretor João Falcão para interpretar o papel em um espetáculo, que acabou não vingando. E já faz alguns anos que Kleber Montanheiro também pensa em seu nome para o musical. Para essa encenação, inspirada no livro de Heloísa Seixas e Julia Romeu, o diretor adota a estética e as convenções do Teatro de Revista Brasileiro, grande destaque na época, no qual Carmen também se destacou.
"As interpretações dos atores obedecem à prosódia de uma época, influenciada diretamente pelo modo de falar 'aportuguesado', o maneirismo de cantar proveniente do rádio, onde as emissões vocais traduzem um período e uma identidade específica", comenta ele.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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