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‘A comunidade torce pelo sucesso da Coop’

Nilton Valentim
Do Diário do Grande ABC
28/03/2022 | 07:00
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Divulgação


Engenheiro de formação, Marcio Valle está há nove anos como presidente executivo da Coop. Esse ciclo se encerra na quarta-feira, quando ele passa o bastão para Pedro Mattos, transição de poder que começou a ser elaborada em 2017.

Com 1,2 milhão de cooperados, e em 22º no ranking dos maiores supermercado do País, a Coop – sob o comando de Valle – avançou no setor de drogarias. Possuía duas em 2013, agora tem 79 e planeja abrir dez a cada ano. E a próxima novidade poderá ser a implantação do primeiro atacarejo da marca.

Com 68 anos de existência e 70% de suas operações no Grande ABC, faz parte da história da região e possui uma legião de clientes fiéis, que se acostumaram a frequentar as lojas. E isso, segundo Valle, é um de seus diferenciais. “A Coop tem de ser contemporânea em tudo que oferece para continuar sendo relevante. Mas ela não tem de perder essa tradição”, afirma.

O senhor está encerrando um ciclo de nove anos à frente da Coop. Como foi a experiência de comandar uma empresa tão importante?
Extremamente gratificante. Foi uma honra eu ter participado da cooperativa e mais ainda ter comandado a empresa por nove anos. Estou há 21 anos como executivo, embora desde 1996 eu já atuasse no conselho. Foi, além de um prazer, uma experiência incrível, porque eu fiz engenharia, trabalhei na Rhodia e foi a partir de lá que surgiu a oportunidade de vir para a cooperativa. 


Qual a principal marca da sua administração?
Em termos de conquista, foi ter mantido uma equipe de colaboradores motivada, comprometida, num bom ambiente de trabalho, fazendo com que a gente tivesse um aumento na base dos cooperados como não tínhamos tido até hoje. Acima de 100 mil novos cooperados nos últimos anos. Mostrando que a cooperativa tem um valor relevante para atender às expectativas da sociedade.

Em termos de números, a Coop tem 1,2 milhão de cooperados e está na 22ª posição entre as maiores redes de supermercados do País. Como o senhor avalia esse desempenho?
São resultados bons. Nós tivemos um crescimento muito expressivo no negócio drogaria. As duas primeiras foram inauguradas em 2013 e, de lá para cá, passamos para 79. Com um negócio que hoje já é aproximadamente 20% do faturamento total da cooperativa e crescendo muito mais rápido. Caminhamos bastante também no canal digital, embora tenha muita coisa ainda para fazer.

Qual a diferença entre a Coop e as demais redes de supermercados?
O atendimento e o acolhimento ao cliente. Hoje, 80% das nossas vendas são para cooperados e 20%, para não cooperados. Mas o que dá mais prazer e orgulho é ver os cooperados virem à Coop e conversarem entre si nos corredores, procurarem determinada operadora de caixa porque é com ela que eles querem passar. É esse ambiente de acolhimento, que está inserido dentro dos nossos três atributos da marca, que são convivência, conveniência e consciência. Temos uma diferença societária também, que é distribuirmos as nossas sobras para os cooperados, que são os donos. O que se chama de lucro nas outras empresas, aqui chamamos de sobra, e essa sobra volta para os cooperados na proporção da nossa operação com a cooperativa. Isso é o que me dá orgulho, um varejo que tem alma, que tem coração.

