Cultura & Lazer Titulo
Trama brasileira
Thiago Mariano
Do Diário do Grande ABC
07/05/2011 | 07:49
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Divulgação


Como se tramasse um bordado, Mônica Salmaso foi costurando à sua verve erudita pitadas de um Brasil diverso, passeando pelo cancioneiro e tecendo de amor um trabalho que carrega na simplicidade - tal qual o das bordadeiras - singeleza e verdade. O resultado está em 'Alma Lírica Brasileira' (Biscoito Fino, preço médio R$ 34,90).

A seleção do repertório partiu do resgate de canções que mesclam um quê de erudição com o típico popular brasileiro, escolhas que viriam a calhar para a formação enxuta do projeto, que traz na parte melódica Nelson Ayres ao piano e Teco Cardoso nos sopros. Mônica desfia composições como 'Melodia Sentimental' (Villa-Lobos e Dora Vasconcelos), 'Derradeira Primavera' (Tom Jobim e Vinicius de Moraes), 'Lábios que Beijei' (J. Cascata e Leonel Azevedo) e 'Trem das Onze' (Adoniran Barbosa).

"Essa expressão é algo com que eu sempre flertei. Meu interesse passa pelo que seria a alma lírica. Tem a ver com a estrutura erudita, no sentido de conhecimento e cuidado. E tudo isso traz um tempero brasileiro, que é o jeito de ver as coisas, com humor, fé, uma resignação que nunca é total", comenta a intérprete.

Diversidade que, segundo Mônica, ao mesmo tempo que passeia pela Sala São Paulo, flui pelas teclas do piano de Tom Jobim. "Você encontra paralelos desta alma", diz. Os delas, fiaram-se ao bordado. "É muito brasileiro uma pessoa fazendo um bordado. Eu me sinto bordadeira, principalmente na hora de escolher o repertório, conceber o trabalho. Não penso em um disco que não tenha a ver com as pessoas convidadas. O repertório é afetado por elas, tudo se aglutina, como se fosse uma trama."

A COSTURA
Para abrir o álbum, 'Carnavalzinho' (Lisa Ono e Mario Adnet) dá a dica de que o lance não é apoteose e confete. Os versos "meu Carnaval é bem pequenininho/só um banquinho e um violão/a fantasia vai no pensamento/e o samba-enredo na minha mão"

A seguir, as clássicas e não tão conhecidas canções que compõem a obra se apresentam na versatilidade de Teco e Nelson, todas como se flutuassem em tempo e espaço não definidos e não tivessem outras versões que não as do trio.

'Samba Erudito' e 'Cuitelinho', ambas músicas de Paulo Vanzolini - a última em parceria com Antônio Xandó -, chegam para arrebatar. A primeira pela graça e a ironia transpostas da letra para o compasso do piano de Ayres. A segunda, pelo lirismo. A bela composição regionalista ganha interpretação e melodia que a fazem caber em qualquer coração humano.

"Não tenho a menor preocupação em regravar canções e registrar algum grande clássico. Não vou contra os originais, não quero ser diferente nem igual. Acredito que o fato de sermos nós três, com as nossas personalidades musicais, já define alguma coisa. Piano, voz e sopro de personalidade. A leitura pessoal vai acontecer de qualquer forma. Eu acredito nela."

Outro aspecto foram os desafios, que para a cantora estão expressos nas últimas canções resgatadas para o disco: 'Carnavalzinho', 'Meu Rádio e Meu Mulato' (Herivelto Martins) e 'Promessa de Violeiro' (Raul Torres e Celino). "São canções que até me sinto verde cantando. Sou a rainha da mata longa. 'Meu Rádio e Meu Mulato' tem uma agilidade musical que não é fácil, mas eu tô aprendendo, tem o tempo em que elas chegam."

A redução da formação não se deu pela exigência do mercado para baixar os custos dos shows. "Por um lado é mais fácil, com certeza, mas a gente tem um pepino, que é o piano. Tudo que facilita pela redução da formação dificulta pelo instrumento. Tem o transporte dele, o cuidado que temos de ter para procurar locais que já tenham um piano que esteja bem cuidado."

A exposição, segundo Mônica, é maior, mas a recompensa é boa, "Tem mais silêncio, você escuta melhor o que o outro faz e tem mais espaço para dialogar com os instrumentos."




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