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‘Guernica’, infelizmente atual há 70 anos
Alessandro Soares
Do Diário do Grande ABC
26/04/2007 | 07:05
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Há exatos 70 anos, a vila de Guernica, norte da Espanha, no País Basco, era bombardeada pela força aérea da Alemanha nazista, com total apoio e conivência do governo espanhol do ditador Francisco Franco. Pablo Picasso (1881-1973) expressou o significado deste ato covarde para os valores da humanidade no mural Guernica, pintado entre maio e junho de 1937, com 7,82 m x 3,50, no calor do acontecimento. Tornou-se manifesto artístico contra a dor e o sofrimento provocados por guerras e imagem evocada ao longo do século XX em protestos antibélicos.

Em 1940, na Paris ocupada pelos nazistas, o embaixador alemão teria perguntado a Picasso, diante de uma foto que reproduzia Guernica, “Foi o senhor quem fez isso?”. Picasso teria dito “Não, foram vocês”.

O contexto histórico da obra e do bombardeio remonta a 1936, ano do início da Guerra Civil Espanhola. Os partidos de esquerda vencedores das eleições de fevereiro enfrentaram a rebelião do exército, aliado dos partidos de direita. Este embate ideológico foi ensaio para o que seria a Segunda Guerra (1939-1940). Países de orientação nazi-fascista, Alemanha, Itália e Portugal, apoiaram com tropas e voluntários os rebeldes direitistas; a então União Soviética (Rússia e países satélites) mandou armas e assessores para os republicanos. Outros estrangeiros se voluntariavam nas Brigadas Internacionais, organizadas pelos comunistas de vários países.

Em 1937, mais da metade da Espanha era controlada por Franco. O próximo objetivo era o País Basco e Guernica, centro cultural e religioso da região, que abrigava vários republicanos. Em 26 de abril de 1937, a pequena cidade foi bombardeada. Durou duas horas, e parou às 19h30. Os incêndios duraram um dia e não houve cifra oficial de mortos.

O pretexto militar foi conhecer o mínimo de explosivos que meios aéreos necessitavam para destruir completamente uma cidade. Guernica foi um ensaio. A imprensa franquista espalhou que os bascos haviam destruído a cidade em retirada. Mas correspondentes estrangeiros que viram o massacre reportaram o que aconteceu. A notícia chegou a Picasso, então na França, pelos jornais. Picasso havia sido nomeado diretor do Museu do Prado por Franco, em 1936. Estava na França para realizar um mural representativo da Espanha na Feira Mundial de Paris. Ao saber de Guernica, mudou de planos.

Em 18 tons de cinza, mais o preto e o branco, Guernica evoca a morte. O quadro não retrata o bombardeio, mas suas conseqüências. Cheio de simbolismos (o touro espanhol, força e agressão), o cavalo partido (o povo em luta), a mulher com filho morto à esquerda (uma Pietà moderna), a lâmpada onisciente (Deus e Igreja impotentes), a mulher com lampião, o olhar de fora a iluminar o horror; e os olhos desfigurados dos inocentes mortos.

A obra só retornaria à Espanha, por desejo do autor, quando a democracia voltasse ao país. Guernica ficou sob guarda do MoMA de Nova York para onde foi levado clandestinamente durante a Segunda Guerra e exposto em várias cidades, São Paulo entre elas. Só em 1981 votou a Madri, onde está hoje no museu Reina Sofia, o “último exilado” da Guerra Civil. Quando mostrou Guernica pela primeira vez, Picasso escreveu que “os artistas não podem nem devem permanecer indiferentes diante de um conflito no qual estão em jogo os mais altos valores da humanidade e da civilização”. Mas Guernica evoca uma incômoda teimosia em se manter atual.




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