Por que a Coop é tão querida pelos moradores do Grande ABC?
A cooperativa vai completar 68 anos em outubro. Ela cresceu junto com o Grande ABC e nesse ambiente de acolhimento, de muita proximidade, que é um esforço e uma conquista de todos os que passaram pela cooperativa, mas também uma consequência do modelo cooperativo no qual o cooperado, sendo dono, acaba de uma certa maneira cobrando essa situação. Ele não vai em uma rede social e critica a cooperativa simplesmente por criticar. Ele vai magoado porque muitas vezes se sente traído ou desrespeitado numa organização em que é o dono e o cliente ao mesmo tempo. Essa ligação cooperativa-cooperado-colaborador foi se reforçando ao longo destas quase sete décadas de existência e criou esse elo. E, realmente, quando a gente ouve o cooperado que fala ‘eu vou no Rhodia’, dá um gostinho doce. Porque essa pessoa é a história da Coop. Nós mudamos o nome de Cooperhodia para Coop no fim da década de 1990. Os mais antigos, entretanto, não mudaram a forma de falar. Isso é muito bacana. Nós ainda temos o privilégio de fazer café da manhã com os sócios fundadores. São pessoas que estão na faixa dos 85 a 95 anos. São cinco sócios. A dona Linda, que faleceu em 2019, quando fez 100 anos a gente fez uma festa para ela na loja. É a história aliada com a modernidade. A Coop tem de ser contemporânea em tudo que oferece para continuar sendo relevante. Mas ela não tem de perder essa tradição. Essa história que dá muito peso ao que a gente é.

E em outras regiões como se dá essa relação?
Com o supermercado já fomos para São José dos Campos, em 1983, Tatuí, em 2001, Sorocaba, em 2002, e, finalmente, Piracicaba, em 2004 ou 2005. Então estamos em seis cidades do Grande ABC, só não em Rio Grande da Serra. Com drogarias, crescemos bem mais. Estamos em 23 municípios no Estado de São Paulo. No negócio drogaria temos abrangência estadual e no negócio supermercado, uma abrangência regional, 70% da nossa operação no Grande ABC. Em termos de estratégia, aqui no Grande ABC temos uma estratégia defensiva, porque tem chegado muitos concorrentes. Então a ideia é proteger o market share (participação no mercado) que temos e, no Interior, expandir nessas regiões em que a gente está. As drogarias (o negócio) é bem mais aberto e podemos ir para fora do Estado.

Como o senhor vislumbra o futuro da Coop?
Nós não temos um planejamento numérico, pois estamos voltando da pandemia. A nossa intenção é preservar o market share do Grande ABC, em torno de 25%, vamos colocar tantas lojas quantas forem necessárias para manter e crescer nos pontos onde já estamos e outros que possam aparecer. Mas a prioridade são as áreas em que atuamos, o Vale do Paraíba, Região Metropolitana de Sorocaba, que também envolve Tatuí, temos apenas uma loja, mas a prioridade é crescer para expandir a operação. Na drogaria não temos essa expectativa de share, mas já entramos entre as 20 maiores redes de drogarias do Brasil. O que para nós foi motivo de comemoração. Inclusive, na nossa assembleia de quarta-feira será uma das conquistas que serão anunciadas. E nas drogarias, nosso planejamento é crescer em torno de dez drogarias por ano, de forma orgânica, sem contar aquisições de redes ou acordos operacionais como o que fizemos com o grupo Big para entrar nas galerias das lojas. Só isso nos trouxe 20 drogarias. Em 2021 nós abrimos 23.

O senhor passará o bastão ao seu sucessor em melhor situação do que recebeu?
Vou sim. Assim como o (Antonio José) Monte me passou em melhores condições do que ele assumiu e assim sucessivamente. Nós tivemos momentos de grandes desafios, como na época do Plano Cruzado, com o tabelamento de preços; depois veio o Plano Real, que melhorou bastante porque inseriu uma quantidade enorme de consumidores no mercado; depois a crise de 2008, a de 2017 e agora a pandemia, mas o importante é que sempre estamos vendo progressos. Estamos fazendo uma transição que começou a ser desenhada em 2017, quando o Pedro (Mattos) saiu do conselho de administração e veio para a diretoria executiva. Foi uma transição planejada, dentro dessa visão de transformação que é necessária. Nós não temos o direito de ficar na empresa mais tempo do que ela precisa para continuar evoluindo. Em 1º de abril o Pedro assume uma empresa melhor, com maiores desafios também. O mundo muda cada vez mais rápido e os desafios aparecem mais fortemente e é isso que move a nossa vida.

