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Fundação Japão exibe documentário 'Cartas'
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
18/05/2004 | 20:27
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O documentário que a Fundação Japão exibe desta quarta a sábado, em seu Centro Cultural na avenida Paulista, leva o nome Cartas. É um título que guarda a dimensão da solidão em que vivem os dekaseguis, descendentes de japoneses nascidos no Brasil que vão tentar a sorte profissional na terra mater de seus antepassados. “Acho que todos que vêm de famílias japonesas têm algum parente que já foi ou é dekasegui”, diz o diretor Hélio Ishii, ex-videomaker que estréia no formato documental com Cartas.

Ishii fala com conhecimento de causa. Em 1991, foi ao Japão para amealhar um pé-de-meia. “Na verdade, não sabíamos de muita coisa. A gente vai com uma certa idéia, de que o Japão é aquele que os pais falam para a gente. Mas eles (os pais) já conheciam um outro Japão, diferente do país de hoje”, afirma. “Você se acha japonês aqui (no Brasil), e lá (no Japão) você não é”.

Dekasegui, no idioma nipônico, é a fusão dos verbos “partir” e “trabalhar”. É uma palavra geralmente empregada em tom lânguido. Palavra que resenha as condições a que são expostos os brasileiros que rumam à terra do sol nascente para assumir postos de trabalho braçal desprezados pela mão-de-obra japonesa e lidam com uma espécie de distanciamento por parte dos conterrâneos de seus pais e avós. “Não é nem preconceito deles com estrangeiros. É que o modo de vida deles é bem diferente do nosso. É difícil compreendê-los”.

Em Cartas, são quatro mulheres a darem depoimentos sobre a experiência de cruzar o globo em busca de economias. Umas embarcam com a família; outras seguem sozinhas, para rearranjar a situação financeira dos familiares que permaneceram no Brasil e para os quais pretendem enviar remessas do dinheiro ganho lá. Uma destas é identificada como Regina, residente em Santo André e que aos 18 anos viajou ao Japão, na época em que presenciava a desapropriação da casa do pai.

Ishii recusa qualquer tendência ao discurso feminino para refletir sobre a questão dos dekaseguis, representados hoje por milhares de trabalhadores e responsáveis pelo envio para o Brasil de milhões de dólares anualmente. “Aqueles problemas que elas enfrentam dizem respeito a todo mundo que já foi para o Japão com esse objetivo”. Ainda que Cartas seja o primeiro filme de uma trilogia documental norteada por elas – e completada pelos inéditos Meninas do Samba e Outros Olhos –, o diretor insiste que não quer formar uma “perspectiva feminina”. A vantagem, segundo ele, “é que as mulheres falam de seus problemas muito mais abertamente do que os homens”. Em Cartas, que poderá ser visto em quatro oportunidades nesta semana, são elas que dão a medida da melancolia, da distância e do rompimento do tendão que deveria unir imigrantes e ancestrais.

Cartas – Documentário dirigido por Hélio Ishii. Estréia nesta quarta, às 19h, com música ao vivo, seguido de mesa-redonda, às 20h30. Outras exibições: quinta, às 15h; sexta-feira (dia 21), às 19h; sábado (dia 22), às 16h. No Espaço Cultural Fundação Japão – av. Paulista, 37, 1º andar, São Paulo. Tel.: 3141-0110. Entrada franca.




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