Em 5 meses, 595 recém-nascidos tiveram apenas a referência da mãe no documento; naturalização do abandono paterno é a principal causa, diz advogada
Todos os dias, quatro recém-nascidos são registrados na região apenas com o nome da mãe. Segundo levantamento realizado pelo Diário, com dados da CRC Nacional (Central de Informações do Registro Civil), nos cinco primeiros meses do ano, 595 crianças não tiveram o direito de reconhecimento paterno garantido – assegurado pela ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e pela Constituição Brasileira, que garante série direitos básicos, como recebimento de pensão alimentícia e herança.
O registro de nascimento, quando o pai for ausente ou se recusar a realizá-lo, pode ser feito somente em nome da mãe que, no ato de registro, pode indicar o nome do suposto pai ao cartório, que dará início ao processo de reconhecimento judicial de paternidade, conforme esclarece a Arpen-Brasil (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais). A cada dez crianças nascidas na região, quatro não possuem o nome do pai no registro de nascimento. A naturalização do abandono paterno é uma das causas para o expressivo número de pais ausentes, conforme explica Laísa Santos, advogada de direito da família do escritório advocacia Schiefler.
“Infelizmente, ainda hoje nos deparamos com bastante frequência com homens que se recusam a assumir a paternidade, deixando a cargo da genitora a responsabilidade e os cuidados dos filhos. O descompromisso de pais com seus filhos e o abandono paterno já se tornou espécie de sintoma na nossa sociedade, sendo encarado com certa naturalidade. Além de se tratar de situação bastante enraizada em nossa cultura, em que todas as responsabilidades dos filhos são, em sua grande maioria, atribuídas à mãe”, ressaltou a advogada.
Na comparação entre as cidades, São Bernardo é o município com maior ausência de registros paternos, com 178 no total. Mauá (137), Santo André (131) e Diadema (90) aparecem no topo das cidades com crianças registradas apenas no nome da mãe – veja dados por cidade na tabela abaixo. Mesmo expressivo, os números deste ano são menores do que os do ano passado, quando 671 crianças foram registradas sem o nome do pai – diminuição de 11,3% de um ano para o outro.
O período crítico da pandemia da Covid-19 pode explicar os altos números de 2021, conforme esclarece Laísa Santos. Para ela, a dificuldade nos deslocamentos em decorrência do lockdown e dos horários reduzidos dos cartórios, a crise econômica e até mesmo o falecimento dos genitores em decorrência do coronavírus ou outras doenças podem ter interferido na ausência de pais nos registros de nascimento.
A especialista reforça ainda a necessidade do debate sobre a paternidade responsável. “A paternidade responsável interessa não somente às relações pessoais e privadas, mas também ao Estado, na medida em que a irresponsabilidade paterna, somada às questões econômicas, têm gerado problemas significativos à população. A estruturação psíquica dos sujeitos se faz e se determina, em sua grande maioria, a partir da relação existente com os pais”, finaliza Laísa.
RECONHECIMENTO PATERNO
Nos cinco primeiros meses do ano, 423 pessoas tiveram o nome dos pais (biológicos ou afetivos) inseridos nas suas certidões de nascimento de forma tardia. Isso significa que a paternidade dessas pessoas foram reconhecidas seja pelo poder judiciário, devido à investigação de paternidade que pode ser apontada pela mãe da criança na hora do registro civil, ou pelo reconhecimento biológico, ou socioafetivo.
No primeiro caso, desde 2012 o procedimento de reconhecimento de paternidade biológica pode ser feito diretamente em um Cartório de Registro Civil. Nos casos em que a iniciativa seja do próprio genitor, é necessário que ele compareça ao órgão com a cópia da certidão de nascimento do filho e que haja a anuência da mãe ou, caso seja maior de idade, o consentimento do filho.
Já o registro de parentalidade socioafetiva (vínculo afetivo) também pode ser realizado nos cartórios, com consentimento da mãe quando a criança tiver a partir de 12 anos. Na ausência da mãe da criança, ou na hipótese do jovem ter menos de 12 anos, é necessário o ajuizamento de ação de reconhecimento de filiação socioafetiva. Independentemente da via eleita, para o reconhecimento do vínculo socioafetivo é necessário que se comprove a existência do vínculo afetivo entre as partes.
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