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Dois livros chegam às livrarias para excitar
Danilo Angrimani
Do Diário do Grande ABC
06/07/2002 | 17:45
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São dois livros e uma mesma aspiração: deixar o leitor excitado. Mais do que excitado: em brasa. São livros escritos de bruços, para o leitor ler na mesma posição. O primeiro, de Paola Milano, uma italo-brasileira, chama-se Entrevistando Jenifer – Bastidores da Iniciação Erótica de Certas Meninas. O outro é de uma sino-americana, Wei Hui, e ganhou o nome de Xangai Baby.

As capas são sugestivas. O livro sobre Jenifer traz uma ninfeta de calcinha e sutiã, sobre um fundo de papel-parede de corações cor-de-rosa. É como se a gente estivesse olhando pelo buraco da fechadura, observando Jenifer, que posa com o dedinho na boca.

Mais explícito, Xangai Baby mostra o close de um pé feminino, com as unhas esmaltadas de um vermelho escandaloso, o contorno da perna, da coxa e a genitália parcialmente coberta por uma calcinha branca amarfanhada em local estratégico.

O livro de Jenifer, editado pela Geração Editorial, é ilustrado. A ninfeta aparece em pequenas fotos no alto dos capítulos. Sempre descalça, de minissaia ou de calcinha e com um olhar de safada.

Xangai Baby, da Editora Globo, traz uma foto 6cm x 6cm da autora Wei Hui (pronuncia-se Uei-Uei), na contracapa, com o cabelo puxado para trás, preso pelo indefectível coque oriental. A boca decorada com batom, maquiagem para reforçar a palidez e um olhar sedutor, porém, discreto.

Paola Milano também aparece na contra-capa de seu livro, em uma foto fora de foco, 4,5cm x 5,5cm. Está de óculos escuros, como se não quisesse ser identificada pelos vizinhos.

Esse destaque às capas e ilustrações, antes da análise do conteúdo, tem procedência. Ambas as obras oferecem sedução ao leitor. A embalagem do texto, no caso, é a própria mensagem. É como se a gente estivesse levando Jenifer e Uei–Uei para a cama. O conteúdo não interessa.

Em se tratando de Xangai Baby, o que se observa é uma autora de uma mediocridade abissal. Uei-Uei conta histórias de personagens sem-história que vivem em uma Xangai ocidentalizada e sem nada a acrescentar.

Os capítulos são precedidos por citações de Henry Miller, Jack Kerouac, Allen Ginsberg. Até as citações são complicadas, porque a autora consegue alinhar um parágrafo do corajoso Henry Miller no mesmo plano de uma citação bobinha de Elizabeth Taylor. Enquanto Miller armava-se de uma picareta e fazia um trabalho solitário de destruição do sonho americano, Elizabeth Taylor era a encarnação do próprio sonho, via Hollywood.

Uei-Uei começa o capítulo 9, por exemplo, com uma frase do maldito, e para sempre drogado, William Burroughs: "Não venha me perturbar. Não bata na porta, e não escreva." E lá vem Uei-Uei: "Alguém estava batendo na porta..." Devia ser aquela tartaruga da publicidade de cerveja, que, como Uei-Uei, é mais chata que lâmina de barbear.

O livro de Paola Milano sobre a ninfeta Jenifer tem um formato ambicioso. A autora narra as aventuras sexuais de Jenifer, suas amigas e primas, enquanto entremeia o texto com mini-entrevistas, do tipo: "O que você sentia, enquanto a Paulinha te contava isso? Ah, comecei a ficar louca. É? Eu imaginava tudo ali na minha frente."

Jenifer mora no Brasil, é adolescente e passa 187 páginas em meio aos mais diversos experimentos sexuais. A autora injeta sadomasoquismo, escatologia, homossexualismo, voyeurismo no mesmo ritmo que o cineasta Steven Spielberg produz seus xaropes.

Enquanto Spielberg milimetra os segundos e induz seu público a chorar, a rir, a gritar de medo, a pular de alegria, Paola Milano nos dá injeções de transgressão. "Agora é hora de alguém apanhar. Agora alguém verá o outro fazer sexo." E por aí vai.

Derrubado o Muro de Berlim, o que resta do outro lado? Entrevistando Jenifer é, pelo menos, razoavelmente bem escrito e chega a ser excitante. Isso sem falar da Lolita bonitinha que a gente encontra a cada meia dúzia de páginas. Xangai Baby tem mero valor de uso. É para fetichistas que certamente vão emoldurar a capa.




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