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Shows de comemoraçao têm fado, samba e festa de boi
Do Diário do Grande ABC
21/04/2000 | 17:09
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A cantora portuguesa Dulce Pontes divide o palco da Praça da Paz do Ibirapuera, neste sábado, a partir das 16 horas, com o cantor e compositor baiano Caetano Veloso. O espetáculo faz parte das comemoraçoes dos 500 anos do Descobrimento do Brasil. Trata-se do primeiro de uma série de encontros entre músicos portugueses e brasileiros previstos para este ano, promovidos pelo grupo Pao de Açúcar. Caetano e Dulce já se apresentaram juntos antes, mas nem todos os números serao cantados pelos dois.

Dulce está lançando no Brasil seu novo disco, "O Primeiro Canto" (Universal). É, como os quatro anteriores, um trabalho acústico e delicado, no entanto fortíssimo; a força vem do repertório sempre apoiado na determinaçao e na tristeza do fado e das outras músicas regionais portuguesas. Ela é, por sinal, uma das responsáveis pela reabilitaçao do fado como a grande música de portuguesa: durante décadas, o gênero ficou associado à ditadura salazarista, passando a representar o Portugal retrógrado, com as liberdades civis abolidas. Naturalmente, o fado nao era nada disso. Mas só mesmo no fim dos anos 70 os portugueses o redescobriram.

Dulce nasceu em Montijo, em 1969. Estudou balé, deixou-o pela música, descobriu-se no fado. Participou de festivais e, no início, cantava rock, baladas em inglês. Quando começou a cantar o fado (o primeiro disco saiu em 1992), foi proclamada a sucessora de Amália Rodrigues. Mas Dulce é mais do que um sucedâneo (atençao: ela adora Amália Rodrigues). Ela recria, redescobre, reelabora a música de sua terra, naquilo que Miguel Souza Tavares chamou de "minuciosa descida às fontes da música popular portuguesa": no recolhimento de sons, instrumentos e vozes, dos passos tradicionais do fandango aos cantos rurais do Alentejo. Esta é a definiçao de "O Primeiro Canto". É o que se ouvirá neste sábado à tarde.

Outro espetáculo que faz alusao aos 500 anos de Brasil é o do Grupo Cupuaçu, em cartaz, só neste sábado, a partir das 19 horas, no Morro do Querosene, no Butanta. O Grupo Cupuaçu existe há 16 anos e só agora fez um disco, "Toadas do Bumba-meu-Boi" (selo Núcleo Contemporâneo). O lançamento oficial do CD, neste sábado, vai ser durante a Festa do Renascer do Boi.

O Cupuaçu foi fundado e é dirigido pelo dançarino e pesquisador Tiao Carvalho. Ele explica que a Festa do Boi, comemorada três vezes por ano na praça central do bairro do Morro do Querosene, é uma espécie de ópera popular. No Sábado de Aleluia, comemora-se o Renascer do Boi. No dia 24 de junho, o Batizado do Boi. Em 23 de outubro, a Morte do Boi. As partes contam a história de Chico e Catirina: ela está grávida e quer comer uma língua de boi. Para matar sua vontade, os amigos roubam um boi, que fica doente, é abandonado, encontrado pelos índios e curado. Pandeiroes de pele de cabra, matracas de madeira tocadas com as maos, tambores e maracás marcam o ritmo dos cantos e das danças.

O Cupuaçu nao é, entretanto, um grupo original de folclore, mas uma formaçao de estudiosos da cultura popular. Tem 30 componentes, que se conheceram nas oficinas de danças brasileiras do Teatro Vento Forte. Portanto, embora seja o primeiro disco com músicas de bumba-meu-boi gravado em Sao Paulo o deles abriga toadas e cançoes de compositores de outros estados onde se brinca o boi, como Minas Gerais e Maranhao. As roupas ricas, coloridas, brilhantes, completam o fascínio.

Samba também é cultura popular, e é o assunto da festa montada para este sábado (a partir das 23 horas) no Sesc Ipiranga. As atraçoes da grande confraternizaçao - um show que é uma grande confraternizaçao - batizada de Festa do Descobrimento - Cantando o Samba pela Raiz - sao o Quinteto em Branco e Preto, o compositor, cantor e escritor Nei Lopes e o compositor e cantor Joao Nogueira. Depois da apresentaçao dessa turma da pesadíssima, segue-se um baile, sem hora para terminar, animado pelo Quinteto em Branco e Preto e pela Orquestra GL7. O assunto, claro, continua sendo o samba.

O Quinteto em Branco e Preto é um grupo de samba novíssimo - ainda nao tem três anos de existência - formado por dois grupos de irmaos de Sao Paulo: os Bezerra (Victor, que toca surdo, Yvison, da percussao, e Everson, do violao) e pelos irmaos Maurílio Oliveira (cavaquinho) e Magno de Souza (pandeiro). Sao muito jovens - o mais velho tem 24 anos - e já muito experientes. Talentosíssimos, tornaram-se os anfitrioes dos grandes sambistas que freqüentam os palcos da cidade - cariocas como Wilson das Neves, Monarco, Beth Carvalho, ou paulistas, como Carlinhos do Cavaco ou Oswaldinho da Cuíca. Acabaram de gravar o primeiro disco, "Riquezas do Brasil", a ser lançado no mês que vem pela gravadora CPC-Umes.

Nei Lopes é um dos grandes compositores do samba carioca (autor de sucessos como Gostoso Veneno, Senhora Liberdade, Goiabada Cascao, parceiro de Wilson Moreira, Nelson Sargento e Guinga, para citar poucos títulos e poucos nomes), criador de enredos para a Vila Isabel, ex-integrante da Velha Guarda do Salgueiro, escritor, autor teatral, estudioso da cultura negra, roteirista de cinema. Acaba de lançar, pela CPC-Umes, o disco "Sincopando o Breque", em que recupera a tradiçao do samba sincopado, com obras de sua autoria, e está preparando uma enciclopédia da diáspora negra e uma biografia de Zé Kéti.

Joao Nogueira quase dispensa apresentaçao. O criador de Espelho, Meu Lema e Poder da Criaçao é um dos símbolos do samba do Rio de Janeiro. Acompanhado do Quinteto e do violonista Jorge Simas, Joao vai encerrar o show, cantando Nó na Madeira, Batendo a Porta, Pro Mundo Morar e outras obras próprias, além do samba de breque Baile no Elite, que compôs com Nei Lopes.

Na abertura, O Quinteto em Branco e Preto acompanhará Nei Lopes, interpretando músicas do compositor e sambas-enredo da Portela, Vila Isabel, Acadêmicos do salgueiro, Nenê de Vila Matilde, Vai-Vai, Camisa Verde e Branco. No programa, ainda, sambas de quadra dessas escolas e outras.

Quinta-feira - Na quinta-feira, o Instituto Moreira Sales inicia uma programaçao também homenageando o Descobrimento. O espetáculo inaugural chama-se Brasil 500 Anos - Ares de Vera Cruz e inicia-se com a apresentaçao da Companhia Papagalia, especializada em música portuguesa do século 16. Com entrada gratuita (o show começa às 21 horas e os ingressos devem ser retirados até 15 minutos antes), Ares de Vera Cruz interpreta do cancioneiro ibérico seiscentista.




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