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Wilson Simonal ainda emociona
Dojival Filho
Do Diário do Grande ABC
14/05/2009 | 07:01
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Divulgação


Primeiro popstar negro do Brasil, pária da música popular e artista capaz de dominar multidões apenas com o carisma e a extensão vocal. Essas e outras facetas do cantor Wilson Simonal (1939-2000) compõem o documentário "Simonal - Ninguém Sabe o Duro que Dei", que estreia amanhã em circuito nacional - lamentavelmente não no Grande ABC.

Dirigido por Cláudio Manoel, comediante do humorístico global "Casseta & Planeta Urgente", em parceria com Micael Langer e Calvito Leal, o filme reconstitui a controversa trajetória do intérprete, marcada por sucessos avassaladores e linchamento moral sem precedentes.

Durante a segunda metade dos anos 1960, o músico emplacou diversos hits, como "Mamãe Passou Açúcar em Mim" e "Nem Vem que Não Tem", exemplares da fusão de ritmos dançantes e da espontaneidade características do astro.

A derrocada começou em 1971, no auge da carreira. Desconfiado de que estava sendo roubado, Simonal teria pedido a agentes do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) que dessem uma surra em seu contador Raphael Viviani.

O incidente foi parar nos jornais e o agente do órgão de repressão Mário Borges afirmou que o cantor era informante do Dops, o que até hoje não foi provado. A acusação reverberou ainda mais quando o jornal Pasquim - referência da esquerda brasileira e da imprensa alternativa - iniciou campanha em que reforçava o rótulo de dedo-duro.

O documentário traz depoimento comovente de Viviani, que falou publicamente sobre o episódio pela primeira vez e garantiu ter sido torturado para declarar-se culpado.

"Contratamos um detetive para encontrar o contador, que também sofreu muito com essa história porque, se o Simonal ficou com a pecha de delator, o Viviani ficou conhecido como ladrão. Então, foram duas famílias destruídas nesse episódio", explica Cláudio Manoel, que contou com apoio irrestrito dos familiares dos filhos do artista, Simoninha e Max de Castro.

O diretor faz questão de deixar claro que o documentário não tem a intenção de julgar, mas de resgatar o legado musical. Apesar de não fazer julgamentos, Cláudio Manoel não acredita que o artista tenha sido realmente informante de órgãos de repressão.

"Acho difícil que isso tenha ocorrido, por vários motivos. Ele veio da periferia do Rio de Janeiro e, sendo um cara arrogante como era, e não tendo a compreensão do que era a ditadura, não se encaixaria no papel submisso de X-9 (gíria carioca para delator)."

CURIOSIDADES - Além de inspiradas performances musicais - com destaque para a apresentação para 30 mil pessoas no Maracanãzinho, no Festival Internacional da Canção de 1969 - o filme traz depoimentos memoráveis que ajudam a traçar o perfil do ícone. "O Simonal não se achava o rei da cocada preta. Ele era o rei da cocada", define o humorista Chico Anysio.

O ator e cantor Toni Tornado, amigo íntimo do intérprete, sustenta a tese de que a decadência de Simonal teve componente de discriminação racial e que o amigo não contou com nenhuma solidariedade.

"O problema é que os milicos achavam a gente crioulos metidos à besta e a esquerda dizia que a gente era americanizado." Também participam do documentário os cartunistas Jaguar e Ziraldo, representantes do Pasquim, o crítico musical Nelson Motta e o showman Miele.

O momento mais emocionante fica por conta da segunda mulher do cantor, Sandra Cerqueira, que relatou a depressão e os problemas com alcoolismo que perturbaram o ex-marido até a morte por cirrose hepática. "Ele dizia: ‘Eu não existo na música brasileira'. Quando ia aos shows dos filhos, ficava escondido para que eles não ficassem constrangidos com a presença do pai."




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