Como foi o desempenho da Coop na pandemia?
Foi um desempenho excepcional. Do ponto de vista de resultados, foi igual a todos os supermercados. Tivemos um crescimento muito grande em 2020. Nós tivemos também uma demonstração de bravura e de comprometimento dos nossos colaboradores, o que foi muito gratificante. Eles atuaram na linha de frente, em um ambiente que era de total insegurança e medo. Em pouco mais de um mês colocamos uma operação de delivery em funcionamento. O nosso comércio digital cresceu 700% de 2019 para 2020 e de 2020 para 2021 cresceu outros 400%. Essa é uma tendência que ficou da pandemia. Ano passado conseguimos aumentar as nossas ações sociais junto aos fundos sociais de solidariedade e de entidades beneficentes das regiões em que atuamos, distribuímos mais sobras. Pelas dificuldades e pelas conquistas que alcançamos ao vencer esses desafios, deram um sentimento de vitória enorme. Estamos saindo muito fortalecidos.

E o pós-pandemia?
A pandemia acelerou a digitalização da economia. Então não é apenas a compra pelo aplicativo ou e-commerce, mas temos hoje o trabalho híbrido, com três dias (no) presencial e dois (no) remoto, não faz mais sentido aquelas reuniões enormes ou deslocamento de gente para treinamentos. Fizemos a nossa convenção, com 250 pessoas, virtual. Todos puderam participar. Hoje a maioria dos treinamentos é a distância, recrutamento, seleção, tudo a distância. A pandemia trouxe a simplificação dos processos, aumento de produtividade. Uma outra questão é pensar alguns valores. Muita gente passou a questionar a vida que estava levando e o quanto isso valia a pena. As pessoas estão pensando diferente.

O senhor já pensou no que vai dizer para o seu sucessor na hora da transmissão de cargo?
Já pensei e disse. É muito simples. Continuo acreditando e torcendo muito pela Coop e confio demais nas pessoas que trabalham na Coop. Na competência, na ética, no jeito de ser e de fazer de todos nós. A Coop tem cooperados que gostam, que torcem por ela e que confiam nas pessoas dessa empresa. Desejei sucesso, porque a comunidade torce pelo sucesso da Coop. Essa fórmula parece simples, mas é muito complexa, porque isso não depende do que estiver na minha mesa ou eu mandar fazer. Eu não sou a Coop. A Coop é quem você encontra na loja. É quem te atende no caixa, a forma como a pessoa te olha no atendimento do açougue, o carinho de te levar no local onde está o produto que você está procurando. A Coop é isso, e quando você tem isso distribuído em cada um dos colaboradores, aí está o segredo do negócio.

O que o senhor vai fazer depois de deixar a presidência?
Eu tenho mais duas atividades formais, que é a participação em dois conselhos. Mas estou vendo a possibilidade de voltar a estudar. Aprender um pouco mais sobre coisas que eu gosto. Sou engenheiro, ainda gosto de química, física e astronomia. Vou me aprofundar também na parte de governança. A gente tem uma dívida com a sociedade. Eu estudei em escolas públicas, fiz a Poli da USP (Universidade de São Paulo), que me deu condições de muito aprendizado e de qualidade de vida. E a gente entra em uma fase na qual tem a obrigação cidadã de devolver isso à sociedade. Quero fazer trabalhos voluntários. Mas numa sintonia mais equilibrada de vida pessoal e profissional.

RAIO X

Nome: Marcio Francisco Blanco do Valle
Idade: 63 anos
Local de nascimento: São Paulo
Formação: engenharia química pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (1981)
Hobby: estudar história da arte, visitar museus, exposições, locais históricos
Local predileto: as cidades de Tiradentes ou Paraty
Livro que recomenda: A Lógica do Cisne Negro, de Nassim Taleb
Artista que marcou a sua vida: Gilberto Gil 




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