Em novela tudo tem remédio, até a morte. Só na Globo, por exemplo, as três novelas que estão atualmente no ar (Sinhá Moça, Cobras & Lagartos e Páginas da Vida) têm personagens mortos circulando entre os vivos. O recurso da ressurreição foi usado até na Record, em Prova de Amor.

Os motivos para recorrer ao sobrenatural são variados. Pode ser por uma exigência da trama, como em Sinhá Moça. Na novela das seis, o personagem Pai José (Milton Gonçalves) retorna como espírito por ser considerado pelos escravos um símbolo da luta pela liberdade. “Ele morre como um herói”, diz Gonçalves.

Mas o motivo mais comum é mesmo a exigência do público. Páginas da Vida, da Globo, promoveu o retorno de Nanda (Fernanda Vasconcellos) apesar de ser uma novela absolutamente naturalista. Nanda aparece para o pai, Alex (Marcos Caruso), instantes depois de morrer, por complicações no parto de um casal de gêmeos. A moça estava marcada para morrer no capítulo 20. O sucesso junto ao público fez com que Manoel Carlos adiasse sua morte por três capítulos. Melhor para a atriz que, mesmo em espírito, vai lutar até o fim da trama para unir os filhos. “Adorei a história criada pelo Maneco. Abriria mão de qualquer outro papel para viver a Nanda”, valoriza a atriz.

Mas nem todos os personagens voltam como fantasminha camarada. Omar Pasquim, papel de Francisco Cuoco em Cobras & Lagartos, retornou para infernizar a vida de Foguinho (Lázaro Ramos). Não fica claro, porém, se o espírito aparece como anjo vingador ou é apenas um delírio de culpa de Foguinho, que passou a perna no amigo Duda (Daniel de Oliveira) para ficar com a fortuna de Omar. Peça fundamental do núcleo central da história, a morte do personagem foi uma jogada ousada do autor. “A novela tem uma narrativa arriscada. Desde que o Omar morreu, a audiência só cresce”, exalta o dramaturgo João Emanuel Carneiro.

Foi para manter a audiência que o autor Tiago Santiago resolveu trabalhar com este e o outro mundos em Prova de Amor. Por conta do atraso da sucessora, Bicho do Mato, o autor se viu obrigado a trazer de volta o principal vilão da história, Lopo. “Tinha mais um mês de novela e precisava manter a ameaça do Lopo sobre os outros personagens. E o fantasma representava o medo”, argumenta Santiago, que conseguiu manter o ibope.

Mas há casos em que fantasmas não aparecem apenas por uma questão de oportunidade. São a própria razão da trama. É o caso da próxima novela das seis da Globo, O Profeta, remake da trama de Ivani Ribeiro exibida pela extinta TV Tupi entre 1977 e 1978. O vilão Murilo (Malvino Salvador) volta como espírito para assombrar Thiago Fragoso, protagonista da trama. Só que o período no plano espiritual fará com que ele lute para apagar os atos cometidos em vida. “Ninguém é totalmente bom ou mau. Ele volta como espírito mas será ajudado no plano espiritual”, argumenta o ator.

O eterno retorno – Entre as tramas ligadas ao espiritismo, é inevitável lembrar de A Viagem. Escrita por Ivani Ribeiro (e exibida na Tupi entre 1975 e 1976), foi a primeira a ter um núcleo composto apenas por personagens mortos. A versão original fez tanto sucesso que a Globo produziu e exibiu, em 1992, um remake. “Era uma novela que tinha um conceito espiritualista. Os personagens apareciam para as pessoas que tivessem sensibilidade ou certo nível espiritual para vê-los”, explica Wolf Maya, que dirigiu o remake.

Na novela, os personagens de Christiane Torloni, Antônio Fagundes e Guilherme Fontes voltam como espíritos depois de mortos. “A Viagem tem ‘alma’ própria. Foi escrita há mais de 30 anos e tem uma história tão forte que, mesmo depois de refeita, foi exibida mais duas vezes”, lembra Christiane Torloni.