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Em um ano, favela Naval será passado
Fábio Munhoz
Do Diário do Grande ABC
04/02/2011 | 07:37
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Em um ano, a Naval finalmente deixará de ser uma favela. A afirmação é do secretário de Habitação de Diadema, Márcio Vale, que garante a extinção de todos os barracos nos próximos 12 meses. A área passa por processo de urbanização, intensificado em 2008, após o início da construção de unidades habitacionais.

Para transformar a Naval em bairro, cerca de R$ 25 milhões já foram investidos pela Prefeitura e pelo governo federal, por meio do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O núcleo, que chegou a ter aproximadamente 700 famílias, agora tem pouco mais de 500. Em julho, a administração entregou 204 apartamentos no bairro Serraria para moradores da antiga favela (veja reportagem abaixo). Cada unidade tem 42 m² e dois dormitórios, além de sala, cozinha e banheiro.

Dentro da Naval também foi entregue conjunto habitacional com capacidade para 48 famílias. Segundo o secretário, o passo seguinte será a construção de novos prédios em terreno próximo às unidades já entregues, na Rua Idealópolis, próximo ao Corredor ABD. Mais 84 famílias serão beneficiadas com a inauguração, que está prevista para ocorrer em até 12 meses. Vale informar que a urbanização já está "90% pronta".

"Paralelo às construções, estamos executando o projeto de requalificação habitacional, que consiste em reformar os imóveis e transformar barracos em casas", explica Vale.

Durante visita ao local, a equipe do Diário presenciou funcionários da Prefeitura instalando novas luminárias nas ruas e substituindo as já existentes. "Isso quer dizer que a Naval já entra no planejamento como um bairro."

Após o término das construções e do programa de reformas, a Prefeitura dará início à última fase do processo de urbanização: a regularização fundiária. Os proprietários dos imóveis irregulares receberão documentação e terão de pagar IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano).

INFRAESTRUTURA
Além do novo padrão habitacional, os moradores da antiga favela serão beneficiados com melhorias na infraestrutura. Vale diz que a Prefeitura irá duplicar a Escola Municipal Senador Teotônio Vilela, além de construir uma creche em frente aos novos prédios.

Bairro Serraria abriga um pedaço da Naval 

Desde a metade do ano passado, o bairro Serraria passou a abrigar uma parte da antiga favela. Mais de 200 moradores da Naval foram acomodados em um conjunto habitacional na Rua Ana Maria. Apesar do novo endereço, o local conserva a vizinhança e os laços de amizade construídos na comunidade próxima à divisa com São Bernardo.

A dona de casa Rita Maria de Oliveira, 53 anos, morou por 20 anos na Naval. Ela se diz feliz por manter os vizinhos da época em que habitava um barraco. "Seria mais difícil começar tudo de novo e se adaptar a outro pessoal", avalia.

O novo conjunto de prédios, que possui corredores largos, grama e bancos, permite o nascimento de novas amizades, na opinião da dona de casa Silvana Nunes Lopes, 26. "Lá, muita gente não saía na rua. Aqui, como é mais seguro, o pessoal fica do lado de fora. Conheci pessoas que eram minhas vizinhas e eu não sabia", conta.

Silvana, que há nove anos deixou o Piauí para vir morar em São Paulo, afirma que a nova moradia surpreendeu seus parentes do Nordeste. "Meu sogro veio conhecer e adorou. Meu irmão não acreditou que isso aqui é meu, pensou que eu estava morando de aluguel."

A boa aparência do condomínio agrada também aos jovens. "Estou me sentindo um boy aqui. É um lugar ótimo para trazer as minas", comenta o auxiliar de pintura Alfredo Soares da Silva, 20. Empolgado com as novas vizinhas, ele diz que o conjunto habitacional é bom para "arrumar namoradas". Ele morou na Naval desde que nasceu.

Para a auxiliar de produção Marly Elias de Melo, 42, a principal vantagem é a privacidade. "Lá na favela era muito barulho, muita gente olhando." O fato de a área estar livre de enchentes também agrada. "Quando chove, fico tranquila, pois sei que vou chegar em casa e tudo vai estar no lugar."

Chegada do carteiro representa dignidade para moradores 

"Hoje o carteiro deixa as cartas aqui em casa. Agora posso dizer que tenho um endereço de verdade". É desta forma que a diarista Isete da Silva, 34 anos, resume a alegria de morar na casa própria. Ela é uma das 48 famílias que deixaram a favela Naval para ficar no Núcleo Habitacional Piraporinha 2, construído na mesma região.

Isete morou na Naval desde que nasceu. Ela conta que, quando criança, ouvia promessas de que a comunidade seria urbanizada. "Mas isso nunca aconteceu, nunca saiu do papel. Por isso que até agora nem acredito que estou morando aqui. É um sonho."

Ela revela que teve medo quando foi informada de que teria de deixar o barraco para dar lugar ao futuro prédio. "Pensei que não fosse ser construído, e que eu ficaria morando de aluguel."

Emocionada, a dona de casa Zeneide Soares, 35, elogia a estrutura da nova moradia que, segundo ela, "se melhorar estraga". Ela morou por 20 anos em um barraco na Naval e salienta a persistência dos moradores. "Nós tivemos de lutar por tudo isso. É uma conquista", destaca.

Já a aposentada Severina Ferreira, 62, não faz parte dos moradores no conjunto habitacional. No entanto, o lugar onde ela mora, que antes era um barraco, foi reformado e hoje é uma casa. "Não é só a minha casa que melhorou. Antes, onde eu morava era uma viela de terra, por onde não passavam carros. O esgoto era a céu aberto e não tinha iluminação pública", lembra.

Ela também salienta que, antes das obras de requalificação habitacional, não tinha endereço. "Era muito difícil para alguém achar a nossa casa. O carteiro não conseguia chegar e distribuía as cartas na entrada da favela", conta.

Área era símbolo de violência e descaso com moradores 

Antes de o processo de urbanização ser colocado em curso, a então favela Naval era associada a medo, violência e abandono. O local ficou nacionalmente conhecido quando, em 1997, uma violenta operação da Polícia Militar resultou na morte do conferente Mário José Josino.

As imagens foram divulgadas por uma emissora de televisão e mostraram policiais agredindo e extorquindo moradores. O autor dos disparos que mataram Josino foi o soldado Otávio Lourenço Gambra, o Rambo, à época com 38 anos.

Além da violência, a comunidade da Naval já teve prejuízos com os inúmeros incêndios que ocorreram no local. O último deles, no ano passado, danificou mais de 100 barracos e deixou 50 famílias desabrigadas.

Em outubro de 1999, outra queimada destruiu 20 residências e deixou 88 famílias sem local para ficar.

ENCHENTES
Outro problema que tirava o sono dos moradores da Naval eram as enchentes. Segundo o líder comunitário Davi Pereira, a situação melhorou após a construção de um piscinão nas proximidades.




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