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Agressão a morador de rua é reflexo de exclusão social
William Cardoso
Do Diário do Grande ABC
05/04/2009 | 07:06
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O desrespeito e a humilhação a que o morador de rua Wallace foi submetido pelos guardas civis municipais Emerson e Sandro Amante, em Ribeirão Pires, é também reflexo do distanciamento que a sociedade mantém em relação aos excluídos. Esta é a avaliação de especialistas sobre a agressão despropositada que ganhou o noticiário nesta semana.

Ao distribuir o vídeo - em que Sandro aparece descarregando a espuma de um extintor contra um morador de rua - para os outros colegas de corporação, os irmãos Amante pretenderiam ganhar um status que normalmente não têm. Inconscientemente, optaram por demonstrar para a sociedade que os paga como estão tratando aqueles que ninguém quer ver na porta de casa ou atrapalhando a passagem nas calçadas.

"Muitas vezes, eles nem acham que fizeram algo tão horrível. É como se dissessem, por filmar, ‘olha, vocês pediram para a gente fazer isso, e fizemos'", explica a professora de Psicologia Social e Educacional da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica) Ana Bock.

A intenção é sempre se distanciar do outro e de tudo aquilo que ele significa. Ninguém quer viver em estado de abandono, perambulando pelas ruas, sem emprego, família ou identidade. É o temor de algo a que todos, de alguma forma, estão sujeitos pelas circunstâncias da vida. "Ao humilhar aqueles que estão no limite da vida social, é como se estivessem esconjurando o ‘demônio', mantendo afastado o que assusta a sociedade", diz Mônica de Souza, professora da Faculdade de Ciências Sociais da PUC-SP.

O exibicionismo ao distribuir o vídeo é um sintoma de que se perderam os valores que deveriam reger a sociedade ideal, na avaliação de especialistas. A internet seria uma facilitadora nesse processo em que não se tem limites. "Alguns ainda devem ter mandado recados ‘maravilhosos' para eles, pelo ‘serviço' prestado", critica a professora de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo) Rachel Kerbauy.

A solução, para Ana Bock, não virá de ações individuais. "Temos de ser capazes de reconstruir nossa relação com os demais, com significados que vão além das posses ou do nível educacional que cada um tem. Até pouco tempo, tínhamos a permissão para que a elite usasse o elevador social e, ‘os outros', o de serviço", diz.

As especialistas lembraram também que a sociedade já produziu situações como a de jovens de classe média agredindo uma prostituta, no Rio de Janeiro. Ou ainda ateando fogo em um índio no ponto de ônibus em Brasília (na ocasião, um dos rapazes justificou o fato por pensar que se tratava de um mendigo) e saírem praticamente impunes.

A professora Mônica de Souza lembra que alguns sociólogos criaram até um termo específico para denominar quem é rejeitado no âmbito social. "As pessoas que não reproduzem os padrões são os ‘matáveis', aqueles de quem se pode tirar sarro ou com quem se tem permissão para cometer barbaridades. Na visão de parte da sociedade, eles não têm mais nem o caráter de humanidade. É como se não fossem gente."




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