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Seita de Uganda desfrutava de impunidade
Do Diário do Grande ABC
31/03/2000 | 10:45
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Presentes para altos funcionários e informes nao transmitidos às autoridades permitiram, durante anos, que a seita ugandense ``Restauraçao dos Dez Mandamentos de Deus' conduzisse suas atividades com total impunidade, o que resultou na morte de cerca de 924 pessoas.

O movimento dirigido por Joseph Kibwetere e Credonia Mwerinde foi registrado legalmente como Organizaçao Nao-Governamental desde sua criaçao em Kanungu (Sudoeste), em 1989.

A seita se apresentava entao como uma associaçao católica renovadora, mas permanecendo dentro da Igreja Católica, explicou Paul Ikasire, sacerdote católico de Rugazi (Sudoeste), que se incorporou à seita em 1990, mas deixou a mesma em 1994. ``Durante o tempo em que fiz parte dela, jamais houve violência, nem privaçoes. Mas, em 1993, as coisas começaram a andar mal, já nao era a religiao do Papa, de Cristo, nao respeitavam sequer os Dez Mandamentos, e impunham coisas que a Igreja Católica nao prevê', explicou.

Depois que o padre Ikasire se retirou da organizaçao, Kibwetere radicalizou e rejeitou abertamente a ligaçao de seu grupo ao catolicismo. ``A irma' Credonia foi impondo regras cada vez mais severas, afirmando que a Virgem e seu Filho lhe apareciam regularmente. Entre as novas regras, surgiu a obrigaçao dos adeptos venderem todos seus bens em benefício da seita.

Após ter anunciado o fim do mundo para 1992 e depois de ter adiado o mesmo para 31 de dezembro de 1999, os dirigentes da seita começaram a enfrentar os questionamentos dos adeptos e pedidos de devoluçao de dinheiro, como afirma a imprensa ugandense. Talvez por isso tenham recorrido à matança. A data aproximada da morte, há mais ou menos um mês, de centenas de pessoas encontradas em cinco valas comuns, parece confirmar esta hipótese.

O que é incompreensível é como a seita conseguiu ficar tanto tempo sem ser desmascarada, como conseguiu matar e enterrar até 153 pessoas em um mesmo lugar sem que os vizinhos tenham denunciado nada. Todos os vizinhos entrevistados nos locais onde foram encontradas as valas juraram jamais ter visto nada ou suspeitar de nada.

Segundo o jornal New Vision, Kibwetere tinha o costume de convidar regularmente os altos funcionários locais desde 1998 e lhes davam presentes valiosos, entre os quais cabeças de gado.

Na quinta-feira a polícia anunciou a prisao de um desses funcionários, o reverendo Amooti Mutazindwa, responsável da administraçao de Kanungu, suspeito de ter feito desaparecer um informe importante sobre a seita.

O presidente Yoweri Museveni reconheceu que os serviços de inteligência fizeram informes sobre as atividades ``perigosas' da seita, mas funcionários locais nao fizeram qualquer caso dos mesmos e nao os transmitiram.

Em Rushojwa, onde 81 cadáveres foram encontrados enterrados na casa de um adepto, o presidente do conselho municipal, Lauben Kapere, declarou que redigiu, em agosto de 1999, um informe sobre as atividades da seita nessa casa e que advertiu às autoridades locais superiores, depois da morte de um menino, que muitos menores viviam ali sem seus pais, sem serem escolarizados e sem a atençao necessária.

Por fim, é difícil explicar que se tenha confiado somente a sete policiais especialistas, entre os quais um único médico legista, chegados de Kampala mais de dez dias depois da tragédia de Kanungu, o trabalho de investigar cinco valas comuns com cerca de 400 cadáveres. E isso com uma notável falta de meios para realizaçao do trabalho.




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